Clubes cortam salários, dispensam jogadoras e querem nova ajuda da CBF
*Colaborou Juliana Lisboa
Com o futebol paralisado desde março e ainda sem previsão de volta, os clubes vivem uma crise financeira acentuada, que já começa a respingar no futebol feminino em alguns casos. Se alguns times de camisa conseguiram negociar cortes apenas para jogadores do time principal masculino (que têm salários mais altos), outros já reduziram os ganhos das jogadoras e também dispensaram atletas para diminuir seus custos.
Nem mesmo a ajuda da CBF – que destinou R$120 mil para equipes da série A1 e R$50 mil para equipes da série A2 – tem sido suficiente para garantir os salários das jogadoras. Em alguns casos, porque a folha salarial do clube é maior do que o valor doado pela entidade, e em outros porque o próprio time não repassou a verba às atletas – conforme noticiamos há um mês.
Foram sete equipes entre as 52, segundo apurações do blog, que não destinaram o dinheiro do auxílio da CBF para as jogadoras e foram cobradas pela entidade por isso (apesar de não haver qualquer contrapartida exigida formalmente para garantir que o valor fosse usado para pagamento de salários do futebol feminino). Uma delas ainda não fez o pagamento – o Vitória, conforme noticiou o blog Dona do Campinho nesta segunda-feira.
Neste cenário de instabilidade, os clubes já sinalizam para a CBF que precisarão de uma nova ajuda para manter o futebol feminino. Há quem mencione até o cancelamento do Campeonato Brasileiro das mulheres como "solução" para o problema.
Jogadoras sem receber
Audax, Juventus, Autoesporte-PB, Santos Dumont-SE, Atlético-GO, Sport e Vitória demoraram para usar o dinheiro da CBF para pagar uma ajuda de custo às atletas (que, na maioria dos casos, equivaleria a R$500 ou R$1mil). Este último ainda não confirmou que efetuou o pagamento.
"O clube vai fazer o pagamento, se já não o fez. O clube recebeu um valor, esse valor é direcionado a uma obrigação, e o clube tem que fazer o pagamento. O clube está imbuído em fazer os pagamentos e liquidar as obrigações que tem. Se houve atraso no repasse das jogadoras, e pode ter acontecido, eu não sei qual foi o motivo, mas com certeza aconteceu com motivo de boa fé, motivo não intencional do clube", afirmou às dibradoras o diretor jurídico do Vitória, Dilson Pereira.
Sobre a situação atual das jogadoras, que não têm contrato formal de trabalho e recebem apenas ajuda de custo, ele afirma que "o futebol feminino ainda é amador no Brasil" e que não deveria depender do "fomento dos clubes".
"Uma coisa que tem que ficar clara na mente das pessoas é que o futebol masculino é um tipo de negócio e o futebol feminino é outro tipo de negócio. O negócio futebol feminino na Europa está muito avançado, no Brasil está em fase amadora, com a CBF tentando resolver a situação incentivando os clubes a fazerem times femininos quando em verdade talvez a gente esteja um passo atrás e necessitaria de políticas públicas, da iniciativa do governo federal de fomentar o futebol feminino. Esse fomento está vindo pelos clubes", afirmou ele. O tipo de negócio do futebol masculino no Vitória atualmente acumula uma dívida de R$4 milhões e algumas penhoras, conforme o próprio diretor do jurídico citou em seguida.
"O futebol feminino no Brasil não decolou. Eu tenho uma situação do negócio futebol masculino no clube que está em crise, não tenho receita no momento, perspectiva pouco animadoras no momento, então eu vou fazer o que? Vai ter calendário do futebol feminino? Se sim, ok, o time vai ser mantido. Se não, o time terá que cortar despesas."
Cortes e dispensas
Dos 16 times da primeira divisão do Brasileiro feminino, pelo menos seis cortaram salários ou dispensaram jogadoras ou ainda estão em débito com elas. O Corinthians reduziu os ganhos de todos os funcionários (incluindo as jogadoras) em 25%, assim como o Internacional e o Grêmio. O Santos também cortou salários, mas apenas para jogadoras que ganhavam acima de R$6 mil (o clube não informou quantas seriam).
O Iranduba, um dos times mais promissores do futebol feminino recentemente, também vive uma crise acentuada por conta de redução de pagamento de patrocinador. O clube diz que já usou toda a verba da CBF para pagamento de salários (que não foi suficiente para quitar dois meses de folha das atletas) e que já tem alguns débitos acumulados por conta da situação.
Esses se somam ao Vitória, que ainda não acertou a ajuda de custo das jogadoras.
Na série A2, o Atlético-MG já dispensou cinco jogadoras e reduziu salários da comissão técnica do time feminino para cortar gastos. O clube alega que a ajuda da CBF (R$50 mil) não supre dois meses da folha salarial do feminino e diz que todas as categorias sofreram cortes e dispensas por causa da crise.
O Atlético-GO, que inicialmente não havia repassado valores da CBF às atletas, explica que repassou o dinheiro como ajuda de custo "cada uma de acordo com a sua necessidade" e dispensou quatro atletas por "motivos de política interna do clube". A equipe mantém contratos de vínculo não profissional, sem salário e sem ajuda de custo.
Novo pedido à CBF
Os times feminino já entraram em contato com a CBF para pedir uma nova ajuda, já que o futebol ainda não tem data para voltar. Os times alegam que não terão como manter os salários das atletas sem saber quando elas voltarão a atuar.
O Audax, time que inicialmente não havia repassado o dinheiro doado pela entidade para as atletas, diz que é preciso, inclusive, considerar o cancelamento do Brasileiro feminino – uma hipótese extrema que seria extremamente prejudicial para o desenvolvimento da modalidade.
"Para mim, a melhor decisão que a CBF poderia tomar seria a de cancelar o campeonato feminino desse ano. Os recursos que nós temos são suficientes até agosto. Se até lá o campeonato não terminar, o que iremos fazer?", disse o filho do dono do clube, Gustavo Teixeira.
A reportagem apurou que a CBF ouviu o apelo dos times femininos e ainda avalia quais serão os passos a serem tomados no futebol como um todo, não só no feminino.
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