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O futebol já mostrou que rosa também é 'cor de menino'

Renata Mendonça

04/01/2019 04h00

Foto: Divulgação Palermo

Na primeira semana do ano sob o novo governo eleito em 2018, houve uma fala da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, que gerou polêmica nas redes sociais. "É uma nova era no Brasil: meninos vestem azul, meninas vestem rosa", afirmou a pastora, em grito que foi entoado por muitos ao seu redor.

Na "nova" e até na "na antiga" era do futebol, porém, essa máxima acabou ficando para trás. Grandes clubes, alguns dos mais tradicionais de todo o mundo, já vestiram camisas rosas em seus uniformes. Muitas delas, inclusive, que foram sucesso de venda. Foi o caso do Boca Juniors no início de 2014, que teve o manto da tal "cor de menina" como um dos  mais vendidos de sua história. Enquanto torcedores criticavam e a Associação Argentina de Futebol (AFA) proibia o clube de vestir essa camisa em campo, nas lojas ela era um sucesso, com mais de 50 mil vendidas.

Seleção escocesa também lançou camisa rosa recentemente (Foto: Divulgação)

Real Madrid, Barcelona, Bétis, Juventus, Palermo, Porto, Benfica, Everton, Manchester United, são alguns dos principais clubes do futebol mundial que já tiveram camisa rosa em sua história recente. No Brasil, Atlético-MG, Grêmio, Bahia e Internacional já vestiram rosa – os dois últimos, pasmem!, chegaram a entrar em campo e disputar uma partida de futebol com o uniforme rosado.

Mas antes de relembrar todos esses casos, é importante mencionar que quase nenhum deles veio sem polêmica. Porque muitos torcedores de futebol ainda não entendem como um "homem que é homem mesmo" pode usar rosa. E se essa divisão de cores ainda existe – e os bebês recém-nascidos saídos da maternidade não nos deixam mentir -, é porque boa parte da nossa sociedade ainda acredita que rosa deve ser "a cor das meninas" e azul deve ser "a cor dos meninos". Que a menina deve ser "a princesa" e o menino "não pode chorar". A mesma parte que também acha que existem brinquedos de menino e brinquedos de menina. Esportes de menino e esportes de menina. E que futebol está na lista das coisas que "não são para elas". É uma metáfora, sim, como a ministra justificou, mas uma metáfora que passa um recado muito direto: vamos educar as meninas e os meninos para continuarem onde sempre estiveram – a mulher dentro de casa (pode até trabalhar, mas sem deixar o cuidado do lar e dos filhos, afinal, ela nasceu para isso); o homem sendo o protetor e o provedor, forte, dominador, que vai proteger sua mulher dos perigos dessa vida (o que seria delas sem eles, afinal?).

Camisa do Boca foi polêmica em 2012, mas teve recorde de vendas (Foto: Divulgação)

Por sorte, nas últimas décadas o próprio futebol tem lutado contra essa lógica. As camisas rosas servem para quebrar esse estigma e romper com a ideia ultrapassada de que cor define gênero. E o mais interessante é perceber que, mesmo diante de todas as críticas dos torcedores e das "zoeiras" dos rivais (que se repetem sempre), nas lojas o sucesso das vendas dos uniformes rosa para todos os públicos mostra que a cor não precisa ser de "menina" nem "de menino", pode ser de todo mundo. Assim como o futebol.

As camisas rosas dos times:

Palermo: as cores oficiais do clube italiano fundado em 1900 são o rosa e o preto, e isso nunca foi motivo de comentários preconceituosos ou de "chacota" dos rivais. O estádio faz uma festa linda bem rosada para o time jogar, com homens e mulheres na arquibancada vestindo cor-de-rosa sem distinção.

Juventus: o clube italiano foi fundado em 1897 e também tinha as cores rosa e preto como oficiais. Isso durou até 1905, quando houve uma mudança para as cores branco e preto para imitar um time inglês que era bem popular à época, o Notts County. Ao longo das ultimas duas décadas, a Juve chegou a lançar várias camisas comemorativas relembrando suas cores originais – elas fizeram bastante sucesso de vendas.

Juve já recorreu várias vezes às cores originais rosa e preto em seus uniformes (Foto: Divulgação)

Boca Juniors: conforme mencionado acima, o Boca lançou seu uniforme rosa entre 2013 e 2014, mas acabou proibido pela AFA de utilizá-lo em campo. Houve bastante polêmica entre os torcedores, mas as vendas foram de vento em popa.

Real Madrid: em 2014, o time espanhol, que sempre tem uma terceira camisa de cor diferente pelo marketing das vendas, lançou um uniforme rosa, que foi sucesso completo de vendas. Uma pequena loja de Madri, Tienda el Carmen chegou a vender 50 dessas por dia, segundo divulgou o site espanhol "El Confidencial Digital" à época.

Barcelona: Justamente nesta temporada, o Barcelona lançou sua terceira camisa rosa. Divulgado em setembro de 2018, o brasileiro Philippe Coutinho foi um dos garotos-propaganda do novo uniforme ao lado de Piqué e Dembelé. No passado, porém, o clube catalão já havia adotado o rosa em uniformes de treino – curiosamente, isso aconteceu também no ano de 2014, quando o rival de Madri adotou essa cor no terceiro uniforme.

(Foto: Divulgação)

Benfica: Em 2007, o Benfica lançou uma camisa rosa com o intuito de aumentar as vendas entre as torcedoras. Até que deu certo, mas as "piadas" preconceituosas dos rivais incomodaram o clube, que não insistiu na mesma estratégia em outros anos.

Porto: Na temporada 2014/2015, o Porto lançou sua terceira camisa rosa e, no anúncio dela, trouxe a frase: "Só não vê que é azul e branco quem é de outra cor". 

(Foto: Divulgação)

Everton: O tradicional time inglês da cidade de Liverpool lançou seu uniforme "pink" em 2010. Em 2007, o clube já havia usado uma camisa rosa pela conscientização do câncer de mama – uma pequena quantidade delas foi colocada à venda e se esgotou em questão de horas. Isso fez com que o clube apostasse mais tarde numa estratégia permanente lançando o rosa como a cor do segundo uniforme do time na temporada 2010/2011.

(Foto: Divulgação)

Manchester United: Em agosto do ano passado, foi a vez do Manchester United adotar o rosa pela primeira vez em sua história. Foi inspirada nas cores de um jornal tradicional antigo da cidade e também em uma ideia de fazer uma camisa mais "estilosa", que pudesse ser usada além do estádio, em eventos fora do futebol. Apesar de alguns comentários preconceituosos, ela foi muito bem aceita e fez sucesso entre os torcedores.

(Foto: Divulgação Adidas)

Atlético-MG: em 2010, o clube mineiro lançou o uniforme rosa na expectativa de atingir um público feminino maior. No entanto, diante da repercussão negativa entre os torcedores – principalmente por conta das "piadas" preconceituosas do rival -, ela acabou sendo retirada de circulação. As vendas, porém, foram um sucesso mesmo no curto período em que o modelo ficou à disposição da torcida.

Foto: Flickr Atlético-MG

Bahia: único clube que produz e vende seus próprios uniformes entre os principais do país, o Bahia lançou a camisa de goleiro inteiramente rosa para esta temporada. Além disso, o Tricolor baiano já havia entrado em campo com uniforme dessa cor em homenagem ao outubro rosa em 2012. No entanto, os atletas tiraram as camisas logo após a execução do hino e jogaram com o tradicional uniforme à época.

(Foto: Divulgação)

Grêmio e Internacional: os dois clubes fizeram camisas rosa em homenagem à luta contra o câncer de mama em 2017. O Inter chegou a jogar com a camisa, que foi sucesso total de vendas, esgostada em todas as lojas e muito procurada depois por torcedores e torcedoras. Já o Grêmio não lançou modelos masculinos da camisa para a venda e ouviu pedidos da torcida pelo produto. No Tricolor gaúcho, o sucesso da camisa em homenagem ao outubro rosa é tão grande, que ela já virou fixa entre os produtos oficiais e três modelos distintos já foram confeccionados (e 2016, 2017 e 2018).

(Foto: Divulgação Internacional)

 

 

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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