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Os desafios da seleção feminina na preparação para a Copa do Mundo

Renata Mendonça

04/02/2019 10h19

O ano de 2019 começou intenso para a seleção brasileira de futebol feminino. Em junho, tem Copa do Mundo na França e, para chegar até lá com chances de fazer uma boa campanha, é preciso muitos sacrifícios e muito planejamento nesse início de temporada.

Principalmente considerando as dificuldades estruturais do futebol feminino, que influenciam – e muito – na preparação da seleção para o Mundial. Ao contrário do que acontece no masculino, em que a preocupação é evitar ao máximo o desgaste físico dos jogadores, que já estão vivendo um acúmulo de jogos em época de Copa, no feminino a primeira tarefa é igualar as condições físicas das jogadoras, que vivem realidades muito diferentes umas das outras.

É o que está acontecendo neste momento na Granja Comary em Teresópolis, onde a seleção feminina se reúne desde 14 de janeiro para uma preparação intensa pensando na Copa do Mundo. Estivemos por lá durante um dia de treino e relatamos aqui alguns dos desafios para esses meses que antecedem o principal torneio do ano.

Condicionamento físico 

Para se ter uma ideia, enquanto algumas jogadoras chegaram em pleno condicionamento, por estarem já no meio da temporada europeia, outras que atuam nos Estados Unidos ou no Brasil estavam ha três meses sem entrar em campo – o calendário de jogos para a maioria das equipes acabou em outubro. A diferença é muito grande e as jogadoras chegam em níveis muito distintos na seleção. 

Sendo assim, a primeira tarefa da comissão técnica da seleção é igualar o condicionamento das atletas. E essa é uma das grandes dificuldades do futebol feminino, porque a modalidade ainda é amadora no Brasil, o que significa dizer que boa parte dos times não têm um acompanhamento nutricional adequado ou uma preparação física intensa com toda a estrutura que uma atleta de alto rendimento precisaria. 

"Eles dividem todas nós em grupos com base no condicionamento que cada uma está. Então tem o grupo que está sem jogar e precisa trabalhar na academia para ganhar condição de jogo, tem grupo que está fazendo trabalho específico no campo e tem grupo que já está com bola. É tudo muito bem planejado de acordo com a avaliação que eles fazem com cada uma das atletas quando a gente chega aqui", explicou às dibradoras a zagueira Tayla, que joga no Benfica, em Portugal.

A situação piora para as jogadoras que atuam na China. O mercado do futebol feminino lá tem crescido com os clubes investindo pesado, mas a estrutura profissional ainda não chegou por lá. É o que relata Cristiane, atacante que agora defenderá o São Paulo – ela passou um ano jogando em terras chinesas e sofreu com as frequentes lesões por conta da falta de estrutura na preparação física por lá.

"Lá a gente não tinha preparador. Então era muito difícil, é um mercado que é muito bom financeiramente, mas que pelo lado profissional acaba não sendo tanto. Eu sofri demais lá com as lesões, não conseguia me recuperar, não tinha a estrutura de fisiologia, preparação física, que é preciso pra um atleta né. No ano passado eu mal consegui jogar com a seleção por conta das lesões. Então estou voltando agora para retomar o ritmo", pontuou a jogadora.

O coordenador de futebol feminino da CBF, Marco Aurélio Cunha, também pontuou as dificuldades que a seleção está tendo para "alinhar" todas as atletas fisicamente.

"Falando de nossa seleção , sem considerar o alto nível de seleções acima de nós no ranking, o maior desafio é o alinhamento físico das atletas pelas diferentes situações que hoje vivem, países diferentes, ligas diferentes, tempo de paralisação de seus campeonatos e retomada de treinamentos, etc", afirmou. Marco Aurélio também destacou a dificuldade para recuperar determinadas jogadoras que vêm de lesões complexas para que elas cheguem 100% ao Mundial em junho, como é o caso da zagueira Rafaelle, que passou por uma sequência de problemas físicos em 2018 e agora se recupera de uma lesão grave no ligamento do joelho – ela foi operada no fim de outubro e a previsão de volta é entre fim de abril e início de maio, bem em cima da competição.

Foto: CBF

Em outras seleções, que já têm um calendário mais estruturado para o futebol feminino e um investimento maior dos clubes – como é o caso de Inglaterra, França, Espanha -, o condicionamento físico das atletas já é melhor e isso acaba fazendo diferença dentro de campo, como foi possível ver em alguns amistosos da seleção brasileira no ano passado contra essas equipes.

Adversários estão melhores 

Além da questão física, outro aspecto que preocupa a seleção brasileira obviamente são os adversários desse Mundial. Na primeira fase, a seleção caiu no grupo C, considerado até tranquilo – o adversário mais difícil deverá ser a Austrália, que está à frente do Brasil no ranking da Fifa e foi algoz da seleção na última Copa; além dela, Itália (que não jogava o Mundial há duas décadas) e Jamaica, estreante, são as outras equipes da chave.

Além disso, o Brasil vai para esse Mundial numa posição mais tímida no ranking da Fifa. O país ocupa o décimo lugar, perdendo posições para equipes que costumavam ser discretas no passado, mas cresceram muito nos últimos anos, como é o caso da França, da Inglaterra e da Holanda.

Aliás, contra essas seleções, o Brasil não conseguiu vencer nenhum amistoso no ano passado. Caiu diante da França, da Inglaterra, da Austrália e dos Estados Unidos.

"Tem muita seleção surpreendendo, a Austrália cresceu muito, hoje está difícil ficar apontando. Está muito equilibrado, competitivo. Vai ser difícil (essa Copa), a gente sabe que no ano passado não conseguimos bons resultados, mas acho que é um ano para trabalhar, a gente sabe que dá para fazer isso. Todo mundo tem que se dedicar, as atletas, a comissão técnica, a gente tem que se fechar para fazer uma boa Copa do Mundo", disse a veterana Cristiane.

Para chegar à França já "vacinada", a seleção programou uma série de amistosos contra as equipes mais fortes nestes meses que antecedem o Mundial. No fim deste mês, o Brasil participará da "She Believes Cup" nos Estados Unidos enfrentando Inglaterra, Japão e o time da casa. Depois, em 5 de abril será a vez de medir forças com a Espanha, que também vem numa crescente no cenário mundial, e no dia 8 o amistoso será contra a Escócia.

 

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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