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Palmeiras sai atrás de rivais com feminino 'terceirizado' e pouca definição

Renata Mendonça

13/02/2019 17h23

Foto: dibradoras

O Palmeiras apresentou sua equipe de futebol feminino nesta quarta-feira em entrevista coletiva na Academia de  Futebol, em São Paulo. Com o time todo reunido para fotos no gramado, o discurso do diretor executivo de futebol, Alexandre Mattos, foi de que esse seria um projeto de excelência. No entanto, esse não será o gramado que as jogadoras utilizarão, nem para treinar, nem para jogar – a sede do time feminino será em Vinhedo, a 75 Km da capital.

"Esse é um dia muito importante para o Palmeiras. Todos sabem que aqui, quando fazemos qualquer coisa, é sempre buscando excelência, grandes objetivos na competição. Sabemos que é um início de projeto de futebol feminino e isso requer cuidados, mas vamos buscar uma evolução ano a ano como acontece no masculino", disse o dirigente.

A técnica e boa parte das jogadoras do time vieram do antigo projeto da Ponte Preta, que fazia uma parceria com Valinhos no ano passado. Ana Lúcia Gonçalves é a comandante da equipe, que é bastante jovem e formada por 20 atletas por enquanto. Na coletiva, a camisa do Palmeiras foi entregue ao prefeito de Vinhedo, Jaime Cruz, que acolheu o projeto na cidade e fornecerá campo, centro de treinamento e a assistência de saúde para as jogadoras. O time alviverde ficará responsável por pagar os salários da comissão técnica e jogadoras e por cuidar da logística, além da divulgação e marketing da equipe. Os recursos virão via lei de incentivo ao esporte.

O Palmeiras afirma ter optado por levar o projeto para Vinhedo, mesmo tendo a possibilidade de sediá-lo em São Paulo. As justificativas para isso passaram pela conexão da cidade com a imigração italiana e também pela qualidade de vida por lá (na coletiva, citou-se até mesmo o IDH de Vinhedo, sexto maior do país). Além disso, os dirigentes palmeirenses afirmaram que, em Vinhedo, o time feminino poderia ter uma estrutura exclusiva para elas.

Foto: Divulgação Palmeiras

"O Palmeiras optou por montar a sua equipe, por ter um projeto, ao contrário de muita gente que recorre a parcerias. Estamos trabalhando há um tempo na prospecção de atletas, especialmente no mercado internacional. A estrutura do Palmeiras está à disposição do nosso projeto, mas foi nossa opção e da comissão que a gente tivesse um local diferente neste primeiro momento, para desenvolver tudo. Vamos poder usar a estrutura em alguns treinos, mas a comissão achou melhor ter uma base fixa neste momento", afirmou Alberto Simão, diretor de futebol feminino do clube.

Discurso x Prática

Enquanto todos os rivais – São Paulo, Corinthians e Santos – usaram suas próprias instalações fazer crescer ali um projeto completo de futebol feminino (e integrado com o departamento de futebol do clube), o Palmeiras optou por uma parceria. O clube recorreu a uma prefeitura distante de sua sede para abrigar a equipe em vez de usar sua própria estrutura para isso

O discurso é de excelência e de que o Palmeiras fará um projeto da grandeza do masculino. Mas por enquanto, pouca coisa parece estruturada/definida. O próprio diretor de futebol feminino, Alberto Simão, que disse estar trabalhando nesse projeto desde novembro de 2018, estava até janeiro deste ano no cargo de diretor executivo do time Tupynambás, time que disputa a primeira divisão do Campeonato Mineiro (masculino), segundo apurou a reportagem.

Ele inclusive deu entrevistas representando a equipe mineira há menos de um mês. Quando questionado sobre isso, o Palmeiras demonstrou que não tinha conhecimento dessa informação e, após checar com o próprio Simão, afirmou que ele irá acumular os cargos por enquanto, ficando entre Juiz de Fora com o time masculino do Tupynambás, e Vinhedo com o time feminino do Palmeiras (mais de 520 km de distância).

Outro aspecto que ainda gera dúvidas é sobre por que o Palmeiras optou por levar o projeto feminino para Vinhedo, em vez de sediá-lo na capital paulista (que abriga todos os seus principais projetos de futebol, a não ser a base que fica em Guarulhos, mas a uma distância curta de São Paulo). O diretor, Simão, insistiu que foi uma opção para dar melhor estrutura para as jogadoras. No entanto, a Academia de Futebol é considerada um dos centros de excelência do futebol brasileiro, então não seria essa a melhor estrutura possível para as mulheres treinarem?

Fabio Menotti / Agência Palmeiras

Quando questionado sobre como criar vínculo com a torcida mantendo um time a 75km da capital, Alexandre Mattos foi categórico: "O torcedor palmeirense veste a camisa para torcer em qualquer lugar, para qualquer esporte, não tenho dúvidas de que o estádio em Vinhedo estará cheio para torcer por elas".

Também ainda não dá para saber direito qual será a estrutura que as jogadoras do Palmeiras terão em Vinhedo. Entramos em contato com a assessoria do clube pedindo fotos e detalhes sobre os locais de treinamento, e a resposta foi que "A implantação da equipe está acontecendo por etapas. A parte comunicacional está dentro desse processo e, assim que tiver tudo acertado, divulgaremos o material". A sugestão foi para que procurássemos a prefeitura de Vinhedo.

Os dirigentes também foram perguntados sobre a categoria de base, já que faz parte da exigência da CBF e Conmebol manter uma equipe juvenil no feminino. "Estamos indo por etapas. Em breve vocês terão mais informações".

Com uma das maiores receitas do futebol brasileiro, é difícil entender por que o Palmeiras não acolhe o time feminino nas suas dependências, fornecendo o melhor da estrutura que tem também para as mulheres. É difícil entender por que "isolou" o futebol feminino em Vinhedo, distante da capital, em vez de trazer esse novo projeto para perto, numa tentativa de realmente abraçar a modalidade e fazer dar certo. O discurso do clube está bonito e alinhado com a promessa de "excelência", mas pelos indícios que tivemos na prática, a impressão que fica é que nessa disputa com os rivais, o Palmeiras sai atrás de todos – Corinthians, Santos e São Paulo. De positivo, vale ressaltar: é muito bom ver tantos times femininos surgindo, mesmo que estejam vindo agora para cumprir uma obrigação da Conmebol.

*Colaborou Danilo Lavieri, do UOL

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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