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Super Bowl 53: liberdade para os mamilos de Adam Levine e Janet Jackson

Renata Mendonça

04/02/2019 15h58

Foto: AFP

Se você é um dos mais de 100 milhões de espectadores ao redor do mundo que acompanharam o Super Bowl 53 no último domingo, você provavelmente acompanhou também o tradicional "show do intervalo", que teve a banda Maroon 5 no comando do espetáculo em Atlanta. Talvez tenha passado despercebido, mas durante a performance, Adam Levine, o vocalista, tirou a camisa e cantou para a multidão com os peitos desnudos. Normal, né? 

Pois é, para mim também parecia, até me deparar com as redes sociais nesta segunda-feira levantando uma questão bastante emblemática sobre isso. 

"Por que é ok ver os mamilos de Adam Levine, mas não os de Janet Jackson?", questionou a atriz Aisha Tyler pelo Twitter. Seu post teve 47 mil curtidas e quase 7 mil retuítes. 

O debate foi extenso nas redes sociais e chegou até o Brasil. A comparação vem por conta de um episódio que marcou para sempre a carreira de Janet Jackson no Super Bowl de 2004, quando a cantora ficou com um seio à mostra – contra a sua vontade, diga-se. Justin Timberlake cantava junto com ela é a performance incluía um momento em que ele abriria a blusa dela no palco. No entanto, o cantor acabou abrindo inclusive seu sutiã e, por questão de segundos, o mamilo de Jackson ficou à vista na transmissão do evento esportivo mais assistido no mundo. Resultado? A destruição de sua carreira. A emissora CBS foi multada por isso, e a cantora perdeu uma série de contratos pela suposta "pouca vergonha" na TV. Justin seguiu carreira e decolou, tendo inclusive conseguido a chance de cantar no Super Bowl do ano passado, enquanto Jackson ficou "esquecida". 

E então 15 anos depois, um homem (Adam Levine) fica sem camisa por muito mais do que alguns segundos no auge de sua perfomance, exibindo seus mamilos para os mais de 100 milhões de espectadores, sem que nenhum patrocinador reclamasse, nenhuma emissora se chocasse, nenhuma multa fosse sequer debatida. Mas claro, todo mundo vai dizer que ver Adam sem camisa "é normal". Ver homens sem camisa é normal o tempo todo, de fato. Ja imaginaram se Adam fosse uma mulher, que tivesse passado os minutos de seu show no Super Bowl dançando sem blusa, sem sutiã, com os mamilos à mostra? Quão subversivo seria isso? Se mesmo quando aconteceu por um acaso, sem a autorização de Janet Jackson, ela acabou  "condenada" por isso, o que teria acontecido se ela tivesse realmente decidido cantar no palco sem camisa, como fez Adam?

Foto: AP

A ideia aqui não é criar polêmica com o fato de Adam Levine ter tirado a camisa para cantar. Mas sim acabar com a polêmica que já constrangeu tantas mulheres por causa de "simples" mamilos. Amamentar em público, por exemplo, é algo tão "condenado" que é preciso uma lei para garantir às mulheres e aos seus bebês esse direito básico. Quantas delas não precisam amamentar sentadas no vaso sanitário de um banheiro minúsculo, isoladas de qualquer contato social porque os peitos de uma mulher à mostra (ainda que para alimentar um filho) chocam a sociedade como se fossem uma aberração.

Até mesmo uma simples comemoração de um título em um momento de êxtase da jogadora americana Brandi Chastain, após bater o pênalti que garantiu o Mundial para os EUA em 1999 virou polêmica porque ela tirou a camisa para celebrar a conquista – e mesmo estando com top por baixo e sem exibir nada dos seios, a jogadora viu sua imagem estampada em todos os jornais e recebeu muitas críticas por sua atitude.

"Sempre vai ter alguém dizendo: 'por que você fez isso? É desrespeitoso'. Mas eu fico grata por esses comentários porque eles me deram espaço para falar sobre tudo que o futebol me deu", pontuou a agora ex-jogadora em entrevista à BBC em 2014. 

Detalhe: essa mesma comemoração da americana que gerou polêmica no futebol feminino é muito famosa e frequente no futebol masculino. Quem não se lembra de Cristiano Ronaldo e sua pose para as câmeras após marcar o gol da classificação do Real Madrid diante da Juventus nas quartas de final da Champions League no ano passado.

Foto: Getty

Então a verdade é que não existe polêmica em Adam Levine sem camisa no Super Bowl, assim como também não deveria ter existido com Janet Jackson em 2004, nem com Brandi Chastain em 1999. Mamilos ou peitos são apenas mamilos ou peitos, sejam eles femininos ou masculinos. É tudo parte do nosso corpo humano – que foi historicamente sexualizado quando é feminino, mas não quando é masculino. Não é uma questão de sair correndo na rua sem camisa, mas principalmente uma questão de não precisar ficar presa numa sala escura e isolada para amamentar. Uma questão de liberdade e menos julgamentos para todos os lados – tanto para o de Adam Levine, quanto para o de Janet Jackson.

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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