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Time italiano sexualiza garotas no campo para ‘divulgar esporte feminino’

Renata Mendonça

27/09/2018 15h15

Foto: Reprodução Facebook

Um clube italiano da terceira divisão chamado Virtus Vicenza ganhou as manchetes dos jornais esportivos do mundo todo após ter adotado uma nova estratégia para os gandulas dos seus jogos. A mudança chamou a atenção: saíram os homens responsáveis por pegarem as bolas na beira do campo, entraram meninas de 14, 15 e 16 anos vestidas em short curto e blusa justa para cumprir a mesma função.

As adolescentes fazem parte do time de vôlei sub-16 do mesmo clube, e a ideia, segundo o presidente do Virtus Vicenza, Renzo Rosso (que também é dono da marca Diesel, aquela que as meninas estão vestindo para cumprir a função de gandulas), é "trazer visibilidade para o esporte feminino".

Abrindo um parênteses rápido: (interessante que esse também é o nosso objetivo com esse blog. No entanto, nunca pensamos em sexualizar a imagem de atletas adolescentes para conseguir cumpri-lo. Por que será?)

E qual é o problema dessa "estratégia"?

Primeiramente, nunca vi ninguém que quisesse trazer visibilidade para um esporte masculino, por exemplo, utilizar homens sem camisa sarados para isso. Será que se o Virtus Vicenza tivesse interesse em divulgar o time de vôlei masculino do clube eles adotariam a mesma estratégia? E se não fariam o mesmo com os homens, por que fazer isso com mulheres – que são menores de idade, aliás?

Mas esse é só um primeiro ponto. Vamos pensar nos seguintes: de que maneira expor meninas adolescentes em roupas justas num jogo de futebol poderia efetivamente alavancar o time de vôlei do qual elas fazem parte? Provavelmente, as pessoas da arquibancada sequer sabem que elas são atletas do clube ou que jogam alguma coisa, já que a única coisa que está exposta ali são seus corpos – e não seu talento esportivo. Será que o objetivo do clube é que o público do futebol se interesse pelo time de vôlei ou pelos dotes físicos das atletas?

Esse post de um torcedor do clube viralizou e gerou críticas pela postura do time em colocar gandulas vestidas dessa maneira (Foto: Reprodução Instagram)

Além do mais, é preciso considerar as consequências que uma ação desse tipo pode trazer para as meninas em questão. De novo, elas são menores de idade. Já sabemos o que as mulheres ouvem quando vão ao estádio, os comentários assediosos, grosseiros, violentos até. Que vai de "gostosa" até coisas bem mais baixas de cunho sexual. Imagina então o que ouvem essas garotas adolescentes na beira do gramado dos homens que se julgam no direito de falar de seus corpos como se fosse objetos ali dispostos a servi-los.

"Ah, mas as meninas não estão ali obrigadas, elas acataram a ideia", vão dizer. Provavelmente elas não estão mesmo sendo obrigadas a fazer isso. Mas não é a atitude delas que precisa ser questionada, e sim a de um clube que vê como "estratégia de divulgação do esporte feminino" a exposição de adolescentes com poucas roupas na beira do gramado.

Nós sempre defendemos a ideia de que mulheres podem usar as roupas que quiserem E onde quiserem, porque isso é o que representa, por essência, a liberdade que buscamos – nós temos o direito de andar por onde quisermos com as roupas que bem entendermos sem sermos assediadas, violentadas, estupradas. Mas o ponto aqui não é esse. É a atitude de um clube de futebol sexualizado garotas com a justificativa de que isso ajudaria a "trazer visibilidade para o esporte feminino".

Divulgar o esporte de mulheres não é divulgar seus corpos, é divulgar seus talentos nas quadras, no campo, nas piscinas. É falar sobre as equipes femininas no site do clube, transmitir as competições delas nas redes sociais. É fazer propaganda delas com outdoors pelo clube ou então levá-las mesmo ao gramado em um dia de jogo – só que vestidas com o uniforme do time, como jogadoras de vôlei que são.

Há inúmeras formas e estratégias que podem ser adotadas para trazer visibilidade para o esporte feminino. A sexualização das mulheres – das garotas adolescentes no caso – não pode ser uma delas.

Nota: A Associação de Atletas da Itália repudiou a atitude do Virtus Vicenza e fez um apelo à Federação Italiana de Futebol para acabar com um "indigno espetáculo de sexualização de menores". O time de vôlei em questão, por sua vez, se manifestou dizendo que "não pretende expor as meninas a críticas sobre as quais elas não têm culpa" e que as "roupas usadas pelas garotas são comumente usadas no cotidiano dos adolescentes".

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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