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Descaso e incoerência: no futebol feminino, Palmeiras age como time pequeno

Renata Mendonça

05/04/2019 11h04

Foto: Divulgação Palmeiras

Em fevereiro, o Palmeiras apresentou sua equipe de futebol feminino prometendo "excelência". Em coletiva na Academia de Futebol, o diretor de futebol Alexandre Mattos teve um discurso pomposo, destacando o esforço do clube para fazer um projeto próprio sem o apelo para parcerias.

"Esse é um dia muito importante para o Palmeiras. Todos sabem que aqui, quando fazemos qualquer coisa, é sempre buscando excelência", afirmou o dirigente. "A gente está aqui para criar um projeto, para evoluir, enfrentando os problemas que a gente sabe que vai ter. Poderíamos pegar uma equipe pronta e só colocar a camisa, mas não é o que queremos", afirmou.

+O que falta para o futebol feminino dar certo?

O discurso foi bonito, mas na prática a diretoria palmeirense mal sabe o que está acontecendo com o time feminino. E nem faz questão de disfarçar o descaso. A começar pela divulgação que o Palmeiras abriu mão de fazer dos jogos das mulheres – que já acontecem em Vinhedo, bem longe da sede do clube em São Paulo, e em horários difíceis para qualquer torcedor acompanhar (15h de uma quarta-feira, por exemplo). Mas o clube sequer divulga onde, quando e que horas as meninas vão jogar em seus principais canais. A estreia das mulheres com a camisa alviverde foi na quarta-feira passada. Até aquele dia de manhã não houve qualquer menção ao jogo – ou ao próprio time feminino – em nenhuma rede social do Palmeiras. Qualquer torcedor que acompanha o clube simplesmente não sabia quando a equipe feminina estrearia na Série A2 do Brasileiro. O primeiro post sobre o jogo veio só no próprio dia da estreia às 10h – a partida começaria às 15h.

Mas a maior prova do descaso veio nesta semana. O Palmeiras tinha um jogo do Paulista feminino marcado para 7 de abril, domingo, contra o São Paulo. No masculino, o Palmeiras também enfrenta o São Paulo neste mesmo dia pelo jogo de volta da semifinal estadual. Houve uma campanha na internet que mobilizou mais de 4 mil pessoas, incluindo ídolos do futebol, para que o clube alviverde fizesse as duas partidas no Allianz Parque, sendo a do feminino como prévia do masculino. Mas o Palmeiras optou por colocar o jogo das mulheres para acontecer em Guarulhos. E no mesmo horário do masculino.

O jogo delas começa às 15h em Guarulhos, o jogo deles começa 16h no Allianz Parque. Como um torcedor palmeirense pode se interessar em acompanhar o time feminino se o próprio clube JOGA CONTRA? A excelência da qual Mattos falou no início do ano é colocar as mulheres do Palmeiras para "disputar" a atenção do torcedor com os homens.

Foto: Divulgação Palmeiras

Na segunda-feira, assim que foi confirmado o local e horário do jogo feminino, nós entramos em contato com o Palmeiras para pedir um posicionamento sobre a campanha pedindo a partida no Allianz Parque, e também sobre a decisão de colocar as mulheres para jogarem em Guarulhos no mesmo horário dos homens. A resposta dos dirigentes alviverdes foi o silêncio.

Um clube do tamanho do Palmeiras – e com a riqueza do Palmeiras – se apequena em atitudes como essa. E vai na contramão de tudo o que seus rivais têm feito para promover o futebol feminino. Enquanto o Corinthians cria redes sociais específicas para comunicar as novidades do time das mulheres, muda seus horários de jogos justamente para não bater com os do masculino e investe em uma equipe vencedora que já foi campeã de tudo nos últimos anos, o Palmeiras não é capaz de fazer um tuíte para comunicar ao torcedor onde e quando suas atletas estarão em campo.

Enquanto o Santos enche a Vila Belmiro no maior público do ano de 2018 com o feminino, o Palmeiras coloca as mulheres para jogar em Vinhedo, a 75km de sua sede, e sequer faz questão de chamar seus torcedores para o jogo. Pior, coloca o time feminino para disputar a atenção do palmeirense com o time masculino.

Enquanto o São Paulo repatria ídolos do futebol feminino como Cristiane, cultiva uma base de meninas que já foram campeãs de tudo em uma parceria que rendeu frutos com o Centro Olímpico, o Palmeiras sequer tem planos para a base no feminino (que é outra obrigatoriedade) e tenta convencer o torcedor de que colocar seu time – que veio "importado" do projeto que antes vestia a camisa da Ponte Preta – para jogar em Vinhedo é "estratégia", já que a cidade lá é uma das que têm "maior IDH" e "uma grande comunidade italiana".

O apoio de Alex à campanha e ao futebol feminino (Foto: Reprodução/Twitter)

O futebol feminino não precisa de melhor IDH, o futebol feminino precisa de atenção, investimento e, principalmente, vontade. Ficaria mais honesto com o torcedor os dirigentes alviverdes pouparem o esforço da justificativa da escolha de Vinhedo e serem apenas sinceros: "Estamos fazendo o feminino apenas por obrigação."

Apesar da indiferença da diretoria, o time comandado pela excelente técnica Ana Lúcia Gonçalves tem feito um bom trabalho dentro de campo. A estreia foi com goleada em cima do Moreninhas-MS por 8 a 0. Depois, no Paulista, o time alviverde empatou em 0 a 0 com o Audax.

E como bem nos disse o especialista em marketing esportivo, Erich Beting, o Palmeiras já ficou para trás no futebol feminino e poderá se arrepender disso no futuro. "É muito burro do Palmeiras fazer isso (mandar o jogo do feminino em Guarulhos na mesma hora do masculino). É muito tosco. Mas vejo o Palmeiras como exceção nesse movimento, porque outros clubes estão fazendo certo e ele está ficando para trás. Se você esconder o produto, nunca terá como vendê-lo. Pode apostar que daqui a pouco a torcida palmeirense vai cobrar."

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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