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Com 19 jogos e 12 vitórias, Ana Lúcia é demitida após acesso para a A1

Roberta Nina

25/07/2019 04h00

(Foto: Fabio Menotti/Ag Palmeiras/Divulgação)

Ana Lúcia Gonçalves chegou ao Palmeiras em fevereiro deste ano para comandar a equipe alviverde na Série A2 do Campeonato Brasileiro e no Paulista Feminino. E, um dia após alcançar seu principal objetivo – o acesso da equipe palmeirense à Série A1 do campeonato nacional – foi surpreendida com uma demissão.

"Na segunda nós tivemos uma folga por conta do jogo de domingo e na terça eu dei o treino de manhã. E a nossa rotina era essa, após o treino iríamos almoçar e depois do almoço a gente sempre vai para a casa-sede que é ao lado do restaurante. E quando eu cheguei na casa, tinha dois funcionários do Palmeiras, um do RH e outro do financeiro e o coordenador (Alberto Simão, diretor de futebol feminino do clube) me chamou numa sala e falou que era um momento difícil, que ele agradecia em nome do Palmeiras, mas que eu estava demitida"afirmou a treinadora ao blog. 

Em entrevista às dibradoras, Ana Lúcia revelou que não conseguiu entender o significado da demissão e questionou o dirigente. "Ele levantou e falou que se tratava de incompatibilidade e saiu. Eu não sei, é puro achismo, mas penso que ele não deve ter gostado da nossa maneira de trabalhar, de como conduzíamos as coisas. Acredito eu que tenha sido isso, mas discussões e brigas nunca aconteceram."

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Durante seis meses, juntando os resultados das duas competições, o desempenho da equipe do Palmeiras sob o comando de Ana Lúcia tem 12 vitórias, 4 empates e 3 derrotas. Pelo Brasileiro A2, a campanha é invicta.

Além de Ana Lúcia, a supervisora Renata Pelegatti também foi dispensada. Depois disso, parte da comissão técnica montada pela treinadora também pediu dispensa. Até o momento, ortopedista, fisiologista, nutricionista, preparadora física e analista de desempenho pediram as contas. 

Foto: Tatiane Marques

O Palmeiras está às vésperas de enfrentar o São Paulo no primeiro jogo da semifinal do Brasileiro. O confronto será neste domingo (28/7), às 14h no Pacaembu. A volta será no estádio Nelo Bracalente, em Vinhedo, no dia 04 de agosto, às 14h.

Além do Brasileiro, o Palmeiras enfrenta o mesmo São Paulo na segunda fase do Campeonato Paulista com data a ser definida.

A chegada do futebol feminino ao Palmeiras

Ana Lúcia foi procurada pelo Palmeiras no final de 2018 e recebeu o convite para que ela fosse a treinadora da equipe em 2019. Na época, ela estava dirigindo o Grêmio Osasco Audax na Libertadores da América e ficou de dar um retorno ao clube alviverde após a competição.

E assim aconteceu, mas Ana Lúcia participou ativamente de toda a estruturação do futebol feminino no Palmeiras. "A gente começou a conversar só que não se definia a apresentação do time, montagem de elenco,  a estrutura, se seria lá (no clube) ou em outro lugar", detalhou Ana Lúcia ao blog.

Foto: Divulgação Palmeiras

Como é funcionária da Prefeitura, já havia trabalhado em Vinhedo e conhecia o prefeito da cidade, Ana Lúcia foi quem fez a ponte entre o clube paulista e a cidade do interior. "Eu tinha liberdade dentro do clube para trabalhar, tanto é que o projeto foi montado da forma que eu precisava", afirmou.

Para montar sua equipe, a técnica trouxe com ela muitas jogadoras com quem já havia trabalhado. Cerca de oito delas vieram da Ponte Preta, outras vieram do futsal, de Minas Gerais e Espanha. O Palmeiras então se instalou em Vinhedo e arcou com o custo de cinco apartamentos mobiliados oferecidos para as atletas morarem. Elas tinham também direito a se alimentar em um restaurante próximo à uma casa-sede – também cedida pelo clube – onde a comissão usava para atendimento médico e análises de vídeos dos adversários.


Apesar da distância da sede do clube, Ana Lúcia fez questão de frisar que o Palmeiras deu ao feminino tudo que foi pedido e necessário. "A gente tinha um tratamento super respeitoso, tínhamos uma relação super parceira com os profissionais do Palmeiras. Sempre fomos bem recebidos também quando estivemos na estrutura do masculino."

"Meu discurso para elas foi de gratidão"

A maneira como aconteceu a dispensa foi um baque para a treinadora e para a comissão técnica. "Fomos pegas de surpresa mesmo, não só porque trouxemos bons resultados, mas também pela implantação do projeto, como nós planejamos e que foi dando tudo certo", disse.

Elenco feminino do Palmeiras (Fabio Menotti / Agência Palmeiras)

E o mesmo baque foi sentido pelas jogadoras. Ana Lúcia foi até o local de treinamento se despedir das atletas e declarou que foi um momento muito difícil. "Elas estavam muito abaladas. Confesso que diante da situação, de todas as dificuldades que enfrentamos, do tempo de trabalho, muito treino, muito comprometimento delas que acreditaram na proposta, foi muito dolorido. Elas choraram muito e foi muito triste a despedida. Eu disse a elas que tinham uma decisão pela frente e pedi para não se abalarem. Mas quando se é pega de surpresa é muito difícil. Meu discurso para elas foi de gratidão."

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A ex-comandante da equipe palmeirense ainda não sabe qual será seu próximo destino e, ao contrário do que muita gente pensou, ela não foi cogitada pela CBF para assumir o cargo deixado por Vadão. "Foi até engraçado porque as pessoas começaram a me dar parabéns no dia da minha demissão achando que eu assumiria a seleção. Eu não estava entendendo nada", revelou aos risos.

(Foto: Divulgação)

Ana Lúcia vive intensamente o futebol há muito tempo. Foi atleta por cerca de 10 anos defendendo as equipes do Guarani, Ponte Preta, Saad, entre outras. Pós-graduada em Fisiologia do Exercício pela Unifesp e em Treinamento Desportivo pela Unicamp, Ana Lúcia já cursou a Licença A da CBF e revelou diversas jogadoras que serviram a base da seleção brasileira – a atacante Kerolin, de 19 anos, é a mais recente revelação da treinadora em 2016, quando trabalharam juntas no Guarani de Campinas. 

"Só como treinadora eu atuo há 21 anos e com o compromisso com a modalidade e de mudar conceitos e pré-conceitos eu já venho há muitos anos. E vejo que, mesmo com toda dificuldade que a modalidade enfrenta, eu estou conseguindo fazer a minha contribuição", finalizou.

Querendo saber mais detalhes sobre a demissão de Ana Lúcia, parte da torcida palmeirense organizou um protesto para esta quinta-feira (25), às 15h, no Estádio Municipal Nelo Bracalente durante o treinamento da equipe feminina.

Novo comando 

O Palmeiras anunciou na tarde desta quarta-feira (24) o novo comandante da equipe feminina. Será Ricardo Belli, treinador que anteriormente comandou a equipe sub-18 feminina no Campeonato Brasileiro da categoria. Ricardo já estará à frente do time no duelo com o São Paulo, marcado para domingo (28), às 14h, no Pacaembu, pelas semifinais da Série A2 do Brasileiro Feminino.

Com passagens por clubes de Brasil, Estados Unidos e Europa, Belli tem em seu currículo a Licença UEFA C para treinadores de futebol, obtida por meio da Federação Portuguesa de Futebol. Natural de Vinhedo-SP, o técnico acumula experiência de dez anos na função e é mestre em treino desportivo pela Universidade de Coimbra (Portugal). Além dele, o preparador físico William Pires, que também integrou a comissão técnica alviverde no torneio de base, irá para o time profissional.

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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