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As novas caras do ataque brasileiro para a Copa do Mundo feminina

Renata Mendonça

05/06/2019 07h42

Geyse tem 21 anos, é a mais nova da seleção na Copa (Foto: CBF)

Quando se pensa em gols na seleção brasileira de futebol feminino, logo vêm à cabeça os nomes de Marta e Cristiane, as principais responsáveis por balançar as redes nos últimos 15 anos com a camisa do Brasil – não à toa elas figuram na lista de maiores artilheiras da história da seleção. Mas é uma tradição brasileira produzir craques lá na frente e, no time que vai disputar a Copa do Mundo feminina na França, já há pelo menos dois nomes que nos trazem boas perspectivas de futuro no ataque.

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Não estamos falando da "próxima Marta" ou da "próxima Cristiane", até porque elas guardam características distintas. Mas com Ludmila e Geyse no ataque podemos esperar duas coisas: ousadia e muita velocidade.

A primeira tem 24 anos, e não faz nem 10 que descobriu no futebol seu maior prazer. Ludmila passou muito tempo investindo seu esforço em outro esporte: o atletismo. A bola era só uma brincadeira na rua, até que um vizinho de onde morava na periferia de São Paulo a levou para fazer um teste no Juventus. Foi ali que tudo começou.

Ludmila é um dos destaques entre os novos nomes do ataque da seleção (Foto: CBF)

Geyse, por sua vez, nasceu ouvindo o nome da conterrânea melhor do mundo, a também alagoana Marta. A jovem de 21 anos é de Maragogi, começou jogando futebol na praia e lembra até hoje a primeira bola de ouro vencida pela craque da seleção, ainda em 2006. Ali nasceu o sonho de ser um dia como ela, uma jogadora de futebol.

Hoje, Geyse e Ludmila conquistaram espaço na seleção brasileira e disputarão pela primeira vez uma Copa do Mundo. As duas são jogadoras de muita personalidade, que usam a velocidade que têm como característica para partir pra cima das adversárias.

Do atletismo ao futebol

Lud começou jogando no Juventus, foi para o São José, e foi contratada pelo Atlético de Madri em 2017. Lá é protagonista do ataque de um dos principais times europeus do momento, que tem uma torcida fanática já apaixonada pela brasileira.

Mas o caminho que levou a atacante até lá não foi nem um pouco simples. Ludmila perdeu o pai ainda cedo, viveu alguns anos em um orfanato até ser "salva" de lá pela tia – o orfanato estava fechando e as crianças que moravam ali não teriam lugar pra ficar. Na escola, encontrou no esporte uma válvula de escape e virou corredora de provas de 100 metros rasos.

Emily foi quem lançou Ludmila para o futebol (Foto: Divulgação)

O encontro com o futebol veio em um teste inusitado arranjado por um amigo. O vizinho que a via jogar nas ruas da periferia de São Paulo, acreditou no potencial dela como jogadora e a levou para uma escolinha, para depois conseguir uma avaliação para ela no Juventus. A garota tinha 15 anos, era a primeira vez que estaria pisando em um campo de futebol. Seria um início tardio, mas a técnica Emily Lima resolveu apostar nisso.

"A Ludmila chegou ao Juventus por um amigo, o Eduardo, que sempre tentou ajudá-la devido a todos os problemas que ela tinha na família, no desenvolvimento como criança e na adolescência. A característica dela que chamou a atenção foi a força e a velocidade. Isso sem dúvida alguma, ela era muito rápida", contou Emily às dibradoras.

"O que a gente precisou lapidar foi a parte técnica. A gente tirava um período somente pra fazer a parte técnica, à tarde, pra que a gente pudesse não tê-la só como uma atleta rápida e forte, mas que pudesse facilitar pra ela também. Aí ela foi evoluindo, se desenvolvendo."

Ludmila passou por alguns clubes no Brasil, como Santos, Portuguesa, Rio Preto e São José e teve também uma experiência na seleção de base onde ouviu uma crítica que a decepcionou. "Só sabe correr", disse um membro da comissão técnica para ela. Mas a jogadora não deu ouvidos e seguiu trabalhando forte. No São José, sob o comando de Emily, ela conseguiu se firmar, foi campeã da Libertadores e teve a chance de jogar na seleção principal em 2017, quando a treinadora foi comandar o Brasil.

Um gol marcado por ela contra a campeã olímpica Alemanha – em que acreditou na bola e conseguiu empurrar para dentro do gol – fez com que Ludmila chamasse a atenção do Atlético de Madri. A jogadora chegou ao clube em agosto de 2017 e, logo em sua primeira temporada, disputou 27 jogos, marcando 12 gols e dando seis assistências. Na segunda temporada, essa que acabou agora, Lud foi protagonista do time que conquistou o título espanhol.

"Hoje ela está evoluindo muito a cada ano. Aquele processo de desenvolvimento dela para hoje é muito significativo, tanto que ela está em um grande clube. A característica que mudou foi a técnica, ela conseguiu ir se adaptando, evoluindo, e hoje ela é rápida, forte e técnica. Pode ser ainda mais, ela sabe disso, tem essa consciência, isso é o mais importante para a atleta. Saber onde pode chegar, as suas limitações e tal. E ela sabendo disso, ela busca sempre treinar ainda mais a parte técnica dela", avaliou Emily.

 

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Dali em diante, foi figura frequente nas convocações e chama a atenção por se impor no um contra um, deixando as adversárias para trás com certa facilidade. Assim, ganhou espaço na seleção brasileira e vai disputar sua primeira Copa na França.

"É uma honra pra mim jogar ao lado de atletas que eu sempre admirei, Marta, Formiga, Cristiane. A Formiga é um mito, não tem o que falar. Tenho que só desfrutar desse momento", afirmou a atleta.

Futebol de praia, de salão, de campo

Aos 21 anos, Geyse é a mais jovem jogadora da seleção. Ela sequer tinha nascido quando Formiga estreou com a camisa amarelinha em 1995. Hoje, as duas dividem o mesmo sonho de trazer a conquista do Mundial para o Brasil. 

Geyse sempre levou o futebol na brincadeira quando jogava com as amigas na praia de Maragogi, destino turístico famoso de Alagoas. Até que recebeu o convite para participar do time de futsal da escola. Mas a mãe não gostou muito da ideia.

"Contei pra minha família, a minha mãe não deixou eu ir. Eu falei com meu padrasto, que é meu pai, ele falou: pode ir. Então eu escutei mais ele do que minha mãe", contou, aos risos.

Foto: Dibradoras

A partir daí a menina soube que seu futuro estaria no futebol. Ela tinha 8 anos quando viu Marta conquistar pela primeira vez o prêmio de melhor do mundo em 2006 e essa imagem nunca saiu da memória. A vontade de chegar um dia a ser jogadora só crescia.

"Foram surgindo mais oportunidades. Eu tinha 14 anos a primeira vez que joguei no campo, por um time lá em Maceió, foi onde tudo começou. Depois, eu parei um tempo, porque tive tendinite no joelho direito. Aí surgiu outra oportunidade do União Desportiva Alagoana, eles me deram todo o suporte, quando eu tinha 15 anos mais ou menos. Eu estava jogando Copa do Brasil quando surgiu a peneira da sub-20 em Recife. Aí eu passei na peneira, nem acreditei", relatou a jogadora.

Foto: Divulgação Benfica

"Eu estava na praia quando recebi as mensagens. Não acreditei, cheguei em casa e contei pra minha mãe e meus irmãos. Ela ficou sem reação, ficou muito feliz".

Geyse saiu de casa com 13 anos para morar em Maceió pelo futebol. Dali em diante, nunca mais voltou a viver com a família. Foi para São Paulo, jogou no Centro Olímpico, no Corinthians, na Espanha e hoje defende o Benfica de Portugal. Para aliviar a saudade e tê-la sempre por perto, a jogadora tatuou o rosto da mãe no braço e fala dela com muito carinho.

A jogadora leva a mãe tatuada no braço (Foto: CBF)

"Eu quis trazê-la para onde eu for. Já que eu não posso estar com ela o ano todo, fiz isso pra matar um pouco da saudade", contou.

Se não havia gostado muito da ideia de ver a filha jogando futebol no início, hoje a mãe de Geyse é fã da garota. Mas não conseguiu ainda ver um jogo dela no profissional do estádio. Agora, da TV, poderá torcer por sua menina na Copa do Mundo.

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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