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Gol 'imperdoável' e mudança de postura: motivos da derrota da seleção

Renata Mendonça

13/06/2019 16h45

Foto: AFP

Há algum tempo não víamos a seleção brasileira feminina jogar bem contra um adversário de alto nível. Os nove amistosos perdidos na pior sequência da história do Brasil foram contra as melhores seleções do mundo e a equipe comandada por Vadão não teve um desempenho que fizesse frente aos seus oponentes.

Mas nesta quinta-feira, tudo aconteceu de maneira diferente no primeiro tempo da partida no Stade de la Mosson em Montpellier. O treinador mudou o esquema com o qual vinha jogando – um 4-2-4 – para um 4-3-3 com Marta mais centralizada, armando as jogadas e girando o ataque junto com Cristiane, Debinha e Andressa Alves.

A camisa 10 lesionou a coxa na preparação para a Copa do Mundo e voltou a campo contra a Austrália determinada a sair de campo com a vitória. A comissão técnica optou por não deixá-la nos dois tempos, mas na primeira etapa ela já fez toda a diferença. As principais jogadas de ataque passavam pelo pé dela, que ia dando o ritmo às chegadas brasileiras.

E a principal diferença estava aí: a bola ia de pé em pé, no chão, do jeito que as brasileiras mais estão acostumadas a jogar. O estilo de jogo que a seleção vinha adotando antes apostava numa ligação direta com passes muito longos que, na maioria das vezes, saíam errados e deixavam a defesa exposta na perda da bola. Diante da Austrália, o Brasil mudou com Formiga ficando mais recuada e protegendo a área brasileira, Thaísa e Marta um pouco mais avançadas e com a camisa 10 tendo liberdade para invadir a área adversária tanto pela direita, quanto pela esquerda. Foi assim que saíram as principais jogadas de ataque do Brasil.

O lance crucial do jogo aconteceu aos 27 minutos, quando Letícia sofreu pênalti, e Marta pegou a bola para deixar o dela. Foi o 16º gol da camisa 10 em Copas do Mundo, igualando o alemão Klose que detém a artilharia do Mundial masculino.

Isso deu mais tranquilidade para as brasileiras, que seguiram marcando em cima, roubando bolas e armaram uma jogada perfeita pelo lado esquerdo com Tamires passando a bola por baixo das pernas da adversária e enfiando uma bola na medida para Debinha cruzar. na área, Cristiane não perdoa, 2 a 0 para o Brasil aos 38 minutos. Há quanto tempo não víamos essa superioridade, tanto em campo, quanto no placar?

O problema aconteceu justamente nesse momento. Porque nos acréscimos, a seleção se desconcentrou e Caitlin Foord apareceu livre na área para empurrar a bola pro gol no rebote da defesa brasileira. Um banho de água fria para quem dominava o jogo e estava garantindo a classificação para as oitavas de final. Na zona mista, Andressa Alves não escondeu que esse foi o erro crucial que o Brasil não poderia ter cometido.

"Não dá pra você tomar um gol faltando 1min pra ir pro descanso. É imperdoável. Aí o jogo que estava totalmente no nosso controle ficou totalmente aberto. A gente tinha o jogo na mão e perdeu. Não soubemos controlar o resultado", afirmou.

Voltou aquele sentimento de quem há três anos não vence a Austrália (desde 2016) e na hora que está vencendo, em vez de ter calma para administrar o resultado, entra na pilha que beneficia as adversárias.

E, enquanto isso, no vestiário as australianas tinham a certeza de que poderiam virar após o gol marcado minutos antes do intervalo.

"Acho que o ponto de virada foi marcar o gol logo antes de ir para o intervalo. Podia sentir no vestiário que as meninas acreditavam que dava. Não perdemos nossa confiança, elas acreditam umas nas outras, acreditam no estilo de jogo e no trabalho que está sendo feito", avaliou o técnico da Austrália, Ante Milicic.

Mudança de postura

No segundo tempo, Vadão precisou tirar Marta – para não arriscar perdê-la no resto da competição – e colocou Ludmila para dar um gás na ponta, com Andressa Alves pelo meio para armar. E Formiga pediu para sair por ter sentido uma pancada no pé, segundo o treinador – entrou Luana no meio-campo. É ela também quem vai para o jogo contra a Itália, já que a camisa 8 tomou o segundo amarelo hoje.

O problema maior foi a mudança de postura do Brasil dentro de campo. A seleção passou a errar passes e errou também na marcação, dando espaço para as australianas jogarem como mais gostam, na velocidade. Elas foram chegando, chegando e aí em um erro coletivo da defesa – todo mundo deixou a bola de Logarzo passar – o chute da australiana entrou.

O segundo tempo foi quase todo da Austrália, exceção feita a boas jogadas pela esquerda com Tamires e Debinha – essa que tem abusado dos gols perdidos – e um ou outro lampejo de Andressa e Ludmila pela direita. A seleção deixou o nervosismo dominar e isso prejudicou demais. Foi assim que as australianas acharam o terceiro gol com a cabeçada de Mônica, que acabou fazendo contra.

Mas essa derrota já significa muito mais do que as outras que a antecederam. A postura do Brasil melhorou demais no primeiro tempo. O esquema de jogo foi bem melhor e funcionou muito bem assim. A questão é que o nervosismo precisa ficar fora de campo.

As críticas à comissão técnica são válidas, mas isso é algo que já falamos há bastante tempo. Vadão não tem competência, nem mérito para estar no comando da seleção feminina por duas Copas do Mundo. O desempenho em campo dos amistosos já mostram isso há pelo menos um ano e nada foi feito. Só que agora é tarde. A própria Austrália mudou de técnico em fevereiro e tem conseguido uma evolução considerável do time. Não fizemos isso, mas ao mesmo tempo melhoramos nosso desempenho nos dois últimos jogos – especialmente nesse contra a Austrália, com a utilização de Marta mais centralizadas e as atacantes mais livres para girar na área. Ainda há pontos positivos dessa derrota pelo que foi visto em campo no primeiro tempo. Mas não dá para fazer um primeiro tempo tão bom e deixar cair tanto o rendimento no segundo.

Há também que se questionar a convocação de Vadão com apenas quatro jogadoras de meio-campo – Thaisa, Formiga, Andressinha e a jovem Luana, que teve pouquíssima experiência na seleção principal. Num momento como esse em que perdemos nossa jogadora mais experiente, ficamos sem tantas alternativas de jogo.

De toda forma, ainda dá para acreditar na classificação. Uma vitória sobre a Itália é bastante factível, o Brasil tem time para isso.

 

 

 

 

 

 

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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