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Jogadoras lançam 'pagode do futebol feminino' para embalar mulheres na Copa

Renata Mendonça

06/06/2019 04h00

Foto: Bianca da Cruz Ferreira

O pagode sempre foi tradicional entre os jogadores de futebol. No ônibus indo para o jogo ou na concentração antes de alguma partida, é ele quem sempre acalma os ânimos dos atletas e cria o clima descontraído entre todos. E não é raro alguma dessas músicas virar o "tema" de conquistas importantes do futebol, como aconteceu com "Deixa a Vida Me Levar" no pentacampeonato da seleção masculina em 2002.

O futebol das mulheres também não foge a essa regra. Adeptas do pagode no "busão", elas também tocam o pandeiro e o tantã e levam na palma da mão as músicas para relaxar a caminho dos jogos. Só que lá em 2011, nessa brincadeira, duas jogadoras acabaram criando um refrão que ficou famoso para além das fronteiras do clube em que elas jogavam à época. No fim, o refrão ganhou estrofes, tudo isso ganhou ritmo e virou o "hino do futebol feminino", lançado neste dia 6 de junho, na véspera do início da Copa do Mundo da França.

"A história se repete, não muda. Essa música representa igualdade. Porque ela conta a história de cada mulher, cada menina que joga. E ela conta uma história feliz, porque no final ela enaltece a mulher no futebol. É o que a gente está buscando, essa igualdade", afirmou às dibradoras a meio-campista Cacau, que hoje defende o Corinthians e foi uma das criadoras da música ao lado de Gabriela Kivitz, ex-jogadora e atual comunicóloga.

Foto: Bianca da Cruz Ferreira

O refrão veio da cabeça dela nas idas e vindas dos jogos quando ainda atuava pelo Centro Olímpico em 2011. Cacau tocava pandeiro e Gabi, colega de time, comandava o tantã. Juntas, as duas foram dando ritmo àquilo que viraria a música oficial "Jogadeira" anos depois.

"Qual é, qual é, futebol não é pra mulher? Eu vou mostrar pra você, mané, joga a bola no meu pé", diz a parte principal da música.

O clipe foi feito de maneira independente e contou com a participação de várias atletas – inclusive da seleção brasileira, como a meio-campista Luana e a zagueira Mônica – e também ex-atletas, como a própria Gabi e Milene Domingues. O lançamento foi feito nesta quinta-feira, justamente para aproveitar o timing do início da Copa do Mundo, e as dibradoras tiveram acesso ao material com exclusividade.

A letra diz muito sobre a vida de uma menina que gosta de jogar bola:

Desde pequena muito preconceito
Aqueles papo "futebol não é pra mulher"
Mas aprendi a dominar no peito, por no chão e responder com a bola no pé

Sempre com a molecada correndo na rua
É ligeira monta o time e a panela é sua
Não que brincar de boneca nem pintar na escola
Só quer saber de driblar, correr atrás de bola

REFRÃO
Qual é, qual é?!
Futebol não é pra mulher
Eu vou mostrar pra você mané
Joga a bola no meu pé

A ideia da música era justamente abordar essas dificuldades, só que de uma maneira leve e alegre. O resultado ficou tão legal que toda jogadora que já ouviu esse refrão desde que Cacau e Gabi o criaram em 2011 dizia: "vocês precisam gravar isso".

Foto: Bianca da Cruz Ferreira

Elas até tinham esse plano lá atrás, mas aí cada uma seguiu seu caminho no futebol, Gabi viajando para os Estados Unidos para fazer faculdade e jogar lá, enquanto Cacau passou por outros clubes pelo Brasil e a ideia ficou adormecida. Retomou com todo o vapor no fim do ano passado, quando elas entenderam que o melhor momento para lançar esse "hino" da mulher no futebol seria em 2019, um ano em que a Copa do Mundo feminina finalmente trouxe holofotes para as mulheres que jogam bola.

"Acho que toda menina que joga futebol já passou por essa situação de chegar para jogar e os caras olharem torto, do tipo: o que essa mina está fazendo aqui, vai estragar nosso futebol. Aí é justamente a frase do "esse papo 'futebol não é pra mulher"'. Aí a minha experiência era que no primeiro toque que eu dava na bola os caras já falavam: noooosssa, ela sabe. E é a resposta da música, você aprende a 'dominar no peito, por no chão e responder com a bola no pé'. A gente está acostumada a conviver com essa desconfiança, mas a gente também se acostumou a provar por que a gente está ali", disse ao blog Gabi, a co-autora da música.

"Ela fala da menina que joga profissional, mas esse preconceito desde criança é uma coisa que qualquer menina que joga se identifica. E a gente tentou descrever isso na música de forma alegre. É para representar de uma maneira alegre uma realidade de luta que o futebol feminino vive, essa é a ideia."

Foto: Bianca da Cruz Ferreira

Para fazer a música virar, clipe, as duas contaram com a ajuda de muitos amigos que viabilizaram toda a produção. A gravação no estúdio aconteceu por meio de um projeto do governo estadual de São Paulo chamado "Fábrica de Cultura", que dá acesso gratuito a várias atividades artísticas – inclusive esse tipo de produção musical. Depois, para fazer o clipe, elas tiveram a participação de uma amiga de Gabi, que também fez a finalização do vídeo.

"Esse projeto está acontecendo sem nenhum patrocínio, tudo na raça. Para o clipe, eu pensei que seria legal ter só mulheres produzindo, seria significativo pelo que essa música representa. Aí falei com uma amiga que trabalha com audiovisual, Marcela, que topou fazer de graça até, porque gostou muito da ideia. Aí a partir daí fomos fazendo o roteiro e mobilizamos meninas para fazer a gravação do clipe. E todas as meninas que eram do time de 2011 quando a música nasceu estão no clipe, isso foi bem legal", contou Gabi.

"É o momento ideal para lançar uma manifestação que seja um símbolo dessa luta. Que represente essa conquista das mulheres. É um símbolo disso. Nosso desejo é que as meninas que jogam se identifique e que isso seja um hino pra elas, e que para quem não conhece a realidade do futebol feminino que passe a conhecer de uma forma leve e alegre", finalizou.

FICHA TÉCNICA

Produção e Direção: Gabriela Kivitz, Marcela Urbani e Camila Sanchez
Assistentes de Produção: Silvana Goulart Urbani, Nathalia Falcao
Cobertura Making Off e Fotos: Bianca Ferreira
Câmera: Marcela Urbani, Camila Sanchez
Edição: Marcela Urbani
Apoio: Mandela Espetos

Jogadoras/figurantes
Carina Fernandes
Monica Hickmann
Gabriela Zanotti
Paula Pires
Vitória Albuquerque
Milene Domingues
Tamires Souza
Giovanna Campiolo
Giovanna Crivelari
Viviane Holzel Domingues
Monique Alves de Oliveira Somose
Aliane Oliveira Barros
Alice Ribeiro Martins
Denise Cristine de Oliveira
Renée Abreu
Suzana P. Da Silva Bonini
Thais Silva Amorim
Luciele Martins
Daniella Cavallini Navarro
Carolina Marcinari Moreira
Francielle Alberto
Luana Bertolucci
Sandra Vieira Figueiredo
Ana Flavia Guimaraes
Larissa de Oliveira Rodrigues
Laura Cristiane Damaso
Natalia Correia Ribeiro
Cibele Pereira da Cruz

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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