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Tradição de Copa fará empresas pararem também para seleção feminina

Renata Mendonça

04/04/2019 04h00

Foto: Folhapress

Copa do Mundo é sempre sinônimo de uma rotina diferente no trabalho, na escola e até no comércio. O horário de pegar no batente ou voltar para casa pode variar de acordo com o calendário de jogos da seleção brasileira. Tudo gira em torno da campanha do Brasil no campeonato mais importante do esporte mais popular do país – e do planeta também.

Mas calma, ficou faltando um detalhe importante ali. Não é para qualquer Copa que o país para. É para a Copa do Mundo de futebol masculino. Quando as mulheres estão em campo pelo Mundial, muitas vezes não há nem canais de TV dispostos a transmiti-las. Na imensa maioria das vezes – ao menos nas últimas sete edições até aqui -, as pessoas sequer sabiam que havia uma Copa do Mundo acontecendo.

Mas este ano promete ser diferente. Desde que a TV Globo anunciou a transmissão de todos os jogos da seleção brasileira de futebol feminino no Mundial, algumas empresas começaram a pensar sobre o que fazer a esse respeito. Afinal, se um escritório costuma parar para ver a Copa deles, por que não pararia para ver a Copa delas?

Foi essa linha de pensamento que levou o Grupo Boticário a fazer um anúncio um tanto surpreendente no dia 8 de março passado. A empresa irá parar suas atividades durante os jogos do Brasil na Copa do Mundo de futebol feminino para apoiar a seleção.

A ideia foi anunciada em uma campanha chamada "Com você eu jogo melhor", que convidava os funcionários a refletir sobre a equidade de gênero também no esporte durante a Copa do Mundo.

Foto: Reprodução

"Pra gente, 8 de março é um dia de atitude. Na nossa empresa, nas rodas de conversas, no dia a dia e também nos jogos. Entre junho e julho, vamos parar nossas atividades para assistirmos aos jogos do time feminino de futebol. Um pequeno gesto para uma grande reflexão. Convidamos você a fazer parte desse movimento. Vamos jogar juntos pela equidade de gênero?", questionou o post com mais de 28 mil curtidas no instagram da empresa.

A ação incluirá a mudança no horário de trabalho de quem atua nas fábricas do Boticário e gerará uma flexibilidade para quem trabalha nos escritórios também poder ver os jogos. "No ano passado, a gente colocou alguns telões na fábrica para o pessoal de lá conseguir ver a Copa da Rússia. Nos escritórios, a gente ajustou a hora de entrada e saída para o colaborador usar o banco de horas e poder sair para ver o jogo. Agora, a gente está fazendo do mesmo jeito. A ideia é estimular esse debate, dar a mesma oportunidade que a gente deu na Copa masculina também para a Copa feminina", explicou Mariana Scalzo, porta-voz do grupo.

"A gente refletiu sobre esse tema, equidade de gênero, e sobre qual é o nosso papel na transformação que a gente que ver no futebol e na sociedade também. Então aproveitamos que vai ter transmissão em TV aberta para fazer isso", completou.

Sempre vai ter gente para dizer que é absurdo uma empresa "parar" por causa da Copa. E essa é uma reflexão plausível em alguns aspectos. Mas é fato que essa cultura que se estabeleceu no chamado "país do futebol"colaborou muito para estreitar os vínculos dos brasileiros com a seleção e com o próprio esporte em si. Mesmo quem não gosta de futebol acaba sendo "obrigado" a ver a Copa (masculina). É desafiador conseguir encontrar um lugar onde o jogo não esteja passando quando a seleção está em campo.

Então já que isso acontece com o Brasil no masculino, por que não fazer o mesmo estímulo ao feminino? Quem sabe uma ação como essa pode ajudar a estabelecer a cultura do brasileiro de parar para ver também o futebol delas? Na Olimpíada, isso aconteceu parcialmente. Quando a seleção feminina enfrentou a Austrália nas quartas-de-final dos Jogos de 2016, os bares estavam cheios de gente com o olho grudado na TV – não à toa, essa foi a quarta maior audiência de toda aquela Olimpíada por aqui.

Brasil derrotou a Austrália nos pênaltis durante os Jogos Olímpicos do Rio, em 2016 (Foto: Mariana Bazo/Reuters)

No caso dessa ação, serão 8 mil pessoas que trabalham no Grupo Boticário em São Paulo, Curitiba, Bahia e Espírito Santo e terão a oportunidade de ver os jogos da seleção feminina durante a Copa. Mas o impacto não parou por aí. Outras empresas estão buscando uma estratégia nesse sentido – o próprio Boticário e a agência responsável pela campanha já receberam inúmeras consultas sobre a ação na Copa do Mundo porque querem criar iniciativas similares.

A Heineken foi uma das empresas que já confirmaram que terão ações durante o Mundial para os funcionários verem os jogos da seleção feminina. Segundo a empresa, o projeto faz parte do direcionamento global da marca, que quer trabalhar inclusão e diversidade em todas as áreas. Como patrocinadora da Champions League, a cervejaria já costumava transmitir jogos do torneio europeu e também da Copa masculina para os funcionários. A novidade deste ano é que agora haverá também a transmissão da Copa feminina.

"O cenário cervejeiro é um pouco mais machista e historicamente é constituído por uma maioria de homens, então nós temos um projeto de trabalhar inclusão e diversidade.  A gente tem cultura de transmitir jogos da Copa e da Champions, e vamos fazer isso agora também com a Copa feminina. No escritório de São Paulo, é muito comum as pessoas descerem ao longo dos jogos para trabalhar lá de baixo e assistindo. Nas outras plantas, as TVs ficam no refeitório, então as pessoas veem lá. A gente acredita que vai ter um engajamento grande", informou Camila Quintieri, da área de Recursos Humanos na Heineken.

A seleção feminina estreia na Copa do Mundo da França no domingo, dia 9 de junho, diante da Jamaica. Depois, enfrenta a Itália dia 13 (quinta-feira) e fecha a primeira fase dia 18 (terça) contra a Austrália.

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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