Dibradoras http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. Mon, 29 Mar 2021 20:00:32 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 1ª jogadora trans no futebol argentino: “Hoje posso ser quem realmente sou” http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/03/01/1a-jogadora-trans-no-futebol-argentino-hoje-posso-ser-quem-realmente-sou/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/03/01/1a-jogadora-trans-no-futebol-argentino-hoje-posso-ser-quem-realmente-sou/#respond Mon, 01 Mar 2021 13:06:27 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=11044

Mara, a segunda de azul, em sua estreia em campo (Foto: Juan Abromata/AFP)

Mara Estefania Gomez fez história aos 23 anos ao estrear no futebol profissional argentino como a primeira jogadora trans do país. “Nunca achei que poderia ser uma jogadora profissional e hoje estou na primeira divisão”, conta a atacante pelo Club Villa San Carlos.

Em dezembro de 2020, a argentina entrou em campo pela primeira vez e escreveu seu nome tanto na história do futebol feminino quanto no das conquistas da comunidade LGBTQIA+. Criada em uma casa de quatro mulheres, todas amantes do esporte inglês, a atleta só começou a jogar bola na adolescência, como um meio de se distrair das questões que a rodeavam naquele momento. Mara conta que já se sentia diferente desde os 11 anos de idade, mas foi com 15 que aceitou o convite de sua vizinha para jogar uma partida em seu bairro.

(Foto: Juan Abromata/AFP)

Aqui no Brasil, a discussão sobre atletas trans surgiu pela primeira vez com força em 2018, quando a jogadora de vôlei Tiffany Abreu recebeu autorização para disputar a Superliga pelo Vôlei Bauru. A medida recebe opiniões controversas principalmente por haver a ideia de que mulheres trans possuem vantagem física em relação a mulheres cis.

O Comitê Olímpico Internacional, COI, determinou em 2016 que as atletas trans podem participar, desde que mantenham seu nível de testosterona abaixo de 10 nanomols por litro de sangue. Para Mara, a medida é injusta: “Você obriga um atleta a passar por um processo invasivo para o corpo, que altera as funções fisiológicas, nossas características primárias e secundárias e ainda tem influência sobre a parte muscular, podendo até causar uma atrofia”, afirma Mara.

Formada em enfermagem, ela também adverte que o tratamento pode causar complicações cardiorrespiratórias ou outras patologias. Para os órgãos esportivos, a quantidade de testosterona seria o que determinaria uma vantagem para as mulheres trans e, por isso, a necessidade do controle nesses casos.

Pessoas trans na sociedade

Segundo dados da Associação Nacional de Transexuais e Travestis (Antra), a expectativa de vida da população trans e travesti é de 35 anos, metade da média nacional. A dificuldade em encontrar espaço no mercado de trabalho também leva a 90% da comunidade a encontrar sustento por meio da prostituição. Embora em 2019 o Supremo Tribunal Federal tenha determinado que a discriminação pela orientação sexual ou identidade de gênero seja crime equiparável ao de racismo, a situação no país ainda é preocupante. Levantamentos do Grupo Gay da Bahia do mesmo ano apontam que uma pessoa da comunidade LGBQTIA+ é assassinada a cada 23 horas no país, a maioria mulheres trans ou travestis.

(Foto: Juan Abromata/AFP)

Na Argentina, a realidade é diferente: desde 2012, a legislação prevê que os cidadãos têm “direito ao reconhecimento de sua identidade de gênero, ao livre desenvolvimento de sua pessoa, a ser tratada de acordo com sua identidade de gênero e a ser identificada desse modo nos instrumentos que credenciam sua identidade”.

Para Gomez, o país é um modelo a ser seguido na conquista por direitos dessa agenda: “Aqui, temos um privilégio que é uma lei que fala sobre corpos trans e é possível dar mais visibilidade à comunidade LGBQTIA+. Hoje, somos um exemplo para outros países adotarem as mesmas políticas de inclusão e aos poucos vamos acabando com os paradigmas das relações patriarcais que regiam as nossas vidas”, afirma.

O início da sua participação no esporte não foi muito diferente do enredo de diversas jogadoras: não havia muitas competições de futebol feminino enquanto a atleta ia começando a desenvolver suas habilidades. Pouco a pouco, as ligas locais começaram a surgir e Mara encontrou nelas a possibilidade de realizar o sonho de viver como esportista.

(Foto: Juan Abromata/AFP)

Em fevereiro do ano passado, ela foi contratada para um time da primeira divisão: o Club Villa San Carlos. Com a paralisação do torneio por conta da pandemia do coronavírus, sua estreia nos gramados já teria que ser adiada, mas um novo obstáculo entrou em questão. Sua participação no campeonato dependia do aval da AFA, a Associação de Futebol da Argentina, que precisava incluir mulheres trans no regulamento.

“Tivemos reuniões para fazer acordos com a AFA, inclusive com o presidente, Chiqui Tapia, para poder fazer esse acordo para que eu pudesse jogar e que o futebol feminino na Argentina pudesse ser mais inclusivo”, conta Mara. Segundo ela, o órgão a tratou com o devido respeito durante as reuniões. “Eu fui capaz de me impor ali com meu corpo e com a minha voz, mas também com respeito e com amor para que pudessem me escutar. Expliquei que para mim era uma necessidade continuar jogando futebol. No final, conseguimos nos escutar e o resultado foi positivo”, complementa.

Em dezembro, Mara estreou em uma partida contra o Lanús que já começou com uma boa dose de emoção. Antes de entrar em campo, o adversário a presenteou com um unforme com seu nome, um gesto simbólico que logo viralizou na internet.

(Reprodução Instagram)

Em um post nas redes sociais, a atacante postou uma foto da emoção ao receber a camisa e afirmou: “Não foi mágica, não foi sorte e nem um presente. Foi uma vida de luta, sofrimento e tristeza. Tive uma vida que passou perto da morte e o coração partido. (…) Hoje minha alma voltou para o meu corpo”. Ela conta mais sobre a conquista: “Pessoalmente, é sobre poder ser quem eu sou. Hoje eu sinto que esse é um estilo de vida que eu posso seguir, e isso me mostra que tenho oportunidades. E no nível coletivo, é o resultado de anos de lutas das gerações passadas que buscaram ser reconhecidas na sociedade. Fico muito feliz de saber que hoje eu sou uma referência através desse passo enorme para a inclusão que demos dentro do esporte e espero que isso também abra oportunidades para a geração que ainda está por vir”, afirma Mara.

(Reprodução Instagram)

Olhando agora para o futuro, a atleta se diz otimista em relação às expectativas para o crescimento do futebol feminino e as conquistas dos direitos da população LGBQTIA+. “Acredito que um dia teremos igualdade e equidade dentro do esporte. Espero que as mulheres possam receber [salários] como os homens e que possam viver suas vidas como os jogadores vivem. E, principalmente, espero que as jogadoras possam viver fazendo aquilo que amam”.

Mara finaliza com um recado que também traduz um desejo pessoal: “Gostaria que todas as pessoas, independente do gênero, pudessem jogar futebol profissionalmente e acredito que não vá demorar muito para que isso aconteça.”

Reportagem de Laís Malek

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Celeiro de craques, Juventus está perto de encerrar futebol feminino http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/02/26/celeiro-de-craques-juventus-esta-perto-de-encerrar-futebol-feminino/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/02/26/celeiro-de-craques-juventus-esta-perto-de-encerrar-futebol-feminino/#respond Fri, 26 Feb 2021 16:54:34 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=11035

Elenco do Juventus no Brasileiro A2 (Foto: Ale Vianna)

Na última quarta-feira (23) as atletas do Juventus usaram as suas redes sociais para um desabafo coletivo. Segundo as jogadoras, o clube paulista caminha para encerrar a modalidade e sequer comunicou o elenco.

Após chegar às quartas de final do Campeonato Brasileiro A2 de 2020 e ser eliminado pelo Napoli, atual campeão, denúncias de falta de pagamento e transparência começaram a pipocar na internet. Vale ressaltar que o Juventus não paga salário para as suas atletas e não há nenhum tipo de contrato, apenas ajuda de custos.

A boa campanha no nacional (apenas uma derrota em nove jogos) não foi o suficiente para o futebol feminino do clube se garantir em 2021, como explica a goleira Dani Lameu. “Fizemos uma ótima campanha, jogamos o Campeonato Brasileiro A2 pela primeira vez e chegamos nas quartas de final. Demos um ótimo retorno por ser a primeira vez que jogamos um campeonato desse nível e simplesmente no começo deste ano não nos informaram sobre o que iria acontecer. Fizeram a gente gastar dinheiro para ir treinar durante um tempo prometendo uma resposta e chegou lá não tivemos a resposta”, diz a arqueira.

(Reprodução Intagram / Welington Souza)

Ex-companheira de Dani na equipe, Emilly Santos critica a falta de diálogo por parte da diretoria. “Tudo começou em janeiro deste ano. Nosso treinador (Wellington), que sempre foi muito transparente com a gente em relação a tudo o que acontecia no clube referente ao feminino, nos comunicou que havia entregado o planejamento de 2021 para a diretoria e que não deram nenhuma resposta. Sem saída para essa confusão, ele (Wellington) nos comunicou que sairia do clube, já que não estava de acordo com o que a diretoria estava fazendo com a gente. Após isso, começou o desmanche total do elenco”, explica a volante.

Emilly estava no Juventus desde março de 2017 e anunciou sua saída por meio de suas redes sociais. “Muitas atletas começaram a desanimar e questionar o que tinha acontecido, como seria esse ano, se de fato iríamos disputar o Campeonato Paulista ou se íamos treinar por treinar. Continuei no clube até o último dia na esperança de ter boas notícias, até que no dia 10 de fevereiro, último treino nosso, a comissão nos comunicou que também sairia por não estar mais aguentando a situação. Com isso, encerramos as atividades esperando esse tempo todo algum posicionamento da diretoria, mas nada feito”, disse a jogadora.

(Reprodução Instagram / Emilly Santos)

Dani Lameu também anunciou sua saída da equipe. No Juventus desde o tempo de escolinha, a goleira lamenta o fim. “Momento algum tivemos a intenção de difamar o clube, pelo contrário, sempre falamos bem e a única coisa que a gente queria era um retorno da situação atual, sentar e conversar. Mas, não fizeram. Essa foi a nossa indignação, ver a categoria ‘acabar’ e não ter uma notícia sobre”, pontua a arqueira.

O que diz a diretoria?

Amaury Russo, assessor especial do presidente e responsável pelo departamento de futebol feminino do clube, nega qualquer falta de contato com as jogadoras. “Muitas me ligam, eu falo com muitas. No último treinamento o Wellington (técnico) foi sincero com todas as atletas, ele falou em meu nome para todas elas, colocou bem claro. Algumas atletas procuraram a Cristina (assessora de imprensa), nos procuraram, fomos sinceros. Isso foi falado no último treinamento. Foi uma ordem que eu passei para ele falar com elas”, explica o dirigente.

(Reprodução: Instagram Juventus Futebol Feminino)

O Juventus estima um orçamento de 150 mil reais para o futebol feminino em 2021. Segundo Amaury, só será possível manter a modalidade caso surja um patrocinador até o dia 15 de março disposto a arcar com este valor. “O futebol feminino hoje deu uma inflacionada. Tem time disputando Campeonato Paulista pagando cinco, seis, sete mil reais para as jogadoras. Nós não temos condições disso. Nós só pagávamos transporte para elas virem treinar. Nós não temos condições de tirar do orçamento social, precisamos de patrocínio. É quase que 15 mil reais por mês”, diz o responsável pelo departamento.

Atualmente o Juventus conta com 14 atletas no elenco. Para 2021, era previsto disputa do Paulistão Feminino e da Copa Paulista. Amaury lamenta a crise atual do clube e credita a má fase à pandemia da Covid-19. “Tentei falar com o presidente novamente, sensibilizá-lo. Ele me mostrou todo o balancete do clube, o que entra, o que sai, não temos condições de fazer isso por conta da pandemia, nem os associados estão frequentando o clube nesta fase. A pandemia escancarou as dificuldades do Juventus. Sem patrocínio mínimo a gente não vai conseguir tocar o futebol feminino, as empresas também estão com dificuldade”, explica o assessor.

Celeiro de craques e tradição na modalidade

Ver um clube como o Juventus interromper o futebol feminino dói no coração de todos que acompanham a modalidade. Campeão Paulista de 1987 (único título estadual da equipe reconhecido pela FPF), foi da Rua Javari que saíram nomes tão presentes em convocações de Seleção Brasileira, além do incrível trabalho de Magali Fernandes.

Técnica da época mais vitória do clube (de 1982 a 1987), Magali formou Cristiane, Érika, Thaisinha, Andressa Alves, Tamires, entre outras, incluindo a ex-atacante Roseli. Com poucos recursos e sempre lutando pelo melhor da modalidade, a ex-treinadora idealizou o que chamou na época de “Casa da Atleta”, uma espécie de alojamento para as meninas do time da Mooca, e cansou de tirar dinheiro do próprio bolso para investir em sonhos.

Magali e jogadoras que atuaram pelo Juventus (Reprodução/Facebook Magali Fernandes)

Realidade não muito diferente do que se vê hoje pelos entornos da Rua Javari. Na espera de um milagre (no caso, um patrocinador), Amaury Russo vai arcar pessoalmente com gastos antes prometidos às atletas que não foram cumpridos. “Eu tenho algumas meninas que eu vou ter que pagar do meu bolso porque eu já prometi. Umas que fizeram ressonância (exame), por exemplo. Já falei com algumas, essa semana, o mais tardar semana que vem, vamos saldar com todas essas ajudas de custos”, prometeu o dirigente.

“Estamos pedindo ajuda para as pessoas que têm contatos, para a mídia, para tentar nos ajudar com patrocínio. A esperança é o patrocínio. Nós sempre tivemos futebol feminino, quantas jogadoras passaram pelo Juventus? A Emily Lima (técnica), por exemplo, o primeiro contrato que ela fez no futebol feminino foi comigo, hoje ela está no Equador. Só que infelizmente não temos recursos financeiros para tocar o futebol feminino nesse momento, inclusive sem pagar salário”, finalizou Amaury.

Reportagem de Mariana Pereira

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Marta, 35 anos: Como a melhor do mundo mudou o jogo dentro e fora de campo http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/02/19/marta-35-anos-como-a-melhor-do-mundo-mudou-o-jogo-dentro-e-fora-de-campo/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/02/19/marta-35-anos-como-a-melhor-do-mundo-mudou-o-jogo-dentro-e-fora-de-campo/#respond Fri, 19 Feb 2021 07:00:31 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=11016

(Foto: Lucas Figueiredo/CBF)

Desde 1986 o dia 19 de fevereiro nunca mais foi o mesmo. De Dois Riachos, Alagoas, para o mundo, Marta Vieira da Silva Veiga completa nesta sexta-feira (19) 35 anos de idade sendo absoluta dentro de campo e traçando um belo e exemplar caminho fora dele.

Eleita seis vezes a melhor jogadora do mundo, a atleta do Orlando Pride voltou os holofotes para si no Mundial da França, em 2019, de uma forma diferente. Dessa vez, Marta usou sua voz – e melhor ainda, seus gestos – para lutar por algo que lhe fez sair do “anonimato” quando o assunto é posicionamento: a igualdade de gênero.

Não estávamos acostumados a ver Marta levantando bandeiras e/ou indo aos microfones para chamar a atenção para algo que não fosse de dentro das quatro linhas. Conhecíamos a líder nata do campo, mas passamos a conhecer também a ativista que aflorou com a maturidade.

Embaixadora global da Boa Vontade pela ONU Mulheres desde 2018, quando assumiu o posto, a camisa 10 da seleção brasileira trabalha para incentivar mulheres e meninas a quebrarem a barreira do preconceito. Duas vezes prata em Olimpíadas (2004 e 2008) com o Brasil, além de um vice Mundial (2007), a aniversariante do dia tem muito mais a dizer hoje do que quando estreou em uma Copa do Mundo, há 18 anos.

(Foto: Reprodução Instagram)

Na França, recordes, cobranças e lutas

A derrota para a Austrália por 3 a 2 na segunda rodada da fase de grupos da Copa do Mundo da França ganhou outro tipo de destaque. Após marcar o primeiro gol do Brasil – e do jogo – de pênalti, Marta apontou para a sua chuteira preta, lisa, sem patrocínio e exibiu o símbolo da campanha “Go Equal”, em referência a equidade de gênero.

Com apenas um gesto, a camisa 10 da seleção trouxe à tona uma importante questão na luta pela igualdade entre homens e mulheres. Considerada por muitos a melhor jogadora do mundo, Marta segue, por opção, sem qualquer patrocinadora de material esportivo desde 2018. A atleta entende que essa é uma forma de buscar valorização e tenta passar isso para as suas colegas de profissão.

(Foto: @GoEqual__)

“Ela tem direito a patrocínio e não aceita qualquer coisa igual a gente aceita. Ela fala que a gente tem que se valorizar, que o futebol feminino está assim por falta de valorização. Oferecem para dar uma chuteira e a gente vai lá e aceita, e ela diz que não, que não é para aceitar, que temos a condição de ir lá e comprar. Quando ela entra na causa é por isso, não é qualquer migalha que temos que receber, não é só uma chuteira, uma roupa. Lógico que a gente precisa, é um gasto a menos e a gente acaba se contentando com pouco”, explicou Fabi Simões, jogadora do Internacional e amiga de Marta, com quem atuou junto no Tyresö, da Suécia, em 2014.

Para Camilinha, atleta do Palmeiras, a camisa 10 da seleção entende o momento de se posicionar. “Para ela (Marta) acontece tudo natural. Ela fala quando acha que tem que falar, ela pensa muito antes. Como se fosse um roteiro, ela diz: ‘Se eu chegar e falar isso agora, no meio disso tudo, minha palavra talvez não valha tanto, eu preciso falar disso no momento certo onde todo mundo vai poder me ouvir, vai poder me escutar’. Como foi a questão da igualdade na Copa do Mundo. Ela não precisou falar, ela simplesmente colocou na chuteira dela e viralizou. Ela é calculista para falar no momento que ela acha que tem que falar”, disse a ex-jogadora do Orlando Pride, clube que Marta atua desde 2017.

Ainda na França, Marta continuou fazendo história. Contra a Itália, marcou seu gol de número 17 em Copas do Mundo, ultrapassando o alemão Klose na contagem e se tornou artilheira absoluta em Mundiais (entre homens e mulheres, inclusive). Além disso, ousou nos batons e fez um desabafo em forma de cobrança após o Brasil ser eliminado pelas francesas nas oitavas de final, exigindo empenho da nova geração.

“Foi um desabafo normal de uma pessoa que é líder técnica de uma seleção há duas décadas e é cobrada por isso. É natural ter esse acúmulo, não de responsabilidade porque eu tenho certeza de que ela é a mesma, ela quer entrar e ganhar, mas o microfone vai para a boca dela. Quando ela fala que não vai ter mais a Marta, ela fala que não vai ter mais a Cristiane, a Formiga, ela amplia. Mas foi uma forma literalmente de dizer: ‘Olha, vai ter uma hora que não vai mais ter eu aqui, nem essas referências’”, apontou Aline Pellegrino, Coordenadora de Competições Femininas da CBF e ex-companheira de Marta na seleção.

“Com as meninas que estão chegando agora ela também conversa, incentiva, conta um pouquinho da história dela e faz elas entenderem que estar em um clube quanto na seleção é muito importante, que você tem que agarrar com todas as suas forças porque pode ser talvez a única chance”, afirmou Camilinha.

O peso da idolatria

Quando Marta começou no futebol lá em 2004 atuando pelo Vasco, fazia apenas 25 anos que as mulheres tinham ganhando o direito de praticar a modalidade no Brasil – na mesma época a seleção brasileira masculina já era tricampeã Mundial. O atraso com a proibição reverbera até hoje no feminino, e a camisa 10 não escapou de duras cobranças.

(Foto: Rafael Ribeiro/CBF)

“É difícil… se a gente pensar numa seleção masculina, pegar temporalmente de 2007 a 2021, a Marta segue sendo referência nesse período todo, isso não acontece no masculino. Imagina você, sem querer ser… ela não virou e falou: ‘Gente, eu quero ser a líder técnica da seleção brasileira, quero ser a melhor do mundo seis vezes, vou assumir tudo isso aqui por duas décadas’, e você ainda ter que ser essa líder fora do campo. Então ela vem carregando isso há todo esse tempo”, declarou Aline Pellegrino.

“Teve um tempo em Orlando em que a gente estava numa fase muito difícil, perdendo muitos jogos e ela disse: ‘Cara, isso aqui não é bom para mim, eu gosto de ganhar, gosto de jogar feliz, isso está me deixando doida, maluca’ e ela chorava porque é muito importante isso para ela. A gente não estar ganhando para ela a culpa era dela. Então quando ela não sente que ela está valendo a pena, não está sendo suficiente, ela se sente mal”, contou Camilinha.

“Ela sofreu a infância dela inteira, passou por dificuldades e sempre precisou ter a voz muito forte para poder lidar com as coisas, preconceito, saiu muito cedo de casa para dar uma vida melhor para a família dela, não desistiu disso”, completou a jogadora do Palmeiras.

(Foto: Reprodução Instagram)

A responsabilidade de ser a 10

Seja na seleção ou em clubes, a 10 é da Marta. Além das medalhas de prata em Olimpíadas e Mundial, a alagoana tem com o Brasil os títulos Pan-Americanos de 2003 e 2007 e as Copas América de 2003, 2010 e 2018. Na Suécia, venceu Liga dos Campeões da UEFA, Campeonato Sueco, Copa da Suécia e Supercopa da Suécia.

Quando atuou pelo Santos, venceu em 2009 tanto a Libertadores como a Copa do Brasil. Nos Estados Unidos, já possuí duas vezes a Liga Americana (2010 e 2011). Como não criar expectativas quando se tem a craque no seu time?

“Nunca vi a Marta com esse peso de: ‘Eu que tenho que ir ali e fazer acontecer’. É assim: ‘Eu sei que eu tenho que dar o meu melhor e eu vou dar os meus 200 % porque se eu fizer isso o grupo todo cresce’”, afirmou Aline Pellegrino. “Quando a gente chegou na China, sabe o que é o hotel inteiro querer tirar foto com você? De repente tem 200 funcionários para tirar foto com você. Ela tem que lidar com isso desde muito cedo, de ser a estrela, de ter que dar atenção para todo mundo”, completou.

(Foto: Getty Images)

“Eu já vi várias pessoas falando que existia ‘várias Martas’. É muito difícil criar uma Marta, de liderança, espírito, ela é diferente. Aquilo dela dentro de campo é natural, falar, não se expor, em tudo. No futebol é muito mais difícil para ter o talento dela. Tem coisas que ela faz que a gente fica de boca aberta”, pontuou Fabi Simões.

“Ela já desabafou. Às vezes é muito… O nome dela é muito forte, as pessoas cobram para se pronunciar. Não que ela tenha ficado triste ou chateada, mas às vezes não está ao alcance dela e ela se sente mal por isso”, disse Camilinha.

Transcendendo gerações

Marta foi indicada pela primeira vez ao The Best em 2003 quando tinha apenas 17 anos. Levou seu primeiro troféu de Melhor do Mundo três anos depois. Ininterruptamente, foi soberana de 2006 a 2010 e voltou a ganhar o prêmio em 2018.

Estamos falando do maior nome do futebol feminino mundial, que muito em breve deve pendurar as chuteiras. Se teremos Marta envolvida com o futebol feminino mesmo após a aposentadoria, ainda não sabemos, mas legado às novas gerações não há de faltar.

“A gente está ali lutando por algo que é para nós, para alguém, que alguém passou mais dificuldade ainda do que a gente teve. É uma coisa muito natural se a gente pensar nesses 40 anos do futebol feminino, quatro gerações de muita cumplicidade mesmo, com respeito enorme, carinho enorme, todo mundo torcendo, ficando feliz pela conquista uma da outra, coisas que estamos conquistando agora que lá atrás não teve. A gente tem uma geração do futebol feminino brasileiro muito forte, de cuidar umas das outras, é orgânico e estamos nesse momento positivo”, disse Aline Pellegrino, ex-capitã da seleção brasileira por nove anos.

(Foto: Reprodução Instagram)

“Perseverança é a palavra-chave para ela. Ela não desiste enquanto ela não tem, ela é incansável. Enquanto ela puder estar jogando, em atividade, ela vai dar o melhor não só para ela, mas para quem está em volta. Ela se cobra muito e diz: ‘Se eu não der o meu melhor, como vou ser o espelho de alguém?’”, declarou Camilinha.

Feliz Aniversário, Vossa Majestade!

“Já na primeira vez que encontro a Marta (2004) enfrento como adversária num coletivo. Sobrou uma bola pelo lado direito, uma bola simples, de rotina. Eu estava anos luz dela, falei: ‘Vou chegar ali, domino, se ela apertar muito eu ponho a bola para fora, não me complico, tranquilo’. Eu devia estar a três metros da bola e ela a sete… Estou até hoje esperando a bola que eu ia dominar. Ela passou numa velocidade, juro, eu não sei como ela chegou na minha frente, por onde ela passou, falei: ‘Caraca, que que é isso?’”- Aline Pellegrino.

“Não consigo dizer tudo o que ela significa para mim. Ela esteve em momentos muito difíceis da minha vida, foi uma mãe para mim, foi minha conselheira, não me deixou cair. Com certeza vai ser lembrada por mim como a melhor pessoa do mundo. Ser a melhor do mundo é muito grande para ela, mas para o tanto que ela é, acho que é pouco” -Camilinha.

(Foto: Getty Images)

“É uma pessoa muito importante para mim, muito especial, que me ajuda muito tanto dentro quanto fora de campo. Falar da Marta é muito difícil porque eu tenho um carinho muito grande com ela, tenho ela como uma irmã, amo muito” – Fabi Simões

“Sem dúvida nenhuma vai ser uma das maiores figuras do esporte mundial daqui 10, 30, 50 anos. Vamos falar dela por muito tempo” – Aline Pellegrino.

Rainha, nosso coração é todo seu!

*Reportagem de Mariana Pereira

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Torcedora colorada de 4 anos viraliza na internet narrando gol de Cuesta http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/02/01/torcedora-colorada-de-4-anos-viraliza-na-internet-narrando-gol-de-cuesta/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/02/01/torcedora-colorada-de-4-anos-viraliza-na-internet-narrando-gol-de-cuesta/#respond Mon, 01 Feb 2021 16:15:22 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=11005

Camila e Helena vendo o Inter jogar (Acervo pessoal)

“De novo Cuesta, Cuesta, a batida…. gooooooooooool, é do Internacional. Cuesta faz 4×1 para o jogo virar. Vai, Internacionaaaaaaaal!”

Essa poderia ser, facilmente, a narração feita por algum homem durante um jogo do Colorado no Campeonato Brasileiro. Mas quem criou essa jogada e deu voz a um gol marcado pelo zagueiro Victor Cuesta foi Helena, de 4 anos, direto da na sala de sua casa em Porto Alegre.

A mãe da garotinha, Camila Melo, fez o registro em vídeo de maneira sorrateira enquanto a menina brincava com bonequinhos dentro de um campinho de futebol. De vestidinho colorido e cabelo preso, Helena postava sua voz e simulava uma partida de futebol.

Camila fez o registro no último domingo (31/1), postou em sua conta pessoal do Instagram e a jornalista da Rádio Gaúcha, Kelly Matos, pediu a gravação para a amiga e fez o vídeo viralizar na internet. Muitas jornalistas da área esportiva compartilharam o conteúdo, reforçando a importância da representatividade.

Uma delas foi a narradora da TV Bandeirantes, Isabelly Morais. “Esse vídeo me derrubou. Olhem isso, que coisa mais linda. Meu coração tá quentinho! Vamos mostrar pras meninas que elas podem seguir o que quiserem, inclusive narrar um jogo de futebol. A base vem forte demaisssss!”, postou a narradora em seu tuiter.

Foto: D.A. Press

Marcelo do Ó, locutor da BandNews FM também divulgou o vídeo de Helena e valorizou o trabalho das colegas narradoras. “Olha que lindo isso. Sonhem, meninas. Graças ao trabalho de Isabelly Morais, Natália Lara, Renata Silveira, Elaine Trevisan e Camilla Garcia e tantas outras esse sonho é possível.”

Isabelly, de fato, nunca pensou em ser narradora de futebol. Jornalista, ela aproveitou uma oportunidade que apareceu há quase 4 anos, enquanto trabalhava na Rádio Inconfidência e, de lá pra cá, buscou se aperfeiçoar na profissão e seguir essa nova trajetória.

Os brinquedos de Helena: boneca e bolas andam juntas (Acervo pessoal)

“Quando eu comecei a narrar, eu não via um mercado de narração de futebol para mulheres. E me emociona muito quando recebo mensagens de meninas que têm vontade e sonham em narrar futebol. Saber que esses sonhos são palpáveis, nos dá uma luz muito grande. Cada vez mais eu vejo um horizonte mais claro para a narração de mulheres. Nós somos muitas, espalhadas pelo país. Essas mulheres que narram precisam de pessoas que acreditem nelas, como o Toscano (José Augusto Toscano, coordenador de esportes da rádio Inconfidência) acreditou em mim em 2017. E para que isso seja mais facilitado, é necessário que o mercado de trabalho entenda e acolha essas mulheres. A gente está vivendo um momento muito histórico.”

+ Narradora: ‘Entendi que deveria continuar quando só vi homens ao meu redor’

O vídeo de Helena deu um sentido imenso para aquilo que hoje Isabelly e tantas outras narradoras estão fazendo, que é desbravar caminhos que antes eram inacessíveis para outras meninas. “É um exemplo para que as Helenas do futuro sejam mais bem acolhidas no mercado. É por isso que a gente batalha tanto hoje e já encontramos o mercado mais aberto do que outras mulheres encontraram há algumas décadas”, declarou a narradora ao blog.

Jogar, apitar e narrar

Camila tem 35 anos e é mãe dos gêmeos Helena e Vitor de 4 anos e seu amor pelo futebol vêm de criança. Mas durante a sua infância, não era tão aceitável ver meninas chutando uma bola. “Desde pequena sempre gostei de futebol. Minha família é toda colorada, tenho uma avó de 86 anos que não perde um jogo do Inter e é fanática”, contou ao blog.

Helena e Vitor com o avô nas dependências do Internacional (Acervo pessoal)

“Quando pequena eu gostava de futebol, mas menina não podia jogar, tinha todo aquele preconceito e eu ficava muito chateada. Naquela época, tinha o zagueiro Gamarra jogando no Inter e me chamavam de Gamarra nas brincadeiras. Eu achava o máximo aquilo, mas não podia jogar e não encontrava meninas pra jogar também”, disse a mãe de Helena que cresceu em meio à uma família que acompanha futebol de perto.

O pai de Camila é conselheiro e dirigente do Inter e seu marido, o advogado Luciano Iob, também é conselheiro do clube colorado. Seus filhos brincam juntos, seja de casinha ou de bola, e Helena sempre contou com o apoio dos pais para brincar daquilo que quisesse. E amor da garotinha pela bola não encontra barreiras.

“Ela gosta de narrar, de jogar e também de brincar de ser árbitra. No Natal ela pediu uma caneleira de presente e eu também dei à ela de presente uma Barbie que é juíza. Ela adora, chama o VAR, faz o quadradinho com a mão! E aí ela tem uma dúvida se quer ser árbitra, narradora ou jogadora”, revelou a mãe ao risos.

Helena e o irmão Vitor, torcedores do Inter (Foto: Acervo pessoal)

Falando especificamente da narração, Camila conta que a filha imita os narradores do Pay-Per-View do SporTV. “Ela tem uma entonação boa, né? No vídeo eu não consegui filmar, mas em certo momento ela fala ‘ao vivo no SporTV’ e é muito engraçado!”

A mãe fez a filmagem escondida da filha para que a menina não ficasse envergonhada e foi assim que o registro rodou a internet na tarde de domingo. “Ela sabe o nome de todos os jogadores, mas ela gosta muito do Cuesta. Ela acaba imitando os narradores homens porque no SporTV não tem mulheres, mas no ano passado, eu a levei para assistir o futebol feminino, na final contra o Grêmio pra ela ver que tem meninas no futebol também. Ainda mais porque eu moro num condomínio e só tem meninos jogando bola, ela é a única que brinca com eles ali”, contou.

Em breve, Helena terá uma mulher para se espelhar no canal. Renata Silveira foi contratada como a primeira narradora do Grupo Globo no final de 2020 e estreará em breve.

De certa forma, Camila faz questão de mostrar para Helena que ela pode ocupar qualquer espaço que desejar, especialmente no futebol, algo que foi muito diferente para ela quando criança. “Na minha época não tinha essa representatividade, né? Hoje a gente olha as mulheres narrando, as árbitras, as repórteres e na minha infância, o brinquedo era boneca. Não tinha a possibilidade de brincar com outra coisa. Hoje eu penso em propor aos dois que não existe brinquedo de menino e de menina. E como a gente tem um casal, os dois brincam com tudo.”

Helena e seu amor pela bola (Acervo pessoal)

Depois que o vídeo viralizou, a mãe ficou impactada com o sucesso da filha. “Eu falei pra Helena ontem: ‘tu sabia que está famosa agora?’ e mostrei o vídeo pra ela ver. Ela ficou com vergonha e perguntou ‘as pessoas viram?’. Eu disse que sim, que mais de 50 mil pessoas viram, entre elas, o Cuesta. Meu pai acabou mandando o vídeo pra ele e aí a Helena não quis mais saber de mais nada. Ficou feliz em saber que o Cuesta viu o vídeo”, revelou a mãe.

O vídeo de Helena é o resultado de como ter inspirações podem abrir espaços para que crianças possam sonhar em se tornar aquilo que bem entenderem, sem amarras.

“É uma transformação dos sonhos que a gente não podia sonhar em outras épocas. Talvez a Isabelly com quatro anos não teve essa possibilidade de ver uma mulher narradora. Hoje em dia a gente consegue dar essa oportunidade para as crianças serem o que quiserem. A Helena não precisa se reduzir a uma caixinha em que meninas não podem fazer certas coisas, ela pode ser o que quiser, graças à mulheres como a Isabelly.”

+ Isabelly é a nova narradora da Band: “cada passo que uma dá, é por todas”

Ver Helena em ação com apenas 4 anos de idade, deixou Isabelly muito feliz e a fez lembrar de como foi e ainda é árdua a luta das mulheres que ingressam na narração. “Quando eu narrei pela primeira vez em 2017 eu não pensava que narraria tão cedo numa TV aberta e tá acontecendo. Sempre digo que muitas mulheres batalharam para que eu tivesse a oportunidade hoje de narrar numa TV aberta. Então eu quero fazer da minha profissão uma oportunidade de batalhar todos os dias para que as Helenas do futuro encontrem cada vez mais espaços. Muitas lutaram por mim e eu preciso lutar pelas outras que virão depois de mim”, declarou a narradora.

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Co-irmão do Kindermann: a história do Napoli, que disputa o título da A2 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/29/co-irmao-do-kindermann-a-historia-do-napoli-que-disputa-o-titulo-da-a2/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/29/co-irmao-do-kindermann-a-historia-do-napoli-que-disputa-o-titulo-da-a2/#respond Fri, 29 Jan 2021 07:00:23 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=10983

Foto: Reprodução/Instagram @napolicacadorense

A finalíssima da Séria A2 (segunda divisão) do Campeonato Brasileiro Feminino coloca mais uma vez a cidade de Caçador em evidência. Após ver o Avaí/Kindermann ser vice-campeão da A1 em 2020, chegou a vez do município de Santa Catarina, com pouco mais de 79 mil habitantes, torcer pelo Napoli. O rival pelo título é o Botafogo, e o jogo da volta acontece neste domingo, às 16h, no estádio Nilton Santos, no Rio de Janeiro.

O placar de 2 a 1 na partida de ida – com dois gols de Malu – aumentou a invencibilidade do Napoli na competição para oito vitórias e quatro empates em 12 jogos. Para ficar com o título inédito, basta um empate. É uma campanha histórica de uma equipe que surgiu de uma necessidade coletiva e se mostrou promissora já no seu primeiro ano de vida.

Projeto

Como em uma família que projetou seus sonhos no filho mais velho, mas viu no mais novo tanto potencial quanto, a história do Napoli se mistura com a do Kindermann. Fundado em 1974, um ano antes do Kindermann, o Napoli se consolidou na cidade de Caçador disputando competições amadoras no futebol masculino.

Sem planos para incluir o feminino em seus projetos, o filho caçula acompanhava a ascensão do irmão mais velho no cenário nacional. Salézio Kindermann, homem forte do esporte local, colecionava títulos com o futsal masculino do Kindermann até decidir trabalhar somente com mulheres.

Créditos: Andrielli Zambonin/Kindermann

“Eu era goleiro no futsal, aí decidi com os meus amigos que jogavam comigo a montar a Sociedade Esportiva Kindermann, em 1975. Chega em 2004 eu digo ‘chega, não quero mais saber de futebol’, e me vem um maluco lá do Espírito Santo com um time inteiro de futsal feminino, incluindo Gabi Zanotti (hoje atleta do Corinthians). Eu me apaixonei por aquelas meninas. Ganhamos tudo com elas. Em 2008 eu pego esse time e levo para o campo. Na primeira Copa do Brasil ficamos em 3º lugar. Aí de lá para cá são 11 conquistas de estadual, dois vices de Brasileiro (2014 e 2020) e o título da Copa do Brasil de 2015”, conta Salézio.

No percurso, uma tragédia fez o senhor Salézio novamente desistir de trabalhar com o futebol. Foram dois anos de terapia intensa para superar o pesadelo do dia 11 de dezembro de 2015, quando o homem forte do Kindermann viu um ex-funcionário seu fazer refém com uma arma suas duas filhas, sobrinhos e assassinar o treinador do seu time. E aí que entra o Napoli trazendo toda aquela esperança que um novo filho traz a uma família. “Foi a pior fase da minha vida, eu ia perder minhas duas filhas. Para mim, nada mais fazia sentido. Minha família não queria mais que eu trabalhasse com futebol, mas eles me viam cabisbaixo, sem ânimo para nada e em 2017 eu decidi voltar”, diz o presidente.

Desenvolvimento

Enquanto o Kindermann retomava suas atividades em 2017, a diretoria do clube foi informada pela CBF que o Campeonato Catarinense daquele ano precisaria de mais uma equipe para poder acontecer – o regulamento exigia quatro times, e havia apenas Kindermann, Criciúma e Chapecoense – e que o vencedor teria vaga garantida na A2 do Brasileiro. Com um elenco recheado de 38 atletas, a solução foi dividir o grupo e criar o time feminino do Napoli.

Créditos: Andrielli Zambonin/Napoli

“Estávamos no meio do Campeonato Brasileiro e veio esse comunicado da CBF. Fomos falar com o Rodrigo Schmitz (presidente do Napoli) se poderíamos usar o Napoli para jogar futebol feminino. Teríamos um CNPJ e um estatuto diferente porque não poderíamos colocar uma segunda equipe do Kindermann. Então fomos para a competição com duas equipes de Caçador”, explica Jonas Estevão, responsável pelo time feminino do Napoli, mas também diretor de futebol do Kindermann e velho conhecido de Salézio.

Já na sua primeira participação em uma competição feminina, o Napoli conquistou o vice-campeonato estadual em uma final com o próprio Kindermann e herdou a vaga para a Série A2 do Campeonato Brasileiro Feminino, já que o “rival” tinha presença garantida na A1.

O intercâmbio entre atletas também envolvia membros da comissão técnica. Em 2017, Carine Bosetti estava como preparadora física do Kindermann, clube que defendeu entre 2013 e 2015, e recebeu o convite para assumir o “irmão caçula” visando a disputa do Brasileiro A2. Começava ali o projeto profissional de uma garota que se decepcionou com o futebol enquanto jogadora (era zagueira e lateral) e assumiu uma aposentadoria com 22 anos.

Créditos: Reprodução/Instagram @anapolicacadorense

“Eu me frustrei com a realidade do futebol feminino, valorização. Fui para o Mundial Sub-17, tive vivência com a seleção e voltei do Mundial já sabendo que eu precisava estudar e usaria o esporte com a bolsa de estudos. Eu não era uma estrela, mas era uma boa jogadora, comprometida, inteligente, cuidava do meu próprio treino e alimentação. Sempre fui de analisar as situações de jogo, tentar entender o que estava acontecendo. Parei no meu auge e me interessei pela área técnica. Era uma forma de devolver para o futebol, para o futsal o que eu tinha recebido e que fez toda a diferença na minha vida”, aponta Carine.

A equipe não foi bem na sua estreia em competições nacionais e caiu ainda na fase de grupos da A2 de 2018. Carine, então, deixou o comando técnico do clube para seguir seu trabalho concursado no município em projetos esportivos, como escolinhas de futebol, mas voltou a ser treinadora do time em 2019, em mais um vice-campeonato estadual.

“Na minha primeira passagem era uma estrutura totalmente diferente, sem projeção. Já na segunda, eu tive um mês de trabalho com as meninas e conseguimos o acesso para 2020. Em 2020 aí sim eu falo que foi um trabalho mais efetivo, direcionado. Um grupo novo, um ano atípico, mas que mesmo assim trabalhamos muito”, diz a técnica de 30 anos.

Acesso

Quatro anos depois de sua fundação, o Napoli vive o seu auge. O acesso à elite chega com uma campanha invicta, 29 gols a favor e nove sofridos e a vantagem de empatar no jogo da volta na grande decisão – caso perca por um gol de diferença, a disputa vai para os pênaltis.

“O Napoli é um grupo jovem, uma equipe unida, onde as atletas olham na mesma direção, têm o mesmo objetivo. Isso está muito claro! Elas acreditam muito no trabalho e se entregam em campo. Em relação a parte tática é uma equipe que joga com intensidade, aposta muito na marcação intensa, na recuperação da bola após perda, mas principalmente é uma equipe veloz que consegue verticalizar o jogo e buscar o gol o tempo inteiro”, explica a técnica Carine.

E lembra da família que mencionamos no início? Para Salézio, é realmente esse o segredo do sucesso do seu filho mais novo. “Você precisa ver a união dessas meninas. Quando elas fazem gol elas vão tudo abraçar a treinadora. Chega me arrepiar. Eram meninas que ninguém conhecia, que não apareciam e eu falei que elas tinham que jogar, porque jogadora só é jogadora se jogar. A hora que você é titular você vai se aperfeiçoando. Elas estão juntas há praticamente 4 anos porque algumas jogavam no Kindermann. Elas têm propostas maiores para sair do clube, mas querem ficar com a gente”, diz o mandatário.

“Temos sempre que tratar as atletas como seres humanos que estão buscando sonhos. Por meio do clube, elas vão sentir que a gente está ali por elas, que queremos o melhor, vê-las crescer. Conseguimos colocar isso na cabeça delas. Há uma energia muito boa entre comissão e atletas, procuramos sempre trabalhar com a verdade e do fundo do coração transmitir para elas que queremos que elas evoluam, apareçam. Minha experiência como atleta contou muito, de saber lidar, de saber que ninguém é perfeito. Procuramos entregar nosso melhor, trabalhar questões positivas de jogo deixando as atletas querendo mais e acreditado no trabalho”, concluí Carine.

Futuro

A elite já é uma realidade tanto para o irmão mais velho quanto para o mais novo. Por isso, o ano de 2021 vai ser ainda mais desafiador para quem gere essa família. Os dois times se revezam na estrutura de cinco locais de treinamento na cidade.

“Eu sempre penso no melhor. Eu não gosto de perder, não faço nada por fazer. Faço para brigar, para subir. O trabalho é sério, é profissional. Temos duas Libertadores com o Kindermann neste ano, estamos investindo pesado por lá. Já com o Napoli o primeiro objetivo é se manter na Série A. Isso acontecendo, vamos seguindo”, aponta Salézio.

“É um grande orgulho para Caçador. Confesso que eu não esperava, mas que eu sabia que esse grupo tinha capacidade para isso, que íamos trabalhar para isso. É momento de aproveitar e ficar orgulhoso por tudo o que já construímos e podemos construir pela frente”, afirma Camila, que projeta para seu futuro a mesma ascensão que seu time vem tendo.

“Eu quero ser reconhecida por ser uma grande técnica. Existe sim um olhar diferente que vem de fora por eu ser mulher, mas eu não quero ser vista pela questão de gênero. O gênero não define sua competência. Quero ser melhor a cada dia como pessoa, como técnica e como gestora”, conclui.

Foto: Andrielli Zambonin/Napoli

E se a ideia é permanecer na elite do campeonato, o Napoli pode seguir mais um passo do “irmão mais velho”: “O Napoli e o Kindermann caminham de mãos dadas. A gestão é a mesma, o que difere é elenco e comissão técnica. E assim vai permanecer. Se vier uma parceria, como é a do Avaí/Kindermann, será bem-vinda. O custo dessas competições é altíssimo. Havendo oportunidade, sendo bom para o clube e autorizado pela CBF, não negamos de ter parceria”, relata Jonas Estevão.

Por enquanto, parceria mesmo só entre os irmãos dessa família construída por Salézio Kindermann. O ano perfeito para um pai coruja. “Sabemos que será difícil (se manter na A1), mas a gente tem uma coisa que eles (outros times) não têm: união, amizade e alegria de jogar futebol. Somos uma família”, finaliza o presidente.

*Reportagem de Mariana Pereira

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O caminho de Edina até o Mundial da Fifa: ‘É uma conquista de todas’ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/20/o-caminho-de-edina-ate-o-mundial-da-fifa-e-uma-conquista-de-todas/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/20/o-caminho-de-edina-ate-o-mundial-da-fifa-e-uma-conquista-de-todas/#respond Wed, 20 Jan 2021 07:00:04 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=10967

Foto: CBF

O Mundial de Clubes de 2020 no Catar, que acontece em fevereiro, será mais um episódio inédito na vida de Edina Alves Batista. Aprovada nos testes físicos da FIFA ao lado da sua assistente, Neuza Back, a brasileira é a primeira árbitra mulher selecionada para comandar um jogo profissional masculino organizado pela entidade máxima do futebol mundial.

Fazendo história numa profissão majoritariamente masculina, a paranaense de Goioerê faz parte do quadro da FIFA desde 2016, e “quebrar barreiras” é uma das suas especialidades. “Eu fui por 10 anos presidente da Liga de Futebol de Goioerê, a primeira liga de futebol amador que deu premiação em dinheiro aos participantes. Chegamos a dar 35 mil reais ao campeão. Você vê… uma mulher presidindo a Liga”, conta a árbitra.

E a ligação de Edina com o esporte não parou, nem começou aí. É uma relação de anos, de uma vida inteira. “Eu jogava futsal, basquete, qualquer modalidade. Futebol de campo era mais difícil porque naquela época não tinham meninas suficientes para montar time, mas fazíamos mistos sim. Meu irmão sempre jogou futebol, minha irmã mais velha vôlei”, diz a paranaense.

Foi durante as práticas esportivas que surgiu a arbitragem na vida de Edina. “Eu não tinha noção nenhuma sobre arbitragem, não conhecia ninguém. Na verdade, tinha aquela noção de quando a gente joga, tinha o envolvimento de montar equipe, de ser até “chata” em questão de querer tudo a favor da minha equipe”, explica a profissional. “Você acha que conhece a regra, né”, brinca.

A estrada até o sonho e quem caminhou lado a lado

Terceira de quatro filhos, o caminho até o Mundial de Clubes da FIFA foi árduo e cheio de altos e baixos, talvez por isso a preocupação da família quando Edina optou pela arbitragem. “No começo a minha família não entendia muito. Lá em 1999, quando comecei, não era tão comum. Eles nunca foram contra, mas não gostavam muito. Aí depois viram que eu realmente queria isso e não colocaram nenhum empecilho no meio. Me apoiam e torcem por mim toda vez que tem jogo”, diz a árbitra.

“Realmente querer” é pouco quando se fala em sonho. Edina precisou abrir mão de muita coisa para conseguir o dela. “Na época que me formei, em 2001, podia bandeirar e arbitrar, mas eu sempre quis ser árbitra. Lá no Paraná eu apitava a base e o feminino e bandeirava no profissional do masculino. Quando cheguei na CBF em 2007, precisei optar e acabei indo para assistente”, conta a paranaense.

E é nesse ponto da vida de Edina que entra uma pessoa muito especial, e as duas começam a traçar juntas seus sonhos e objetivos. “Conheço a Neuza Back faz 11 anos, conheci lá em Caçador, jogo do Kindermann. Ela toda quietinha, nem conversamos direito, só coisas do jogo mesmo. Depois fomos para a CBF, começamos a conversar, trocar ideias de lances, viramos amigas. Em 2014 numa conversa com ela e o Sérgio Corrêa (presidente da Comissão Nacional de Arbitragem da CBF na época), Neuza contou a ele que eu queria ser árbitra, e ele me disse que eu teria que começar tudo de novo. Eu já estava na Série A do Brasileirão bandeirando, não pensei em nada, era o que eu mais queria”, explica Edina.

Foto: Arquivo Pessoal

“Eu só precisava convencer o diretor de arbitragem do Paraná a mandar os documentos para a CBF informando da minha mudança. Foi difícil, eu ligava para ele e ele não queria falar comigo, ele sempre quis que eu ficasse como assistente, então peguei o carro e dirigi 560 km para chegar lá na Federação Paranaense para assinar tudo”, completa.

Determinada e focada no seu objetivo de se tornar árbitra, Edina não se importou com o recomeço no auge dos seus 34 anos. “Já estava trabalhando na elite do futebol brasileiro, era aspirante FIFA e aí foi aquela coisa de trocar o certo pelo duvidoso. Mas para mim não importava. O que importa é fazer o que gosta, é a realização de um sonho, todo mundo tem um sonho e se você está pertinho dele, não importa se você vai cair, o importante é que você está próximo dele e vai lutar para subir”, aponta a árbitra.

A realização e o êxito de uma parceria

Após passar por todas as divisões, agora como árbitra (ela começou nesta função em 2014), Edina recebe sua primeira oportunidade na Série A do Brasileirão em 2019 e se torna a primeira mulher a apitar um jogo como esse em 14 anos (a última foi Silvia Regina, em 2006). “Eu acho que para tudo existe uma preparação. Tudo é no tempo de Deus e você tem que estar preparada para isso. Tem que viver tudo, não pode pular as etapas. Eu estava há 2 anos e meio na Série B, estava bem, fiz quatro jogos muito bons. Aí no dia 27 de maio de 2019 fui escalada para fazer CSA e Goiás”, conta a profissional.

Foto: Reprodução/Instagram @ neuzaback

O ano de 2019 proporcionaria para Edina o auge da sua carreira até então: apitar Inglaterra e Estados Unidos pela semifinal da Copa do Mundo Feminina na França. E quem estava novamente ao seu lado? “A Neuza (Back) estava comigo no primeiro jogo em que bandeirei na Séria A do Brasileirão, em 2013. Depois em 2019 de novo ela estava comigo num evento importante para mim, como minha assistente, e mais uma vez juntas, dessa vez na França. Agora é o Catar”, diz Edina, que vê na companheira um dos seus principais pilares na profissão.

“A gente divide apê em São Paulo, temos os mesmos sonhos, os mesmos objetivos. Ela é disciplinada, focada, minha companhia para treinamentos, na alimentação. Durante a pandemia, por exemplo, treinamos dentro do apê e foi muito difícil, longe da família, buscando motivação para nos manter focadas, preparadas fisicamente e torcendo para que isso passasse logo, para o mundo não sofrer tanto”, completa. Ela também destaca a ajuda que a CBF deu pagando uma taxa de arbitragem mensal para os árbitros durante o período de paralisação dos jogos.

Profissão dominada pelos homens

Ciente de que faz história, Edina espera ver outras mulheres conquistando o mesmo espaço. “Eu quero é que cada vez tenha mais mulheres, em todas as profissões. A gente ainda é minoria e temos capacidade de buscar. A arbitragem, por exemplo, evoluiu. Hoje somos tratados não mais por homem ou mulher, somos árbitros, vemos isso em várias federações, na CBF, na Conmebol, na FIFA. Se você faz bem feito e com qualidade, você ganha uma oportunidade”, diz a árbitra.

Árbitra paranaense, Edina Alves Batista, realiza teste físico ao lado dos homens para conseguir apitar a Copa do Mundo Feminina em 2019 (Foto: Acervo pessoal)

Entretanto, a paranaense sabe que a caminhada é difícil. “Tem que ter resiliência porque você vai passar por muitas coisas. Depois, tem que amar o que faz, senão você não vai ficar. O homem tem aquele selo de qualidade, a mulher não, você tem que ir lá dentro e mostrar que conhece mesmo e não pode errar. É a vida, nada é fácil. Homem ganha bola quando nasce, mulher a boneca, por exemplo. (Muita gente) Tem o pensamento pequeno, acham que é um mundo para não estarmos incluídas”, aponta.

Quando o assunto é dentro do campo, Edina destaca a firmeza para lidar com jogadores e prega pelo respeito. “Eu sempre tratei as pessoas com respeito, nunca faltei com educação com ninguém, também não gosto que faltem comigo. Às vezes as pessoas acham que acontece alguma coisa dentro de campo e é só pedir desculpas depois, mas educação tem que ser em qualquer lugar. Se você se comporta daquela maneira dentro de campo, você se comporta na sua vida, na sua casa”, destaca Edina.

“Dentro do campo de jogo eles me respeitam porque eu aperto. Vai lá e erra para ver se eles ligam se é homem ou mulher. A maior dificuldade é a pessoa não entender que o árbitro é um ser humano comum e sujeito a erro, quantos gols um jogador não perde na frente do gol, sem goleiro e tudo? Aí o árbitro comete um erro, tem que ser chamado por isso, crucificado por esse erro. Sou um ser humano comum, passível a erro, busco dentro de campo sempre melhorar”, completa.

Para Edina, a arbitragem precisa urgentemente dar um passo maior. “Tem que ter a profissionalização, é o ideal. Todo mundo ali do meio é profissional, menos o árbitro e ainda exigem que ele seja perfeito. O árbitro às vezes tem duas profissões, ele que tem que tirar do tempo dele, da família dele para treinar, se dedicar, estudar. O jogador não. Para você se dedicar realmente você precisa estar ali focada, e precisar de outro emprego fica difícil”, diz a árbitra, que abdicou de uma empresa de eventos esportivos para se dedicar ao seu sonho.

Mundial de Clubes da FIFA

Em uma volta despretensiosa de mais um treino, Neuza Back, no volante e com Edina no banco do passageiro, recebe uma ligação. “Era o Gaciba (Leonardo Gaciba, Presidente da Comissão de Arbitragem da CBF) dizendo que íamos para o Mundial. Na hora eu pensei que era algo do feminino, depois que caiu a ficha. A emoção tomou conta, passou um filme na cabeça, descemos do carro, a Neuza me abraçou, vibramos muito. Era um objetivo que tínhamos de trabalhar numa competição masculina”, conta a árbitra.

Foto: Lucas Figueiredo/CBF

Aos 40 anos, Edina Alves embarca com Neuza Back rumo ao Catar no fim de janeiro. Junta-se a elas Mariana Almeida, assistente argentina. Além do trio feminino, outros sete – todos masculinos – também estarão no Mundial de Clubes de 2020.

“Não é só minha e da Neuza essa conquista. É uma conquista de todas nós. Vai ficar na história. Pela primeira vez a FIFA coloca mulheres em competição de masculino e vai estar lá o Brasil”, finaliza Edina Alves Batista.

*Reportagem por Mariana Pereira

]]> 0 Técnico do Corinthians: ‘Futebol feminino me permitiu completar trabalhos’ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/15/tecnico-do-corinthians-futebol-feminino-me-permitiu-completar-trabalhos/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/15/tecnico-do-corinthians-futebol-feminino-me-permitiu-completar-trabalhos/#respond Fri, 15 Jan 2021 07:00:42 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=10937

Bruno Teixeira / Ag. Corinthians

O ano é 2021, mas a verdade é que desde março de 2020 parece que vivemos dias e meses intermináveis, de uma mesma saga em busca da sobrevivência. A pandemia da COVID-19 abalou estruturas, mexeu com o psicológico e exigiu do ser humano ferramentas de reinvenção, tanto práticas como de cunho emocional.

Foi preciso fazer do limão uma limonada, e um ótimo exemplo disso é o Corinthians Feminino. Nas mãos de Arthur Elias pela quinta temporada seguida, a equipe do Parque São Jorge foi campeã do Brasileiro Feminino e do Paulista da modalidade, únicas competições que o clube participou em um ano tão atípico (a Libertadores foi adiada).

Tanta coisa ruim acontecendo, ter esses momentos de alegria com o clube, de títulos, vitórias, apresentando uma evolução, a emoção é diferente pela dificuldade que o mundo está passando e com o futebol feminino não foi diferente”, disse o treinador em um bate-papo de pouco mais de uma horadois dias após a virada de ano – sobre Corinthians, renovação, carreira, pandemia e outras coisas, incluindo Seleção Brasileira.

Início 

Quem vê Arthur Elias na beira do campo sabe que o treinador é pura energia. Quinto filho de um total de seis (cinco homens e uma mulher), o comandante carrega consigo princípios herdados da família. “Sempre vivi minha vida com intensidade”.

Ter este suporte em casa foi fundamental quando o treinador decidiu pelo futebol. “Eles sempre me apoiaram, desde que joguei nas categorias de base, e o que eu aprendi com eles é que a partir do momento que a gente escolhe o que quer e gosta, fazer com intensidade, entrega e disciplina é importanteLiderar pessoas sempre fez parte da minha vida, desde pequeno, adolescente, é uma característica que carrego”, completou.

Arthur se relaciona com o futebol desde moleque, quando jogou em categorias de base e ainda carregava o sonho de ser um atleta. Parei já pensando em ser treinador”, completou.

Foto: Gabi Montesano

Aos 20 anos, o primeiro “grande desafio”, aos 25, o futebol feminino. “Eu tinha feito categorias de base masculina e isso foi importante para treinar a USP. Eu só aceitei o trabalho podendo fazer um projeto interdisciplinar. Sabia que ali era só um laboratório, eu queria conhecer mais a realidade”, disse Arthur.

“No mesmo ano eu já estava enfrentando o Santos, o Saad numa final. Muito rapidamente eu já conhecia as principais equipes da modalidade, o que me fez olhar como plano de carreira, onde poderia me destacar dentro de um cenário carente, desafiador. O interesse era evoluir como profissional, então precisei trabalhar muito para realizar a montagem de um time, toda estrutura necessária”, completou.

‘As coisas não vieram de graça, foram conquistadas’

Uma das coisas que Arthur Elias gosta de destacar sobre sua carreira é a importância de se cercar de bons profissionais. Depois da experiência com equipes universitárias, é no Centro Olímpico, ao lado desses bons profissionais, que o treinador chega pela primeira vez à glória máxima da modalidade nacional.

“O futebol feminino me trouxe essa possibilidade de terminar todos os anos, de completar meus trabalhos e nunca ser demitido, além de conseguir sempre ter pessoas extremamente competentes junto, mesmo sem ganhar dinheiro no começo. Quando vem o Centro Olímpico em 2010 e 2011 eu troco a minha comissão inteira e chego com aquele olhar de que dali você pode tirar mais, ter uma melhor estrutura, condições de realização, explicou o técnico.

O projeto no Centro Olímpico rendeu ao comandante seu primeiro Brasileirão Feminino, em 2013. De lá para cá o Corinthians entra na sua vida e soma à conquista mais dois Campeonatos Brasileiros (2018 e 2020), uma Copa do Brasil (2016), duas Libertadores (2017 e 2019) e o bi Paulista (2019 e 2020). Além disso, os expressivos números de sua comissão técnica que em 2021 vão para seu oitavo ano de trabalho: 204 jogos, 159 vitórias, 30 empates, 15 derrotas, 605 gols marcados e 121 gols sofridos.

“As coisas não foram entregues de graça, inclusive no Corinthians. Você precisa saber o momento de trazer as pessoas certas, alternativas para aquele lugar. É fácil pedir, difícil é criar alternativas”, falou Arthur.

‘Nossas atletas competem para serem cada vez melhores entre elas’

Corinthians virou o time a ser batido por todos os títulos que conquistou, e o Brasileiro chegou em 2020 com mais competitividade pelos times de camisa que tinham subido da segunda divisão: São Paulo, Palmeiras, Grêmio e Cruzeiro. O clube sabia dos desafios que teria, e correu atrás para “surpreender”.

 

“Nós não nos reinventamos. Evoluímos e trouxemos elementos novos que foram deixando aquilo que a gente já tinha de estrutura de jogo, ideia de jogo, mais complexo, imprevisível para esses adversárioe desafiador para as meninas, que toparam. É importante enxergar coisas novas, que você é capaz de fazer diferente, fazer mais, de responder a situações que na verdade estamos competindo com a gente mesmo para seguir vencendo”, contou Arthur, que completou explicando o que de fato mudou no Corinthians de 2020.

“A gente trouxe coisas diferentes, como a goleira participando ativamente do jogo. Fez com que eu colocasse uma jogadora a mais entre as linhas do adversário para chegarmos com volume maior, chegar ao gol criando chances. Mudamos esquema tático aprimorando ideias, conceitos, o sistema, a distribuição delas em campo foi algo novo. Ter uma linha de quatro segura, potencializaro meio de campo e o ataque respeitando melhor a característica do elenco, com duas centrais e duas meias abertas”, disse o técnico.

O resultado dentro de campo, que culminou com Brasileiro e Paulista de 2020, tem muito do que é feito nos bastidores de um clube que investe na modalidade. “Reflete para uma evolução de todos os profissionais. Quanto mais tenho uma equipe multidisciplinar, mais as atletas precisam aproveitar isso. O feminino sempre foi muito sofrido, nos últimos anos elas têm respondido de forma fantástica e aproveitando essas condições que são melhores, mas eu entendo que tem que ainda ser bem melhor”, afirmou Arthur.

“Nós podemos crescer muito mais ainda. Busco isso hoje dentro do Corinthians, dentro da modalidade, sei o quanto isso é importante para um esporte que tem sido cada vez mais competitivo. É uma questão de escolha, o investimento em estrutura, em profissionais, para mim é muito bom”, completou.

Melhor jogo

Em 20 de dezembro de 2020 o Corinthians fez, na visão de Arthur Elias, sua melhor exibição em quatro anos de projeto, e foi justamente numa final de campeonato. Após vencer, de virada, a ida por 3 a 1, o Timão goleou a Ferroviária, em Araraquara, por 5 a 0 e conquistou o bi do Paulistão Feminino.

 

O desempenho da equipe, principalmente no primeiro tempo, surpreendeu até o próprio treinador. “Foi um jogo marcante 4 a 0 no primeiro tempo, um domínio completo”, declarou o comandante, que continuou:

“Vínhamos de nove mata-matas seguidos em um mês. Tinha o estresse físico, mental e encontramos aquele equilíbro que eu sempre falo de você conseguir treinar e jogar, por isso rodamos tanto o elenco, para que elas treinem com qualidade. O time exerceu muito bem nosso trabalho, ideias, encaixou muito bem a marcação pressão com bloco médio, muito consistente na linha de baixo defensiva para ganhar as bolas e seguir na construção. Agredimos muito o gol, com muita dinâmica do meio. O meu meio fez o melhor jogo porque a gente tinha a Andressa como primeira volante, a Diany e a Zanotti como meias, tivemos uma rotação nesse triângulo muito grande o jogo todo. O time foi imprevisível, intenso, eficiente, tudo o que um treinador gosta”, finalizou.

O exemplo para o filho

Apelidado de “Rei” pela torcida corintiana, Arthur batalha para deixar um bom legado não só à equipe feminina, mas também a seu filho Aluísio, de 3 anos. Rodeado de mulheres por conta do trabalho, o treinador entende a responsabilidade de criar um filho homem em um mundo cruelmente machista.

 

“Com certeza me ajuda (o trabalho). A questão da mulher, do ambiente que eu vivo, o que isso representa, a luta de vocês… com certeza ele já cresce com uma outra visão. Na visão dele o futebol é mais feminino do que masculino, ele entende que as mulheres é quem jogam, é natural para ele”, afirmou o comandante.

“A mãe do Aluísio é antropóloga, o tanto que ela contribui para ele, sempre contribuiu para mim para entender mais afundo. O que eu realmente fico triste, mas é algo difícil de fazer na prática, é que eu gostaria de estar mais com ele, participar mais, dividir, mas o futebol me exige muito e eu tenho tentado sim o meu máximo poder trazer a figura do pai nessa divisão de responsabilidades que muitas vezes os pais deixam as tarefas de casa para as mães, e isso não está certo, eu tento me esforçar muito para que ele entenda isso”, completou.

Carregando o nome do irmão mais velho do papai, falecido em um acidente de carro, o pequeno Aluísio volta e meia aparece nos treinos do Corinthians. “Ele é nota mil e tem falado assim: ‘As meninas do Corinthians estão com saudade de mim, papai?’. Ele joga bola com a vizinha da idade dele. Isso tudo vai ser mais natural, espero que ele possa ser uma pessoa melhor do que eu, todos os pais têm esse objetivo”, declarou Arthur.

Vão querer cada vez mais nos vencer

Uma das particularidades do futebol feminino é não trabalhar com contratos longos – nem para atletas, nem comissão técnica. Portanto, todo fim de temporada é preciso sentar e avaliar quem fica, quem sai e quem chega.

 

Para 2021, o Corinthians renovou com 22 jogadoras das 28 que estiveram na temporada passada, contratou as atacantes Bianca Gomes, Miriã e Jheniffer e encerrou vínculo com Lelê, Taty Amaro, Mimi, Maiara, Pâmela e Suellen.

“Está tudo dentro do que a gente gostaria de fazer. O que a gente quer é manter o Corinthians forte, vemos que dá para tirar mais dessas atletas, que a fome é grande. Vamos seguir construindo com essa mentalidade de desafiar, encarar. Vejo essa consciência e desejo nessas atletas. É um ano especial de duas Libertadores, vamos defender todos os títulos que temos e quem sabe ter a oportunidade de buscar um confronto com uma equipe europeia, algo que nunca teve, que não é comum”, afirmou o comandante.

O clube ainda deve anunciar a chegada de uma goleira. Aliás, a perda de Lelê foi bastante sentida pela torcida. A arqueira acertou com o Benfica de Portugal e deixa o clube do Parque São Jorge após completar 100 jogos e ganhar sete títulos. “É a melhor goleira da história do Corinthians, com certeza. Esse ano de 2020 foi muito importante e uma das evoluções foi o posicionamento da nossa goleira no jogo, mas faz parte do processo e precisamos respeitar. Confio muito na Paty e na Tainá (goleiras reservas)”, apontou Arthur.

Futuro e seleção brasileira

Conquista após conquista, as redes sociais esbravejam por Arthur Elias no comando de algum time masculino ou à frente da Seleção Brasileira Feminina. Sobre o primeiro, o treinador revela já ter recebido convites, mas acredita não ser o momento para tal mudança.

 

O que eu penso é um passo de cada vez, saber que aquele passo para mim vai significar um avanço, que terei condições melhores de trabalho, oportunidade de crescer profissional. Tenho sido muito coerente com o que eu decido”, afirmou Arthur.

Eu acho que eu tenho ainda a acrescentar para o futebol feminino. Sei aonde eu cheguei, a responsabilidade que tenho de conduzir uma equipe tão vitoriosa, com cada vez mais repercussão, essa merecida valorização. Estar no Corinthians me proporcionou um crescimento grande. Sou grato ao clube, aos profissionais que estão comigo. Um dia vou sair, vai acontecer naturalmente”, completou.

Tratando de Seleção Brasileira Feminina, o treinador prefere não se colocar mais sob essa pressão. “Eu sempre tive o sonho e confesso que teve alguns momentos que imaginei estar mais perto dessa oportunidade. Mas com a experiência vamos vendo que é uma decisão que depende muito menos de mim, então o que eu penso é que se acontecer um dia vai ser muito prazeroso, de muito orgulho, mas não trabalho hoje planejando e nem contando com essa oportunidade”, apontou Arthur.

O primeiro compromisso do Corinthians na temporada é a Libertadores da América 2020, adiada para acontecer entre os dias 5 e 21 de março, na Argentina.

*Reportagem de Mariana Pereira

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Mais da metade das federações não realizou estadual feminino de 2020 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/08/mais-da-metade-das-federacoes-nao-realizou-estadual-feminino-de-2020/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/08/mais-da-metade-das-federacoes-nao-realizou-estadual-feminino-de-2020/#respond Fri, 08 Jan 2021 07:00:54 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=10918

Mapa que detalha a situação dos estaduais femininos de 2020

As paralisações nas competições deram o tom do ano de 2020 no mundo dos esportes. No futebol feminino no Brasil, a situação se repetiu, mas com um agravante: até o final do ano, apenas 11 dos 26 estados realizaram o campeonato estadual para as mulheres. A falta de estrutura, que já é um dos maiores problemas da modalidade, tornou-se ainda mais relevante em um contexto em que a testagem de atletas para a Covid-19 se tornou parte do protocolo de segurança, bem como a higienização constante dos centros de treinamento e estádios para que as partidas pudessem ser realizadas.

Pensando nas mudanças que os estados deveriam promover, no início de dezembro a CBF emitiu um ofício determinando que os campeonatos estaduais de 2020 fossem realizados até 28 de março de 2021, de modo que as federações tivessem tempo para reorganizar seus calendários e suas competições. A entidade precisa da realização dos torneios para definir os participantes da Série A2 do Brasileiro feminino de 2021 – a segunda divisão nacional tem 27 vagas para os campeões estaduais.

No entanto, na primeira semana de janeiro, ainda não há informações sobre boa parte dos estaduais que não aconteceram.

Norte: pouco mais da metade da região fez o dever de casa

Na região Norte, quatro dos sete estados realizaram o torneio. Amapá, Amazonas, Rondônia, Pará organizaram campeonatos, com um número menor de times – o Rondoniense, por exemplo, foi disputado por apenas três equipes – e com duração também reduzida.

Amazonense feminino começou, mas ainda não terminou (Foto: FAF)

Em modelos com grupos únicos, dois campeonatos tiveram transmissão ao vivo: a Federação Amapaense de Futebol disponibilizou os jogos para assistir online através da plataforma MyCujoo, e em Rondônia os torcedores puderam acompanhar os jogos no Youtube da FFER.O Amazonense estava para terminar, mas teve a final suspensa até que o STJD julgue o caso de uma possível escalação irregular de jogadora por um dos clubes que disputaria a decisão.

Já os estados que ficaram devendo o campeonato nesse ano foram Acre, Roraima e Tocantins. Segundo a Federação Roraimense de Futebol, “existem programações para que aconteça uma seletiva em Janeiro para se conhecer o representante do estado em competições nacionais”. Não foi especificado se essa seletiva funcionaria como o estadual. As federações do Acre e de Tocantins não responderam às tentativas de contato.

Nordeste: situação alarmante

No Nordeste, a situação também foi longe do ideal: apenas duas federações sediaram o torneio em 2020. O destaque foi a Paraíba, que em dezembro viu o Botafogo-PB levantar a taça com direito a transmissão na TV local.

Botafogo-PB foi campeão estadual em 2020 (Foto: Divulgação)

Em Sergipe, o cenário foi diferente: a competição foi disputada antes da pandemia e terminou em fevereiro.

Três estados realizarão o torneio neste ano: Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco, que chegou a iniciar a competição em novembro. No entanto, a disputa foi interrompida e adiada para este mês após a confirmação de 10 casos de Covid-19 incluindo atletas e comissão técnica do Sport.

No Ceará, era para o estadual começar agora, mas houve desistência de uma das quatro equipes que participariam. Agora, só Ceará, Fortaleza e São Gonçalo estão confirmados, e a Federação Cearense precisa definir uma nova data para a disputa.

Já a Federação Alagoana de Futebol realizou um campeonato de futebol feminino, mas não o Campeonato Estadual. Quem levou a Copa da Rainha Marta foi a União Desportiva do Alagoas, e ainda é incerto se o clube continuará sendo o representante do estado no Brasileirão A-2.

As federações do Piauí, Bahia e Maranhão não possuem informações sobre a realização da edição de 2020. Em entrevista ao site ne45, o presidente da Federação Baiana de Futebol, Ricardo Lima, afirmou que “se tratando do futebol feminino provavelmente não aconteça sua edição em 2020”.

Em 2019, o Bahia foi campeão estadual; sobre a competição de 2020, a Federação diz que não deve realizar para as mulheres (Foto: Divulgação)

No Centro Oeste, só o Distrito Federal salva

A pior região para o futebol feminino em 2020, no entanto, é o Centro-Oeste: Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul não tem informações sobre os campeonatos estaduais e não responderam aos e-mails para esclarecer dúvidas sobre os torneios. A boa notícia foi que o Distrito Federal realizou o Candangão Feminino com seis times em um campeonato que durou de outubro a dezembro e teve o Real Brasília como campeão. A final foi transmitida para a TV local e também foi disponibilizada pela internet através do Facebook da Federação de Futebol do Distrito Federal.

Real Brasília foi o campeão em 2020 (Foto; Divulgação)

No Sudeste, Espírito Santo não segue exemplo do seus vizinhos

Pelo segundo ano seguido, a final do Paulistão foi um grande evento no calendário esportivo do estado, e contou com transmissão para a TV aberta e a TV fechada, um marco para o esporte. A novidade positiva na região foi que em Minas Gerais a final aconteceu no Mineirão e também foi televisionada, além de estar disponível também na internet.

Foto: Agência Galo

No Rio de Janeiro, o torneio de 2020 está marcado para acontecer de janeiro a março, em um formato com 12 times na disputa. Para a temporada 2021, os planos são ainda maiores.

Segundo o diretor de competições da FERJ, Marcelo Vianna, “o Carioca de 2021 terá maior número de participantes e tem previsão inicial para o mês de outubro. Vale ressaltar que, com responsabilidade e acompanhamento da pandemia, está no radar da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro a realização do Feminino sub 17, a princípio, no mês de maio”.

Já no lado negativo, a Federação de Futebol do Estado do Espírito Santo (FES) não se pronunciou sobre o Capixabão. A previsão era que o torneio acontecesse de agosto a novembro, mas nem foi iniciado. Durante o ano, no entando, a federação organizou o Capixabão Masculino das Séries A e B, além de já decidir o calendário para a modalidade dos homens para 2021.

Sul: SC e PR sem previsão

Para terminar, a região Sul do Brasil teve bons e maus exemplos. No Rio Grande do Sul, Internacional e Grêmio disputaram a final em dezembro com direito a transmissão para a TV local e também pela internet. Em Santa Catarina, o torneio começou a ser realizado em março, foi paralisado por conta da pandemia, mas até agora não retornou. Já no Paraná, a Federação informou que não há condições de realizar o campeonato segundo as recomendações do Ministério da Saúde.

Foto: Mariana Capra/Divulgação Inter

O que diz a CBF

De acordo com a CBF, não há previsão de punição para os estados que não realizarem os campeonatos, já que se trata de um novo cenário. O problema, além da falta de continuidade no trabalho de desenvolvimento das atletas e da modalidade no Brasil, é que 27 dos 36 times que disputam a série A2 do Brasileirão são os vencedores dos campeonatos estaduais.

Com o início da disputa marcado para começar em maio, ainda há incerteza em relação aos representantes estaduais. Faltando apenas quatro meses para o início da competição, ainda não há previsão para que 11 federações realizem seus campeonatos e consigam enviar um representante para a segunda mais importante competição nacional. A CBF afirmou que a entidade está “aguardando a posição das federações” para “entender por que elas não pretendem fazer (os estaduais) e começar a levar sugestões para viabilizar”.

Enquanto essa situação não se resolve, listamos aqui os campeões estaudais de 2020 que já foram definidos. São eles: Oratório (AP), Esmac (PA), Real Ariquemes (RO), Botafogo-PB, Santos Dumont (SE), Atlético-MG, Corinthians (SP) e Internacional (RS).

*Reportagem: Laís Malek 

 

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Após recordes de audiência em 2020, futebol feminino vira aposta para TVs http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/04/apos-recordes-de-audiencia-em-2020-futebol-feminino-vira-aposta-para-tvs/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2021/01/04/apos-recordes-de-audiencia-em-2020-futebol-feminino-vira-aposta-para-tvs/#respond Mon, 04 Jan 2021 23:19:32 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=10900

Foto: Rodrigo Coca / Agência Corinthians

Primeiro, a expectativa era de que 2020 fosse um ano de crescimento exponencial para o futebol feminino. Depois de um 2019 histórico, registrando recordes de audiência com a transmissão da Copa do Mundo feminina na Globo, e com uma Olimpíada em vista, a previsão era a mais otimista possível por um grande crescimento da visibilidade para as mulheres em campo.

Mas aí veio a pandemia de coronavírus que parou o mundo e as perspectivas ficaram bem mais baixas. Realizar um campeonato, diante dessas circunstâncias, já seria uma vitória. Mas não é que o ano terminou com novos recordes a serem comemorados? Com o Brasileiro feminino, a Band registrou números de audiência impressionantes para o horário “nobre” do domingo (entre 20h e 22h). Os picos foram de 5 pontos, segundo o colunista de TV do Uol Esporte, Gabriel Vaquer, uma audiência somente registrada anteriormente nesse horário pelo Pânico na TV.

Com os jogos sendo mostrados também nas redes sociais, o Twitter teve um público acompanhando o Brasileiro feminino de 2020 três vezes maior do que no ano anterior. Mais de 5 milhões de pessoas assistiram aos jogos em 2020, contra 1,5 milhão em 2019. O engajamento nas conversas sobre o campeonato também aumentou 40%.

Foto: Bruno Cantini / Agência Galo

Nos estaduais, foi a vez do Facebook mostrar o potencial da modalidade transmitindo todos os jogos do Paulista feminino com uma picos de dezenas de milhares de pessoas simultaneamente assistindo. Na reta final, as TVs entraram em cena, com a Cultura e o SporTV, que também obtiveram bons números nas finais.

O Gaúcho feminino teve o Gre-Nal decisivo transmitido pela RBS TV pela primeira vez, e a audiência triplicou o que geralmente registrava para o horário. Em Minas, a final entre Atlético-MG e Cruzeiro foi exibida em TV aberta e repercutiu bastante com as mulheres disputando um título pela primeira vez no Mineirão reformado.

Foto: Mariana Capra/Divulgação Inter

Além das competições nacionais, houve transmissão até mesmo do futebol feminino internacional. A ESPN exibiu as semifinais e final da Champions League das mulheres e viu os jogos virarem um dos assuntos mais comentados do Twitter. Na final do Brasileiro feminino, a repercussão foi equivalente, quando o canal ganhou os direitos de TV fechada e transmitiu os dois jogos entre Corinthians e Avaí Kindermann.

Mesmo sem os Jogos Olímpicos de Tóquio, o futebol feminino conseguiu mostrar seu potencial em 2020. Se antes, o que se via era um “boom” de muita gente interessada em acompanhar jogos durante grandes eventos, e o tema cair em esquecimento depois dele, desta vez foi diferente. Claro que o engajamento não é comparável ao de uma Copa do Mundo transmitida pela Globo (como a de 2019), mas a repercussão dela gerou mais interesse das mídias em darem visibilidade ao futebol das mulheres e, com mais jogos exibidos, mais gente passou a se interessar em acompanhá-los.

O resultado foi tão expressivo, que a modalidade virou aposta para muitos canais em 2021. Os direitos de transmissão do principal campeonato (o Brasileiro feminino) são da Band até 2022, mas segundo informações adiantadas por Gabriel Vaquer no UOL, a Globo está na briga para exibir jogos das mulheres aos domingos pela manhã.

A Band, inclusive, investiu em transmissões exclusivamente femininas no ano passado contratando pela primeira vez uma narradora – Isabelly Morais – e pretende manter o investimento no futebol das mulheres.

Equipe 100% feminina na TV Bandeirantes: Alline Calandrini, Milene Domingues e Isabelly Morais (Foto: Reprodução/Instagram)

Já a ESPN, assim como faz no masculino investindo no futebol internacional, quer fazer o mesmo com o feminino. Após a boa repercussão dos jogos exibidos em 2020, a Disney já mapeia outras competições para apostar suas fichas nas mulheres. Atualmente, a emissora já tem os direitos da Champions feminina, da Copa da Rainha e Supercopa feminina da Espanha, e da FA CUP.

“Teremos uma série A1 ainda mais forte tecnicamente do que foi em 2020, e estamos com uma expectativa muito grande para a definição dos clubes classificados para a série A2, partindo das competições estaduais de 2020. Com o calendário cheio, as atletas e os clubes têm a possibilidade de manter as atividades por um período maior e, assim, o nível técnico das competições crescem, o interesse do público, dos patrocinadores e entramos em um ciclo virtuoso. Sendo assim 2021 tem tudo para ser mais um grande ano para o Futebol Feminino Brasileiro”, disse às dibradoras Aline Pellegrino, diretora de competições femininas da CBF.

Diante disso, o cenário de 2021 é novamente muito promissor para o futebol feminino. Com os Jogos de Tóquio programados para acontecer entre julho e agosto, a expectativa é que mais uma vez as partidas da seleção feminina registrem recordes de audiência – em 2016, dois jogos delas figuraram no top 10 das transmissões mais vistas dos Jogos do Rio. E o crescimento durante a Olimpíada deve respingar em mais visibilidade para os campeonatos locais.

Com mais espaço na mídia, o futebol feminino começa a atrair mais patrocinadores e investimentos. Não à toa, em 2020, o Campeonato Brasileiro ganhou dois patrocínios (Guaraná Antártica e Riachuelo). Caso a Globo entre na jogada para transmitir os jogos, o interesse das marcas deverá ser ainda maior.

É como sempre dissemos aqui. Não adianta dizer que “ninguém quer ver futebol feminino” se as pessoas nunca tiveram sequer a chance de querer, já que os jogos não eram exibidos. Com os campeonatos na TV, temos uma boa amostra de que há bastante gente interessada em assistir às mulheres em campo. E quem não gosta sempre terá a opção de mudar de canal.

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Craque na areia, Zanotti foi para o campo aos 21 e virou 10 do Corinthians http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2020/12/12/craque-na-areia-zanotti-foi-para-o-campo-aos-21-e-virou-10-do-corinthians/ http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/2020/12/12/craque-na-areia-zanotti-foi-para-o-campo-aos-21-e-virou-10-do-corinthians/#respond Sat, 12 Dec 2020 13:29:54 +0000 http://dibradoras.blogosfera.uol.com.br/?p=10888

Foto: Reprodução Instagram

*Por Mariana Pereira

O futebol se faz presente na vida de Gabriela Maria Zanotti Demoner desde sempre. O pai quase um atleta profissional, a mãe acompanhando a filha inclusive dentro de quadra, o avô o fã número um da sua carreira.

“Eu diria que os maiores incentivadores da minha carreira foram meus pais. Meu pai jogava, minha mãe sempre gostou muito, jogou comigo, foi mais presente pela disponibilidade. Meu avô, que hoje não está mais aqui, sempre foi um apaixonado pelo meu futebol, fazia questão de levar todas as matérias de jornal nos lugares que ia. Sempre esteve presente em viagens, fazia tudo para ajudar até o próprio time onde eu estava”, conta a atleta.

Mas, se engana quem ache que o futebol que Gabi Zanotti pratica hoje na carreira é o mesmo de anos da sua vida. Natural do Espírito Santo, foi com o beach soccer que a camisa 10 do Corinthians fez sua primeira viagem internacional para defender o Brasil. “Eu comecei no interior do Espírito Santo, depois fui morar em Vitória. Jogava beach soccer e viajei para disputar um torneio na Espanha representando a Seleção Brasileira”, explica a jogadora.

Leia mais: Formada em Administração, camisa 10 da Ferroviária quase deixou o futebol

A migração para o campo acontece apenas quando Zanotti vai para os Estados Unidos, em 2006. Antes disso, foi o futsal que tirou a atleta pela primeira vez do Espírito Santo. “Meu início mesmo de forma profissional posso dizer que foi no futsal, em Santa Catarina. Foi a primeira vez que eu saí do meu estado para jogar em algum clube, então grande parte da minha carreira foi no futsal. Aí quando eu fui para os EUA que fiz a transição para o campo pela Universidade. Fiquei por lá de 2006 a 2010”, afirma Gabi.

Ao voltar para o Brasil, a meio-campista chama a atenção do Santos durante um torneio em que defendia o Foz Cataratas, do Paraná. Na mesma época, recebe a primeira oportunidade na Seleção Brasileira e logo depois que sai do Peixe, já encontra Arthur Elias, seu atual técnico e com quem conquistou seu primeiro Campeonato Brasileiro, em 2013 no Centro Olímpico, e posteriormente Libertadores, Paulista e mais dois nacionais com o Corinthians.

“Eu e o Arthur começamos a trabalhar em 2012 após minha saída do Santos. Ele tem uma comissão técnica maravilhosa, então quando você trabalha ao lado de pessoas capacitadas, empenhadas como é o Arthur e toda a comissão dele, em um clube que te dá toda uma estrutura, tem uma diretora que luta pela modalidade, facilita muito nosso trabalho dentro de campo”, aponta Zanotti.

Foto: Reprodução Instagram

Ao desembarcar no Parque São Jorge, em 2018, a camisa 10 já encontrou um projeto em ascensão na modalidade. Não à toa e muito graças à Cris Gambaré, mulher forte por trás do futebol feminino do clube, o Timão chega à sua oitava final consecutiva dos últimos campeonatos que participou desde 2016. “Realmente eu só tenho a agradecer por isso, por ter conseguido responder muito bem esse papel. É consequência de muito trabalho, sequência num trabalho, isso tem dado muito resultado e muitos frutos para essa equipe do Corinthians”,

Além dos Estados Unidos, Gabi Zanotti também passou por Coréia e China. Aos 35 anos e com uma boa bagagem na modalidade, a atleta reconhece o crescimento do futebol feminino no Brasil, especialmente o de São Paulo, e coloca Corinthians e Ferroviária como as grandes forças. “A cada ano que passa, com o investimento de clubes de camisa, tem fortalecido ainda mais nossa modalidade aqui, abrindo mais espaço para atletas”, explica a jogadora.

Foto: Rodrigo Corsi / FPF

“Corinthians e Ferroviária são as grandes potências que hoje temos no Brasil e isso mostra também que quando você tem um planejamento, uma sequência de um trabalho, isso dá resultado. É importante que os outros clubes também vejam dessa forma”, enfatiza.

A menina que começou na rua com a molecada, que se divertia nas pracinhas e pulava muro de quadra para jogar futsal, chega para esta final de Paulistão com o prêmio de Craque da Partida da final do Brasileirão 2020 na bagagem. Ela, Arthur Elias e o Corinthians buscam mais uma vez fazer história no futebol feminino. “É muito bacana. A modalidade só tem a crescer com isso e a gente, lógico, mais uma vez feliz de estar participando de mais uma final de Campeonato Paulista”, finaliza a camisa 10 do Timão.

 

Corinthians e Ferroviária buscam o bicampeonato do Paulistão Feminino. O Timão é o atual campeão, já o time Grená se considera tetra (2002, 2004, 2005 e 2013), porém, a Federação Paulista de Futebol aponta que em 2002 não houve Campeonato Paulista. Já em 2004 e 2005, o campeão foi o Extra/Fundesport, time da cidade de Araraquara que posteriormente recebeu a marca da Ferroviária no projeto.

As finais acontecem neste domingo (13 de dezembro) e no próximo (20 de dezembro) às 11h com transmissão do Facebook, da Cultura, SporTV e rádio CBN.

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