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40 anos de carreira e 100 títulos: treinadora faz história no basquete

Roberta Nina

26/12/2018 10h04

A Dama de Ferro do basquete masculino (Foto: Bello/CBB)

São quase 40 anos dedicados ao basquete e mais de 100 títulos conquistados. Mas história de Thelma Tavernari tem muitos detalhes interessantes antes dela cravar seu nome na história do basquete brasileiro.

Sua mãe ficou viúva muito jovem, aos 30 anos, e viu como saída para entreter suas cinco filhas proporcionar uma rotina esportiva para elas dentro do clube. Foi em São Bernardo que Thelma descobriu o basquete.

"Comecei a jogar aos 16 anos porque faltava gente na quadra. A professora chamou eu e minhas duas irmãs para jogar e nós tivemos a infelicidade de perder de 51 a 0 e ainda eu fiz duas cestas contra. Aí eu passei a odiar esse esporte", revelou a treinadora no podcast das dibradoras.

A paixão foi aparecendo aos poucos, enquanto ela observava as irmãs jogando e percebia que elas não seguiam as orientações das treinadoras. Dispostas a mostrar que estava entendendo o jogo, ela passa a treinar no time e a ascensão chega quatro meses depois. "Disputei alguns campeonatos, venci e quatro meses depois já estava jogando pela seleção paulista e a brasileira na sequência", contou.

Carreira como atleta

Depois de cinco anos defendendo o time de São Bernardo, Thelma jogou pela Pirelli por duas décadas. Pela seleção, atuou ao lado das duas melhores gerações do basquete feminino – de 1970 até 1893 -, com Heleninha, Maria Helena e Norminha e depois com Paula e Hortência.

"Tenho sete títulos sul-americanos e eu não acredito que hoje a gente tenha dificuldade pra ganhar da Argentina, do Peru. Para mim, o grande problema, é a falta do esporte ser praticado dentro das escolas", ressaltou.

Para ela, há poucas oportunidades de trabalho dentro do esporte para aqueles que se formam em Educação Física. "Não há clubes – especialmente de basquete – para os educadores físicos atuarem, vejo uma grande migração desses profissionais para o ramo das academias, para trabalharem como tornar personal trainer, essas coisas", afirmou.

Carreira como treinadora

Mas as particularidades da vida de Thelma aparecem antes dela cursar Educação Física: aos 13 anos prestou um concurso na Prefeitura para dar aulas no Mobral (Movimento Brasileiro de Alfabetização criado na década de 70 com o objetivo de erradicar o analfabetismo no Brasil).

"Eu trabalhava no Departamento de Educação da Prefeitura dando aulas para o Mobral. Aos 16 anos eu comecei a jogar e dois anos depois eles me transferiram para o Esporte. Com 25 anos passei a dar aulas de escolinha de basquete, depois fui ser técnica de um time feminino, mudei para o masculino e sigo assim até hoje", disse a ex-jogadora que também é formada em Psicologia (pela USP) e Pedagogia (em Santo André).

"Comecei a trabalhar como técnica quando ainda jogava. Defendia o Santo André e trabalhava em São Bernardo. Fiz Educação Física e dois anos de curso técnico na USP e como viajava bastante defendendo a seleção, ia ver treinos de outros times e me preocupava em aprender. O estudo me credenciou, mas teve até treinador que me disse que eu nem conhecia o corpo de um homem então como é que eu queria ser técnica de time masculino?", revelou Thelma.

Como de praxe, a treinadora já foi contestada algumas sobre como ela fazia para orientar seu time no vestiário. "Da mesma forma que meu treinador fazia comigo, eu também faço com os meninos. Eles se trocam e depois eu entro no vestiário. Essa era a maior preocupação dos repórteres", revelou.

Há 25 anos ela treina as categorias de base do Esporte Clube Pinheiros e é uma das maiores formadoras do basquete masculino do Brasil. Há dois anos, recebeu o convite de Guy Peixoto, presidente da Confederação Brasileira de Basquete, para treinar as equipes de base do Brasil.

Equipe brasielira campeã Sul-Americana Sub-15 Masculino em 2018 (Foto: Divulgação/CBB)

Com Thelma no comando, o sub-14 foi campeão Sul-Americano em 2017, na Venezuela. O último título do Brasil nas categorias de base, entre os homens, havia sido em 2014 e nesta ocasião, Thelma foi a única mulher a treinar uma equipe na competição.

Em novembro deste ano, sob seu comando, foi a vez do sub-15 conquistar o mesmo título, no Uruguai. Assim, Thelma alcançou a marca de 108 títulos vencidos na carreira de treinadora e recebeu o apelido de "Dama de Ferro".

"Em 2017, na Venezuela e esse ano no Uruguai, depois que acabou o campeonato e a gente foi campeão, muitas mulheres vieram me cumprimentar dizendo que era muito mais gostoso ver uma mulher derrotando os homens na quadra. Mas sempre faço questão de reforçar que são os atletas quem ganham o jogo", nos contou via podcast.

O Brasil já está classificado para jogar a Copa América de Basquete sub-16 e a treinadora revelou que o campeonato será realizado aqui no Brasil. "Essas duas conquistas sul-americanas vieram para provar que existe trabalho, o que não tem é sequência", afirmou.

Olhando para o futuro, Thelma se diz otimista e acredita que a modalidade já está preparando bons frutos para os próximos anos. "Acho que essa geração entre 2003 e 2005 tem muito talento. Na Olimpíada de 2024 a gente vai ter alguns desses meninos prontos, jogando."

Após anos de dedicação ao esporte, Thelma Tavernari entrou para o Hall da Fama do basquete de São Paulo e recebeu uma super homenagem por parte da CBB no final de 2017. No intervalo do jogo entre Pinheiros e Bauru, Thelma recebeu das mãos de Oscar uma camisa autografada por todos os jogadores da seleção campeã e muito mais do que isso: o reconhecimento pelos 39 anos formando atletas para o basquete brasileiro.

(Foto: CBB)

Thelma se emocionou demais com a homenagem o presidente da CBB, Guy Peixoto, fez questão de reforçar o valor imenso da treinadora para o basquete masculino do Brasil.

"Homenagear a Thelma é quase como que reparar uma injustiça. Uma técnica com a sua capacidade já deveria ter comandado uma seleção brasileira há tempos. E logo em sua primeira participação o Brasil chegou ao topo do pódio. Ela merece toda a nossa reverência pelo excelente trabalho que vem fazendo ao longo do tempo com a base e pelo seu troféu de número 101. Que seja o primeiro de tantos outros com a seleção brasileira", declarou na ocasião.

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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