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Torcedoras iranianas se disfarçam de homens para poderem entrar no estádio

Renata Mendonça

30/04/2018 06h10

Entre os 68 mil torcedores que estiveram no Azadi Stadium em Teerã na última sexta-feira, havia cinco "diferentes". À primeira vista, poderiam parecer "apenas mais alguns" torcedores do Persepolis, que comemoraria o título do Campeonato Iraniano naquele dia. Mas se você olhar bem, vai notar a peculiaridade.

São mulheres vestidas como homens para poderem entrar o estádio. No Irã, não é permitido a torcedorAs acompanharem partidas de futebol in loco, mas essas torcedoras conseguiram "burlar" a lei ao se disfarçarem de, literalmente, torcedores comuns.

No início do mês passado, outro episódio chamou a atenção no Irã quando 35 mulheres "ousaram" entrar no estádio para um jogo de futebol e foram detidas pela segurança. Segundo as autoridades iranianas, elas não foram presas, mas foram "detidas até que pudessem ser encaminhadas para um local apropriado".

Desta vez, para não correrem risco de perderem o jogo, torcedoras iranianas optaram por se vestirem de um jeito em que seriam "aceitas" no estádio. Barbas por fazer, perucas desajeitadas e um olhar feliz de quem finalmente tinha conseguido o que tanto queria: torcer para o Persepolis na arquibancada, sentindo o coração pulsar no ritmo dos 68 mil torcedores que ali estavam. Deu certo, e elas ainda deram sorte para o time, que venceu por 3 a 0 o Sepidrood na última partida da temporada, que selou a conquista do bicampeonato para o time da casa.

Pelas redes sociais, as torcedoras disfarçadas festejaram a ousadia que tiveram por um direito tão simples – e receberam apoio de alguns torcedores. "Espero que um dia elas consigam curtir uma partida no estádio com suas próprias identidades", afirmou um deles.

Proibição

Desde a Revolução Iraniana em 1979, mulheres foram proibidas de entrarem em estádios de futebol ou mesmo de irem a partidas esportivas de outras modalidades. Nos últimos anos, porém, muitas elas têm se unido e protestado contra essa lei – e conseguiram liberação para entrar em jogos de vôlei e basquete em um setor da torcida separado só para elas. O futebol, no entanto, ainda é considerado "ambiente inapropriado" para as torcedoras.

"A proibição é para preservar a honra delas, porque a atmosfera do estádio, as emoções ali e as multidões na torcida não são lugares para elas", disse Alireza Adeli, chefe de segurança de Teerã.

"As mulheres que querem ver os jogos podem fazer isso na TV, que transmite as partidas e dá a todos a oportunidade de assistirem ao vivo", completou.

Só que a TV não é mais o bastante para elas. As mulheres não querem apenas "assistir a jogos de futebol", elas querem viver o futebol por completo, sendo parte essencial dele sentir a emoção de estar na arquibancada torcendo, sofrendo e comemorando as alegrias e tristezas do seu time.

Essas proibições eram comuns em países islâmicos, mas o cenário está mudando. Na Arábia Saudita, por exemplo, uma conquista enorme foi celebrada neste ano: agora as mulheres podem também frequentar os estádios por lá. Logo no primeiro fim de semana em que isso aconteceu, foi possível ver a festa que elas fizeram simplesmente por terem tido a oportunidade de estarem lá.

"É um dia muito feliz. Hoje, nós estamos todas juntas. Os times nem são o foco. O foco somos nós podendo vir ao jogo. Nós vamos torcer até a garganta doer", foi o que disse Layla, uma torcedora Saudita após ter ido pela primeira vez ao estádio.

No Irã, enquanto as leis não mudam, elas seguirão ~dibrando essas adversidades para poderem viver o futebol de verdade – torcer, afinal, é (ou deveria ser) direito de todos.

Sobre as autoras

Angélica Souza é publicitária, de bem com a vida e tem um senso de humor que, na maioria das vezes, faz as pessoas rirem. Alucinada por futebol - daquelas que não pode ver uma bola que já sai chutando - sabe da importância e responsabilidade de ser uma mulher com essa paixão. Nas costas, gosta da 10, e no peito, o coração é verde e branco e bate lá na Turiassú. Renata Mendonça é apaixonada por esporte desde que se conhece por gente. Foi em um ~dibre desses da vida que conseguiu unir trabalho e paixão sendo jornalista esportiva. Hoje, sua luta é para que mais mulheres consigam ocupar esse espaço. Roberta Nina é aquariana por essência, são-paulina por escolha e jornalista de formação. Tem por vocação dar voz às mulheres no esporte.

Sobre o blog

Futebol não é coisa de mulher. Rugby? Vocês não têm força para jogar... Lugar de mulher é na cozinha, não no campo, na quadra, na arquibancada. Já ouviu isso muitas vezes, né?! Mas o ~dibradoras surgiu para provar justamente o contrário. Mulher pode gostar, entender e praticar o esporte que quiser. E quem achar que não, a gente ~dibra ;)

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