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Seleção feminina perde da Inglaterra: sobra talento, falta organização

Renata Mendonça

27/02/2019 21h13

Foto: CBF

A seleção brasileira de futebol feminino "estreou" nesta quarta-feira sua temporada pré-Copa do Mundo com uma derrota para a a forte Inglaterra (quarta colocada no ranking da Fifa) por 2 a 1 no primeiro jogo da "She Believes Cup", torneio amistoso realizado nos Estados Unidos. A 100 dias do Mundial, a seleção enfrenta adversários difíceis e importantes na preparação para o maior desafio do ano e acabou saindo mal do primeiro confronto.

O time comandado por Vadão até abriu o placar no início do primeiro tempo em uma jogada genial de Marta, mas que já apontava um problema da seleção brasileira. A camisa 10 foi buscar a bola atrás da linha do meio-campo para sair em velocidade pelo lado esquerdo e tirar as marcadoras inglesas para dançar. Depois do drible, a jogadora levou um empurrão e a árbitra deu pênalti para o Brasil. Andressa Alves cobrou e balançou as redes.

Andressa Alves marcou para o Brasil (Foto: Elsa/Getty Images)

Foi um começo até melhor do que a seleção merecia. Acuada pela marcação apertada da Inglaterra na saída de bola, o Brasil não conseguia sair jogando pelo chão e isso dificultava bastante a criação. Mas após o gol, foi perceptível a melhora da equipe brasileira na aplicação defensiva, tentando fechar os espaços para impedir as chegadas da Inglaterra.

O ataque ainda dependia muito do talento de quem estava na frente para buscar a bola atrás e construir a jogada – o que tornava a vida das defensoras inglesas um pouco mais fácil, porque o jogo estava mais lento. De qualquer forma, valeu a vantagem que foi levada para o intervalo. Vale ressaltar que a seleção ainda perdeu Ludmila, atacante, que sentiu uma lesão muscular e deixou o gramado ainda no primeiro tempo para a entrada de Debinha.

Ludmilla desfalcou o Brasil ainda no primeiro tempo (Foto: Elsa/Getty Images)

Na segunda etapa, com Debinha pela ponta em vez de Lud, o Brasil perdeu velocidade, e acabava sempre ficando na marcação da Inglaterra, muito bem postada, aliás. Pressionada, a seleção errou passes simples e deu chances para as inglesas chegarem na área brasileira.

E foi assim que elas construíram uma superioridade perceptível no segundo tempo, passando entre as linhas da bagunçada defesa do Brasil e encontrando espaços para chutar ou cruzar na área. O primeiro gol veio assim, com uma rápida triangulação entre as inglesas, que terminou com Ellen White livre para chutar cruzado e empatar a partida.

Daí em diante, o Brasil ficou todo recuado, e a Inglaterra construía as jogadas em busca da vitória. Eram raros os momentos da seleção no ataque, a não ser quando Bia Zaneratto vinha buscar a bola no meio, ou então Marta tentava penetrar a defesa na jogada individual.

A camisa 10 acabou substituída por Geyse, a novata que entrou muito bem e deu velocidade para a equipe brasileira, mas não conseguiu resolver o problema da falta de transição das bolas entre defesa e ataque. Adriana, atacante do Corinthians que foi artilheira do Brasileiro em 2018, também esteve buscando jogo, e foi um destaque positivo na partida.

Mas ainda pesava a desorganização tática da seleção brasileira. Enquanto Formiga roubava as bolas, não havia ninguém para receber dela e construir a jogada do ataque. Acabava que essa bola era rifada ou ia pelo alto parar na cabeça ou nos pés de uma jogadora inglesa. A centroavante Andressa Alves jogava no meio-campo, mas não rendeu ali o que costuma render na frente, porque não tem a característica de movimentação e condução de bola. Acabou apagada do jogo por conta disso.

Com a falta de produção no ataque, o Brasil também vacilava em sua defesa, especialmente nas laterais. E em uma jogada das inglesas pela direita, quando três brasileiras marcavam a mesma jogadora, ela tocou para Beth Mead do lado direito, e a atacante Beth Mead acertou um chute lindo e indefensável para a goleira Aline. A virada inglesa veio e foi merecida.

Vadão ainda tentou fazer algumas alterações na reta final, colocando a volante Thaisa no lugar da lateral Jucinara, que não fez uma boa partida e, nos acréscimos, tirou a zagueira Monica para colocar Kathellen, que joga na mesma posição. Mas nada surtiu efeito, e excetuando os raros lances individuais de Geyse ou Adriana, o Brasil produziu muito pouco no ataque.

Foto: Reprodução Twitter

Balanço

Não foi uma boa estreia para a seleção, que segue apresentando os mesmos problemas vistos no último ano sob o comando de Vadão. O time ainda é muito desorganizado taticamente. A marcação das linhas defensivas deixa muitos espaços, e não há transição entre esse setor e o ataque. As bolas só chegavam na área inglesa quando vinham de lançamentos longos – que muitas vezes davam errado – ou quando as próprias atacantes vinham buscar a bola atrás.

A seleção ainda conta com desfalques importantes, como a atacante Cristiane, a goleira Bárbara, a zagueira Rafaelle, a meio-campista Andressinha, e a lateral Fabi, mas ainda assim chama a atenção a quantidade de falhas cometidas pela equipe, no passe e no posicionamento.

Aliás, falando em posicionamento, hoje houve uma alteração importante nesse sentido. Na escalação, Vadão montou um 4-2-4, que teoricamente deveria deixar o time mais ofensivo, mas pela falta de articulação no meio-campo, isso não aconteceu. A ideia do técnico foi colocar Andressa Alves ao lado de Formiga, numa tentativa de talvez partir dela a criação ofensiva. Mas a jogadora não costuma atuar nessa função e hoje apareceu mais como uma peça importante na recomposição e defesa do que no ataque propriamente dito. Sendo assim, havia um buraco no meio-campo: a bola não chegava ao ataque.

Na etapa final, Vadão tentou puxar Marta para essa função, mas também não deu muito certo. A marcação inglesa estava forte e ela não teve saída. As jogadoras ficavam muito distantes no setor ofensivo, o que dificultou para a seleção na hora de furar os espaços da defesa inglesa.

(Foto: Bill Streicher/USA Today Sports)

Resumindo: essa seleção tem bastante talento. Tem Formiga, incansável no meio-campo. Tem Marta, Ludmila, Bia Zaneratto, um trio de muito respeito lá na frente. Adriana ainda complementa esse setor muito bem. No banco ainda tem Geyse, para entrar e mudar a cara do jogo.

Sem falar de Cristiane e Andressinha que estão fora, e Andressa Alves, que quando joga na frente rende muito mais. O talento dessa seleção é indiscutível. Assim como é também a desorganização. E de agora em diante, com as jogadoras em plena atividade nos clubes (calendário europeu já está em andamento e o brasileiro começa no próximo mês), fica difícil encontrar tempo para corrigir esses problemas nos treinamentos.

De qualquer forma, o desafio do Brasil contra o Japão tende a ser um pouco mais leve. Quem sabe na partida do próximo sábado (transmissão no SporTV a partir de 16h), a seleção não encaixe melhor o seu jogo dentro de campo.

O Brasil estreará na Copa do Mundo da França diante da Jamaica no dia 9 de junho, depois enfrentará Itália e Austrália pelo grupo C.

Escalação

O Brasil foi a campo com: Aline, Letícia, Erika, Monica e Jucinara; Formiga e Andressa Alves; Ludmilla, Marta, Bia Zaneratto e Adriana.

A Inglaterra entrou com: Telford, Greenwood, McManus, Houghton e Bronze; Walsh, Christiansen, Carney, Kirby, Parris e White.

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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