Jogadoras desabafam sobre 'bagunça' do Brasileiro feminino
Um vídeo da técnica do Santos, Emily Lima, falando sobre a realidade do futebol feminino no Brasil viralizou nesta terça-feira e gerou uma série de desabafos por parte de jogadoras que atuam no país. Nas imagens, a treinadora mostrava suas atletas dormindo na recepção de um hotel em Manaus, porque não havia quartos disponíveis para elas – isso aconteceu por um erro da empresa responsável pela logística do Campeonato Brasileiro feminino. Depois disso, atletas do Santos e até da seleção brasileira se manifestaram sobre a "bagunça" do torneio.
Cristiane, atacante do São Paulo, foi uma das porta-vozes das jogadoras para pedir "profissionalismo" aos responsáveis por organizar o Campeonato Brasileiro. "Copa do mundo foi linda, todo mundo amou, as pessoas ficaram felizes em conhecer nosso trabalho, porém aquele oba oba todo acabou. O que tem rolado depois de toda essa passagem? Bagunça, falta de apoio de alguns clubes com as atletas, falta de logística e brasileiro sub 18 jogando de dois em dois dias. E aiiii ??? Será que não tá na hora de realizar uma reciclagem nas pessoas que colocamos para trabalhar com a modalidade no país? Colocar pessoas que queiram realmente mudar esse cenário, pessoas que sejam PROFISSIONAIS. Eu acho que tá na hr de darmos as mãos de verdade e brigar por algo melhor", afirmou a camisa 11.
"Meu puxão de orelha é pra geral: Confederação, Federações, Clubes e nós atletas em certas situações tmb. Quer ver isso aqui evoluir de verdade? Ganhar uma Copa e uma Olimpíada? Faça por onde desde cedo, planeje nem que seja a longo prazo, mas tentem fazer algo efetivo para mudar o cenário nacional que envolve o futebol feminino!"
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A jogadora santista Patricia Sochor também se manifestou nas suas redes sociais fazendo um grande desabafo sobre as dificuldades enfrentadas pelas atletas no Brasil para jogar futebol. Ela cita os horários de jogos às 13h ou 15h no calor que faz por aqui, os campos muito mal cuidados, os problemas com a logística para viajar para as partidas e também os intervalos muito curtos entre um jogo e outro no Brasileiro sub-18 recém-iniciado.
"Nos pedem para ser profissionais, mas não nos dão CAMPOS decentes para treinar ou jogar. Nos pedem para ser profissionais, mas nos colocam em alojamentos que sempre falta algo, uma geladeira, uma máquina de lavar, um microondas e guarda-roupas e nossas roupas ficam em malas o ano todo. Quem não passou por isso, teve privilégio. Nos pedem para ser profissionais, mas colocam meninas de 15 a 18 anos para fazer 6 jogos em 10 dias, 1 jogo a cada 48horas. São meninas ou são máquinas? Nos pedem para ser profissionais, mas nos fazem roteiros de viagens em que precisamos dormir por horas em aeroportos e quando chegamos em nossos destinos, ficamos 1 ou 2 horas distantes do local do jogo. Isso quando tem hotel, porque a organização do campeonato coloca o voo em uma data e o hotel apenas ás 12horas do dia seguinte. Nos pedem para ser profissionais, mas não podemos treinar em dias de chuva, porque o campo estraga, porque o clube não libera o campo.. entre outros motivos. Nos pedem para ser profissionais, mas colocam nossos jogos 11 horas da manhã, 13 horas da tarde, em dias de calor absurdo", afirmou a atleta.
"Nos pedem para ser profissionais, vocês que nos pedem isso, nós pedimos 3 coisas, RESPEITO, VISIBILIDADE E RECONHECIMENTO. Porque se nós dependêssemos de vocês para ser profissionais, me pergunto onde estaríamos, porque vocês não dão suporte algum. PRAZER, FUTEBOL FEMININO."
Além delas, várias outras atletas se manifestaram seja com postagens similares – como a atacante Ketlen e a goleira Kemelli, ambas do Santos – ou com comentários apoiando o desabafo das outras. A técnica Emily Lima ainda convocou outros técnicos e pessoas do futebol feminino a falarem sobre os problemas que enfrentam e se unirem por mudanças.
Entre as atletas da seleção brasileira, a atacante Andressa Alves, as laterais Fabi Simões, Tamires e Poliana, a zagueira Erika, e a goleira Aline Reis foram as que se manifestaram publicamente sobre a questão.
Problemas enfrentados
A reportagem conversou com representantes de cinco clubes do país que participam do Brasileiro Série A1, Série A2 e também do sub-18 e eles relataram inúmeros problemas com a organização da logística feita pela empresa Pallas – a contratada da CBF para a função.
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Os principais são os horários de voo – muitos deles são na madrugada e envolvem escalas e viagens muito longas para chegarem ao local de jogo sem o devido descanso e tempo de treinamento e preparação. Além disso, outros enfrentaram problemas com a logística para ir até o aeroporto, porque o ônibus contratado para levar as jogadoras até lá não apareceu. Foi o que aconteceu com o Cruzeiro, que tinha um voo às 6h da manhã e precisou transportar a delegação toda de Uber porque o transporte contratado pela Pallas não estava disponível naquele horário.
As equipes relatam que tentam sempre passar a melhor logística para empresa sobre quando gostariam de viajar, e já indicando os voos disponíveis para a data. Mas o principal problema é que a Pallas só pode reservar voos de uma companhia aérea, que é a patrocinadora da CBF, e isso limita muito a logística para alguns lugares do país – o caso do Cruzeiro, por exemplo, o voo da equipe sub-18 foi para Presidente Prudente em vez de ir para São José do Rio Preto, que era muito mais perto de Bálsamo, onde elas jogariam a primeira fase, porque a empresa aérea parceira da CBF não fazia voos para esse destino. Resultado, a equipe ficou um dia inteiro viajando.
No caso do Santos, os horários e dias de voo também não agradaram a comissão para o jogo contra o Iranduba pelo Brasileiro A1. O clube pediu para viajar na terça, um dia antes do jogo, mas o voo disponibilizado pela Pallas foi na segunda-feira, com escala, o que fez com que elas chegassem 00h a Manaus e ainda tivessem que varar a madrugada esperando a resolução para o problema da reserva do hotel – algo que só foi resolvido por volta de 1h.
No Sub-18, a grande reclamação é com relação ao intervalo dos jogos – as atletas de 15 a 18 anos estão jogando dia sim, dia não, completando as seis partidas da primeira fase em 10 dias, sempre às 13h30 ou 15h30.
A CBF se manifestou por meio de nota sobre a questão logística alegando que "A organização do campeonato busca sempre as melhores condições para a viagem das equipes. Eventuais conexões e esperas em aeroportos devem-se às possibilidades da malha aérea do país.A CBF ressalta ainda que a organização do campeonato busca sempre as melhores condições para a viagem das equipes, sempre levando em consideração o tempo necessário de descanso das atletas e o interesse dos clubes. Eventuais conexões e esperas em aeroportos devem-se às disponibilidades da malha aérea nacional."
Sobre o Brasileiro sub-18, Romeu Castro, diretor de competições da entidade, fez uma postagem em seu Facebook explicando que o calendário feito dessa maneira é comum nas categorias de base tanto do masculino quanto do feminino aqui em outros lugares do mundo.
"Na contramão exigem que no primeiro Brasileiro Sub-18, as equipes tenham uma pausa maior entre as partidas, do que aquela que as nossas Seleções Masculinas e Femininas Sub-17 e Sub-20 tem no Sul-americano, onde se joga exatamente em dias alternados. A diferença de calendário escolar entre os estados fez com que muitos clubes não pudessem viajar antes do dia 13 de julho. Tivemos que apoiar os clubes que priorizam o ano escolar da maioria das meninas. Jovens brilhantes que ingressam neste momento no futebol feminino de base, ainda sem um contrato profissional, mas com sonhos do tamanho de uma Copa do Mundo. Por isso, temos o turno e returno da primeira fase sendo realizados numa só sequência, na mesma sede. Certamente para 2020 poderemos ter atualizações no calendário. Me orgulho que possamos discutir melhorias e evolução para as nossas meninas de forma construtiva e leal", escreveu.
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