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Corinthians e Barça tentaram, mas projeto do São Paulo convenceu Cristiane

Roberta Nina

14/01/2019 13h41

(Foto: Renata Damasio/saopaulofc.net)

Por Renata Mendonça e Roberta Nina

Cristiane Rozeira é um dos principais nomes do futebol feminino do Brasil. A maior artilheira da história dos Jogos Olímpicos tem no currículo passagens bem-sucedidas por clubes da Alemanha e França e, após uma temporada conturbada na China, tinha propostas do Barcelona e sondagens também do Corinthians para voltar ao futebol brasileiro. O São Paulo foi o último a chegar na negociação – mas o projeto apresentado pelo clube do Morumbi convenceu a atacante a optar por ele.

Era um desejo pessoal da jogadora voltar ao Brasil para estar perto da família e, depois de pouco mais de uma semana de negociação, a camisa 11 da seleção brasileira foi anunciada como novo reforço do time feminino do São Paulo Futebol Clube.

"Soubemos do interesse dela em ficar em São Paulo no início deste ano e ligamos para ela no dia 4 de janeiro. Convidamos a atleta e o pessoal que cuida da carreira dela para vir aqui, conhecer nossa estrutura e ouvir sobre o projeto que está sendo feito. Isso ajudou muito no convencimento da atleta", afirmou às dibradoras Amauri Nascimento, supervisor do futebol feminino do São Paulo, que já havia trabalhado com Cristiane no Santos entre 2009 e 2010.

 

Em conversa com a reportagem ainda no fim de 2018, a atacante havia confidenciado seu desejo de permanecer em São Paulo neste ano por conta de questões familiares. Cristiane viveu momentos difíceis na China, com uma sequência de lesões que a deixaram fora de campo e bastante abalada por não poder estar atuando. "A China chegou forte no futebol feminino, tem bastante dinheiro, mas eles não têm estrutura. Para você ter ideia, os clubes não trabalham com preparador físico. Então é muito comum você ver as atletas se lesionando. O cuidado deles com isso ainda é muito atrasado", disse a jogadora à época.

De férias no Brasil, Cris ouviu sondagens de clubes como o Corinthians, atual campeão brasileiro e um dos times com mais investimento e estrutura para o futebol feminino no país.

O São Paulo corria por fora desde que soube do interesse da atleta em jogar por aqui. Internamente, o clube levou a informação ao presidente Leco que se empolgou com a possibilidade e deu carta para branca para o clube iniciar a negociação.

Só que havia alguns empecilhos no meio do caminho. O Barcelona chegou a apresentar proposta para a atleta e, quando chegou no São Paulo para negociar, ela deixou claro que já tinha um contrato na mesa e uma data limite para dar a resposta. O Corinthians, outro possível destino para a atacante, tem no calendário para este ano o Paulista, a primeira divisão do Brasileiro e a Libertadores da América. Enquanto isso, o São Paulo só tinha a oferecer o estadual e a segunda divisão do campeonato nacional – no entanto, a chave para o convencimento veio do projeto pensado para o futebol feminino no clube, que tem um planejamento a longo prazo para reconstruir a tradição do futebol feminino no Morumbi.

"Sei que muitas vezes o valor em espécie não é o mesmo valor esportivo que cativa o atleta. Eu poderia ofertar o triplo do salário, mas não poderia ofertar uma Libertadores. O futebol feminino ainda é muito vendido por sonhos. Mas a gente mostrou o preto no branco, tudo o que queremos fazer por aqui. A gente fez algumas propostas de tempo de contrato, valores e chegamos num denominador comum. Ela sabe que é um compromisso que a gente consegue honrar", afirmou Amauri.

(Foto: Renata Damasio/saopaulofc.net)

"A gente vai começar o projeto do começo, com pessoas que gostam da modalidade, que não têm vícios do futebol masculino, aquela sensação de ter sido 'rebaixado para trabalhar no feminino". Montamos uma comissão com esse foco, pessoas que querem crescer individualmente e coletivamente. Estamos prestigiando o trabalho que o São Paulo abraçou junto com Centro Olímpico, trazendo algumas jogadoras que eram da base, dando contrato de atleta profissional com carteira assinada para todas elas. Tudo isso fez com que ela entendesse essa seriedade que estamos trabalhando, isso chamou muito a atenção dela".

E assim, depois de quatro anos jogando fora do país (sua última atuação por aqui foi pelo Centro Olímpico entre 2013 e 2015), a atacante está de volta e explicitou sua vontade em suas redes sociais, após anúncio oficial do clube.

"Muitos irão se perguntar o porquê de trocar o futebol europeu para jogar no Brasil. Primeiro que fiz isso por estar perto da minha família e da minha mãe, segundo porque o São Paulo foi o clube que fez um esforço gigante para que eu pudesse trabalhar com eles nesse ano. O projeto é grande, com uma estrutura que qualquer atleta se sentiria feliz e honrada! Tenho certeza que essa será a porta para que outras atletas acreditem e confiem nesse projeto, se interessem e vejam que não é passageiro", afirmou pelo Instagram.

"A contratação da Cristiane demonstra a forma séria como o São Paulo entra no projeto do futebol feminino. Estamos muito felizes por termos concretizado essa negociação, que eleva nossa equipe principal a outro patamar, e esperamos que a Cristiane nos ajuda a obter o êxito que desejamos e que o projeto merece", disse o Presidente Carlos Augusto de Barros e Silva via site oficial do clube. 

Leco, inclusive, foi o primeiro a ligar para a jogadora depois que a negociação se concretizou. Tudo foi acordado na sexta-feira, às 21h. No sábado pela manhã, ela foi ao Morumbi fazer as fotos de divulgação e recebeu a ligação do presidente, que voltava da Flórida Cup.

Detalhes da contratação

Cristiane chega no Tricolor Paulista para encabeçar a construção do time que começou com a base, feita por meio de uma parceria com o Centro Olímpico e que resultou em títulos logo de cara: bicampeonato do Paulista Sub-17 (mesmo jogando com meninas do sub-15), o título do Torneio de Desenvolvimento da Conmebol e da Fiesta Sudamericana de la Juventud.

"Cristiane chega para ajudar no desenvolvimento do time que vai contar, além de atletas contratadas, com algumas das joias da base e com jogadoras que participaram das avaliações abertas, feitas em outubro de 2018″, pronunciou o clube em seu site. 

(Foto: Saopaulofc.net)

O contrato da atleta com o time do Morumbi tem duração de um ano e tem um formato um pouco diferente do das outras atletas. Isso porque o São Paulo quer explorar a imagem vencedora da atacante como uma espécie de "embaixadora" do futebol feminino do clube.

"Por ela ser diferenciada, a forma de contratação dela é diferenciada. O São Paulo também vai pagar um percentual via (direitos de) imagem, para que ela possa vender a imagem dela com a camisa do São Paulo. Esse é um ano diferenciado pra modalidade por causa da Copa do Mundo, então nós vamos juntar nossa camisa com a vivência que ela tem. Ela já se vende sozinha", pontuou Amauri Nascimento.

A ideia do São Paulo é também promover a venda da camisa de Cristiane numa campanha de marketing para divulgar a modalidade dentro do clube. A ideia já foi levada ao departamento de marketing e à fornecedora de material, Adidas, para que seja produzida uma leva de camisas especiais da atacante para a venda.

Na tarde desta segunda-feira, a Adidas disponibilizou em seu site a personalização da camisa do São Paulo com o nome e número de Cristiane (Foto: Reprodução)

"A gente quer juntar essa referência que ela tem com a marca São Paulo. Conseguimos convencê-la de ela nos entregar isso para eu conseguir valorizar o projeto. Com valor que eu trouxe para ela, eu saio no 'negativo' financeiramente pelo orçamento que tinha sido planejado no feminino, mas a gente aposta que com ela o retorno pode vir ainda mais rápido para consolidarmos o futebol feminino por aqui", concluiu.

Amauri Nascimento ressalta que o São Paulo teve uma história vitoriosa no passado com o futebol feminino – quando teve nomes como Sissi e Formiga passando pelo clube – e que agora quer voltar a ser referência na modalidade. "A gente tem essa referência, do São Paulo campeão de tudo o que tinha no futebol feminino . Hoje a gente sai com projeto que ninguém conhece, mas internamente a gente quer que esse projeto seja essa referência. A gente trouxe a Cristiane por isso. Entramos com a responsabilidade de ser São Paulo. O primeiro objetivo é se estabelecer no mercado. A gente tem que começar a tratar a modalidade como futebol, não como algo diferente, e é isso que estamos tentando fazer".

Trajetória de Cristiane

Clubes:
Juventus, Turbine Potsdam (Alemanha), Wolfsburg (Alemanha), Linköping (Suécia), São Bernardo, Corinthians, Chicago Red Stars (Estados Unidos), Santos, Rossiyanka (Rússia), Daekyo (Coreia Do Sul), Centro Olímpico, Paris Saint-Germain (França), Changchun Yatai (China)

Títulos:
Bicampeã Sul-Americano Sub-19 (2001 | 2002)
Tricampeã Sul-Americano Adulto (2002 | 2010 | 2014)
2 medalhas de prata em Jogos Olímpicos (2004 | 2008)
Medalha de prata na Copa do Mundo (2007)
Tricampeã Pan-Americana (2003 | 2007 | 2015)
Campeã da Champions League (2005)
Bicampeonato Alemão (2005 | 2006)
Campeã da Copa da Alemanha (2005)  
Campeã do Brasileirão Feminino (2013)
Campeã da Copa do Brasil (2009)
Bicampeã Libertadores (2009 | 2010)

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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