Com investimentos de Juve, Roma e Milan, Itália resgata futebol feminino
A Itália pode não ter se classificado para a Copa do Mundo da Rússia, mas a seleção feminina do país já garantiu a vaga para a Copa da França no ano que vem com uma campanha quase perfeita.
Após 20 anos sem conseguir se classificar para o Mundial feminino (a última vez que as italianas estiveram na competição foi em 1999), a Itália vive um momento de transformação no futebol feminino. Com grandes investimentos recentes de alguns dos principais times de camisa, como Juventus, Roma, Fiorentina e Milan, o país conseguiu um feito histórico nas eliminatórias europeias garantindo a classificação com uma campanha de 7 vitórias em 8 jogos.
A vaga não veio à toa. É consequência de um trabalho que tem sido muito bem feito na Itália pela evolução da modalidade – e que conta muito com a participação dos times tradicionais do país, que viram no futebol feminino uma nova oportunidade de negócio.
A Juventus, maior campeã italiana com 34 títulos da Série A (a primeira divisão da Itália), decidiu investir no futebol feminino na última temporada criando um time do zero em 2017. O clube estava disposto a oferecer toda a estrutura que o time masculino usa às jogadoras e entrou apostando nesse novo mercado com muito planejamento. Resultado? O primeiro título da Série A feminina já veio na primeira temporada da Juventus no torneio.
"A chegada da Juventus deu um empurrão enorme para toda essa transformação. Nós falamos mais sobre futebol feminino nos últimos seis meses desde a chegada da Juventus do que nos últimos 10 anos", afirmou à AFP Milena Bertolini, técnica da seleção italiana (responsável pela classificação da equipe nacional para a Copa do ano que vem), sobre o impacto da chegada do clube de Turim investindo no futebol delas.
O diretor de futebol feminino da Juve, Stefano Braghin, também reforça que os planos do time para a modalidade são ambiciosos. O dinheiro, obviamente, não está vindo neste início do próprio futebol feminino, já que é primeiro preciso investir, para depois ter retorno. Mas o clube separou uma parte do lucro advindo do sucesso do time masculino para aproveitar aquilo que eles consideram uma oportunidade de negócio.
"Nós temos um orçamento suficiente para alcançar o objetivo traçado pelo clube: se tornar um time de calibre internacional no futebol feminino. Uma menina que torce para a Juventus agora tem a possibilidade de também vestir a camisa do clube jogando aqui. Abre-se uma possibilidade para paixões que antes eram sufocadas", afirmou o dirigente.
Para estrear diretamente na primeira divisão, a Juventus comprou um time que já tinha a vaga – o Cuneo, e montou a equipe que se tornaria campeã italiana já na sua estreia na temporada.
O sucesso do time de Turim despertou também o interesse dos rivais investirem no futebol feminino. Os casos mais recentes são Milan e Roma, que também estrearão nesta temporada com uma equipe de mulheres.
No último dia 15 de junho, quando a seleção feminina da Itália já havia confirmado a classificação para a Copa do Mundo, a Roma fez seu anúncio oficial no site: "Temos o orgulho de anunciar que o clube terá um time competindo na Série A feminina nesta temporada. O clube acredita que toda criança merece a mesma oportunidade: que meninas e meninos precisam ter a mesma chance de sonhar em um dia entrar em campo vestindo as famosas cores da Roma", dizia a nota publicada no site oficial.
"Tenho muita satisfação de anunciar que nesta temporada nós teremos um time masculino e um time feminino em campo. Temos muitas meninas na escolinha do clube e o anúncio de hoje significa que elas terão mais oportunidades de se desenvolver e quem sabe um dia poderão jogar futebol profissionalmente por esse clube", afirmou o presidente Jom Pallotta.
O Milan também fez o anúncio no mesmo mês, algo ainda mais bombástico dado que o time de Milão nunca havia tido uma equipe feminina em toda a sua história. O clube comprou o Brescia, outro time que já tinha a vaga na Série A, e agora oferecerá toda a sua estrutura e investimento para a equipe deslanchar.
"O Milan anuncia que a partir da temporada 2018/2019, o clube irá participar pela primeira vez na história da Série A feminina com a compra do ACF Brescia. Isso mostra que o Milan está dando um passo a mais no projeto da Federação Italiana de desenvolver o futebol feminino no país", afirmou o clube em comunicado.
Os planos da equipe também são ambiciosos e o objetivo é conseguir uma vaga para disputar a Champions League nos próximos anos. O time está sendo montado também pensando em trazer jogadoras estrangeiras – Thaisa, meio-campista da seleção brasileira, é uma das possíveis contratações a serem confirmadas.
Há até mesmo um embate judicial acontecendo neste mês para ver quem será responsável por organizar as competições do futebol feminino: se a liga amadora, como é hoje, ou a liga profissional dos clubes.
Com tudo isso, a Itália mostra que está disposta a transformar a realidade do futebol feminino no país. A classificação para a Copa do Mundo é uma conquista que pode alavancar ainda mais os investimentos dos clubes na modalidade. E a entrada de times de camisa nesse projeto é essencial para atrair mais público e despertar interesse de marcas e mídia para esse novo negócio.
Assim, o país mostra que é possível transformar um ciclo vicioso em um ciclo virtuoso. A velha ladainha de "futebol feminino é chato" ou "ninguém quer ver futebol feminino" começa a cair por terra quando um projeto de verdade é pensado por todas as áreas juntas: a federação italiana criando um plano para a seleção evoluir e se classificar para a Copa, os clubes investindo em estrutura e enxergando a modalidade como uma oportunidade de negócio – e não mera obrigação, como muitas vezes acontece no Brasil -, e a consequência disso é natural: mais empresas investindo no futebol feminino e acreditando em seu potencial.
Como bem disse a torcedora da Juve nesse vídeo, "futebol é futebol. See você gosta de futebol, não tem essa de homem ou mulher, é tudo futebol".
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